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Emoção e lágrimas na volta do "rei"

Quando canta as canções da Jovem Guarda, ele parece esquecer suas tragédias pessoais e brinca com o público. "Naquele tempo eu era feliz e não sabia". Depois de cantar Amor Sem Limite, que dá nome ao show, o cantor passa mais 20 minutos jogando rosas para a platéia, que beija antes. Um ritual tão velho quanto os medalhões e as pulseiras que carrega consigo

Por Agencia Estado
Atualização:

Cartas já não adiantam mais, quero ouvir a sua voz. Apesar de um dos seus fãs mais exaltados, o cantor pernambucano Léo Júnior, ter escrito uma carta de 500 metros de extensão para ofertar a Roberto Carlos, a maioria dos admiradores do Rei queria mesmo era ver e ouvir o ídolo. Às 11 horas da noite de sábado, uma hora e meia depois do horário marcado, os cerca de 11 mil sortudos que conseguiram comprar um ingresso para a sauna superlotada que se tornou o Ginásio de Esportes Geraldão entoavam um coro. "Roberto, cadê você?/Eu vim aqui só pra te ver!", cantavam. A orquestra atacou um pot-pourri instrumental e então ele entrou, terno branco com camiseta, lenço no bolso do paletó, e atacou a clássica Emoções". "Amigos eu ganhei/ Saudades eu senti partindo/ E às vezes eu deixei/ Você me ver chorar/ Sorrindo", cantou o Rei, com aquela voz poderosa e o timing perfeito, como se nunca tivesse se afastado da cena. Está no palco de novo, após um ano de retiro e isolamento, o maior cantor popular do País - 70 milhões de discos vendidos em 40 anos de carreira, cerca de 520 canções gravadas. Alexandre Belem Nos intervalos de um set de 20 canções, Roberto Carlos diz 58 vezes a palavra amor e chora duas vezes longe do microfone, com a mão no rosto "Que prazer rever vocês", disse Roberto, explicando em seguida que teve que se afastar por um tempo. "E vocês logicamente entenderam muito bem as razões", afirmou, sempre sob aplausos entusiásticos. "O Brasil me mima muito", afirmou. Nos intervalos de um set de 20 canções, ele diz 58 vezes a palavra amor e chora duas vezes longe do microfone, com a mão no rosto. Muitas fãs choram com ele. Depois de Emoções, vêm Como Vai Você, Amor Sem Limite, Desabafo, Detalhes, Outra Vez, Eu te amo te amo, te amo, Jovens Tardes de Domingo, O Calhambeque, As Curvas da Estrada de Santos, Nossa Canção, Eu Sou Terrível, Cento e Vinte...150...200 km por hora, Olha". Passado - Quando canta as canções da Jovem Guarda, ele parece esquecer suas tragédias pessoais e brinca com o público. "Naquele tempo eu era feliz e não sabia", afirma. "Tempo que os rapazes pagavam o milk shake das meninas." Mas Roberto Carlos é também um artista messiânico e, quando empunha suas canções religiosas (Luz Divina, Nossa Senhora e a novíssima Tu És a Verdade, Jesus), seu show não se distingue muito de uma showmissa do padre Marcelo Rossi. Na verdade, há até uma correspondência direta entre ele e os padres cantores, como Antonio Maria, que estava na primeira fila do seu show no Recife - outros ilustres que estiveram lá foram Hebe Camargo, Luciano do Valle e Reginaldo Rossi. Não se confirmaram os boatos de que Silvio Santos, proprietário do SBT, estaria na platéia. A diferença entre as canções religiosas do Rei e as dos outros é que ele constrói melodias belíssimas para elas, a ponto de um agnóstico se pegar cantando, sem constrangimento, os versos de Nossa Senhora. "Cuida do meu coração/Da minha vida/Do meu destino." Talvez por isso ele tenha confessado, na entrevista que deu à tarde, antes do show, que chegou mesmo a se pegar pensando em se tornar padre, mas foi por causa do seu estado emocional frágil. "Eu só canto, bicho!", responde ele a um repórter que quer saber se ele se considera tão carismático quanto Frank Sinatra e Elvis Presley. Durante uma hora e meia, ele canta para seu público. Termina com a que ele chama de "a canção mais importante da minha vida", que é a que dá nome ao