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Festival do Rio: Jim Jarmusch, ‘Les Misérables’ e o brilho dos estrangeiros

Não são só os filmes da Première Brasil, há muita coisa boa, como ‘Os Mortos Não Morrem’

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Todo dia, na apresentação dos filmes que competem na Première Brasil, os diretores e seus elencos têm destacado o momento difícil do cinema do País, e o próprio festival, que esteve ameaçado de não ser realizado. Difícil maioridade, a deste 21.º aniversário. O importante é que o Festival do Rio não apenas está ocorrendo como está mostrando grandes filmes.

Cena de Os Mortos Não Morrem Foto: UNIVERSAL

Jeferson De e seu M8 colocaram lá em cima o patamar da Première e tem havido uma bela programação de estrangeiros – Les Misérables, que está no Globo de Ouro e entrou na semifinal do Oscar; Amazing Grace, o eletrizante concerto gospel de Aretha Franklin que Sydney Pollack filmou em 1972 – no ano de Jeremiah Johnson – e permaneceu secreto por décadas, só sendo recuperado após a morte do cineasta; o Clint Eastwood, O Caso Richard Jewell; Os Mortos Não Morrem.

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Esse último marca a nova incursão de Jim Jarmusch pelo cinema de gênero. Depois do western em Dead Man/Homem Morto e dos vampiros de Amantes Eternos, mortos-vivos. Começa de forma enviesada, com dupla de policiais, Bill Murray e Adam Driver, caçando ermitão acusado de roubar uma galinha. O cara vive isolado na floresta, olhando o mundo de longe. Como naqueles diálogos meio nonsense da série Café e Cigarros, Driver observa que está tudo esquisito. É noite, mas não escurece; os celulares param de funcionar e, na rádio do carro, só toca Dead Men Don’t Die.

Driver fica repetindo – “Isso vai acabar mal”, mas nem nos seus piores pesadelos ele consegue imaginar quão mal. Logo, os mortos estão se levantando de suas sepulturas e semeando o terror na pacata Centerville. Walking Dead! Mortos que caminham. Jarmusch filma no seu estilo cool, contracorrente. Não busca os sustos apavorantes da série Invocação do Mal nem o humor descabelado de Zumbilândia. Filma muita conversa, valoriza-se do humor fino, mordaz, da ambientação provinciana acurada e da trilha. E não dispensa um tanto de bizarrice. Como a policial Mindy, Chloë Sevigny integra-se à dupla e surta ao se defrontar com sua avó entre os mortos-vivos. Como a Uma Thurman de Kill Bill, a cultuada Tilda Swinton é letal com o sabre, decepando cabeças com destreza. “Matem a cabeça” (dos zumbis), é a única maneira de combater o ‘mal’.

Talvez, para evitar spoiler, o leitor deva abandonar o texto aqui, mas Jarmusch, sempre surpreendente, faz com que Driver e Murray discutam, lá pelas tantas. Como é que você sabe que isso vai acabar mal, pergunta o segundo, e o primeiro – “Eu li o roteiro”. Murray não se conforma. “Depois de tudo o que fiz por esse cara (o diretor), ele me dá apenas minhas cenas e para você o roteiro inteiro. Não é justo.” O desfecho atinge o absurdo quando um deus ex-machina vem salvar uma das personagens centrais – e isso ocorre por meio de uma invasão de gêneros, quando a ficção científica vem em socorro do terror.

Jarmusch surgiu lá atrás, no começo dos anos 1980, com Stranger Than Paradise, que virou marco da produção independente dos EUA. Seguiram-se Daunbailó, Café e Cigarros, Mystery Train, etc. São quase 40 anos de estrada e, recentemente, ele voltou à sua melhor fase com Patterson, de 2016, já com Adam Driver e agora Os Mortos Não Morrem.

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