seu show, Amor Sem Limite. Que não é uma citação nem uma resposta à recente gincana televisiva da Rede Globo, No Limite. Na música, ele canta que "tenho esquecido de mim, mas dela não esqueço". No telão, fotos da pedagoga Maria Rita, com quem ele esteve casado. A onipresença da mulher Maria Rita, que ele perdeu para o câncer em dezembro, é tocante em alguns momentos e chega a incomodar em outros, porque trai alguns lances de morbidez. Roberto fala como se ela ainda estivesse viva, como se conversasse diariamente com ela. Desse jeito, vai demorar a se recuperar. "A medida certa do amor é realmente o amor sem limite" diz o cantor. Seu próximo disco, que chega às lojas no dia 25, leva esse nome e pretende ser um disco monotemático. Ele diz que vai submeter tudo a uma meta, um objetivo: fazer uma grande declaração de amor. E que, por esse objetivo, condicionou tudo - melodias, harmonias, letras, rimas, palavras. "Até nem pensei em mudanças, nem sutis, nem drásticas" ele contou à tarde, antes do show. "Eu pensei em fazer um disco de amor, que seja todo ele uma declaração de amor, que não fale em sofrimento, em dor ou coisa parecida", explica. Alexandre BelemO show começou às 11 horas da noite de sábado, uma hora e meia depois do horário marcado, para os cerca de 11 mil sortudos que conseguiram comprar um ingresso Depois de cantar Amor Sem Limite, o cantor passa mais 20 minutos jogando rosas para a platéia, que beija antes. Um ritual tão velho quanto os medalhões e as pulseiras que carrega consigo desde aquelas jovens tardes de domingo. Ele voltou. Agora para ficar. Fãs - Um fã de Roberto Carlos, na porta do hotel onde o cantor está hospedado, no Recife, pede aos jornalistas que chegam para a entrevista coletiva do Rei que lhe perguntem qual regravação recente de suas músicas ele gosta mais. "Será É Proibido Fumar, do Skank?", ele pergunta. Triste ilusão de fã. Roberto Carlos jamais diria qual é sua regravação preferida. Não é da sua natureza. Diria que gosta de todas e essa seria apenas mais uma pergunta jogada fora. Certo que a função do jornalista é perguntar, mas é notória sua reputação de não dizer nada que possa ferir suscetibilidades. Dada a situação emocional do cantor, no entanto, a coletiva do Recife foi uma das entrevistas mais interessantes do Rei ao longo da carreira. "O que quer dizer com isso?", indagou o cantor à repórter que queria saber se ele não tem medo de se expor em uma biografia, que está sendo preparada pelo jornalista Okky de Souza. "Que vai ter algo que eu não quero que saia?", disse, assumindo que o seu zelo pela imagem vai além de seu apego à verdade. "A biografia não é uma reportagem", conceituou o artista. "Vai falar de mim, das coisas que penso, das coisas que tenho feito." Se o Rei disse de fato todas as coisas que pensa durante a coletiva, poderíamos resumir no seguinte decálogo o seu pensamento. 1. "Se sigo em frente, é porque as pessoas se interessam por mim" 2. "Sou um espectador de mim mesmo" 3. "De agora em diante, as emoções serão vividas - um pouco diferentes, mas serão vividas" 4. "Pode ter alguma surpresa nas entrelinhas, mas nas linhas só tem frases de amor" 5. "Queria ser como sempre fui, não quis mudar nada" 6. "A minha platéia é a minha família" 7. "Não acredito mais nisso de - fique tranqüilo, porque isso é da vontade de Deus" 8. "Deus não dá a dor, ele dá a endorfina" 9. "Eu só canto, bicho!" 10. "O artista tem que ter a responsabilidade sobre a opinião que está dando, senão é melhor ele ficar quieto" Afora isso, o Rei também disse algumas coisas definitivas. Uma das mais surpreendentes: ele revelou a trilha sonora do seu retiro espiritual. Uma das poucas canções que ele tem ouvido em casa, nesse período de isolamento do mundo, é Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim, de Herbert Vianna e Paulo Valle, gravada por Ivete Sangallo.

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