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Do baú, saem RPM, Cazuza e Renato Russo

Caixa do RPM, DVD de gravações de TV de Cazuza e CD com primeiras gravações de Renato são lançados

Por Lauro Lisboa Garcia
Atualização:

Cazuza (1958-1990), Renato Russo (1960-1996) e o RPM (1984-1988) tiveram vida curta no rock brasileiro dos sonoramente terríveis anos 80. Mas como as raspas e os restos ainda continuam interessando a um certo setor do mercado, eis que eles ressuscitam em áudio e vídeo. Ouça trechos das faixas Olhar 43 e Eduardo e Mônica: RPM - "Olhar 43" Renato Russo - "Eduardo e Mônica" Como não poderia deixar de ser, o DVD de Cazuza, Pra Sempre (Universal), o CD de Renato, O Trovador Solitário (Discobertas/Coqueiro Verde), e o box com quatro CDs e um DVD do grupo, Revolução! - RPM 25 Anos (Sony/BMG), são só reminiscências para quarentões saudosistas. Pra Sempre é uma compilação de gravações de programas de TV, como Mixto Quente, de 1985/86, logo que Cazuza engrenava carreira-solo, com Exagerado. Outras canções significativas de seu repertório, com ou sem o Barão Vermelho - Ideologia, O Tempo Não Pára, Faz Parte do Meu Show -, integraram o especial Uma Prova de Amor, de 1989, quando já estava bastante debilitado por causa da aids. O parceiro Frejat faz duetos com ele em Ideologia e Blues da Piedade, que também tem a participação de Sandra de Sá. Simone, melosa até o último borrifo de laquê, divide os vocais com Cazuza em Codinome Beija-Flor. Em Todo Amor Que Houver Nessa Vida há uma montagem com breves aparições de Gal Costa, Caetano Veloso, Leila Pinheiro e Olivia Byington, que também gravaram essa canção. No capítulo dedicado a trilhas sonoras, tem Bete Balanço e Um Trem Para as Estrelas (dos filmes de mesmos nomes) e Brasil, que foi feita para o longa-metragem Rádio Pirata, de Lael Rodrigues, mas estourou mesmo na voz de Gal Costa (que solta seus trinados em altos decibéis com ele no DVD), como tema da novela Vale Tudo, de Gilberto Braga. Marcou época. No mais, há depoimentos Sandra de Sá, Simone e Ney Matogrosso, que dirigiu o último show do cantor. "Somos da mesma falange", diz Ney. Este é o primeiro DVD com imagens de Cazuza em shows-solo, mas o do Barão Vermelho, registrando a consagração histórica no Rock in Rio em 1985, é mais interessante. Para quem conhece só o Paulo Ricardo que hoje sussurra e geme em show-missa de padre Marcelo e inauguração de pastelaria, é difícil acreditar que ele foi uma espécie de Di Ferrero (Nx Zero) no meio da famigerada década de 1980. As menininhas se descabelavam por ele, Caetano Veloso elogiou seus "lindos ombros" e coisas afins. Mas foram só os dotes do vocalista que fizeram o RPM se tornar um fenômeno nacional. A banda surgiu num momento em que a onda do rock brasileiro do período - iniciada pelo Barão Vermelho, Blitz e outros - se acomodava e se desgastava no mercado com uma avalanche de subprodutos. O RPM trouxe ares metropolitanos de São Paulo, uma massa de teclados, letras razoáveis (não que PR chegasse a ser um Arnaldo Antunes) e uma boa dose de pretensão, marketing e esquema de superprodução. Porém, está longe de hoje merecer o peso de revolucionário que o título de seu box induz a pensar, ao relacionar com o significado da sigla. Do primeiro álbum, Revoluções por Minuto (1985), várias faixas, como Louras Geladas, Olhar 43 e A Cruz e a Espada, viraram hits. O segundo, Rádio Pirata - ao Vivo (1986), repetia algumas, incluía duas inéditas (Alvorada Voraz e Naja) e covers de Caetano (London, London) e Secos & Molhados (Flores Astrais). O álbum vendeu 2,5 milhões de cópias, um recorde no gênero, levando o grupo a lotar mais e mais estádios como aquele onde o show foi gravado. Foi só. A expectativa em torno do equivocado Quatro Coiotes (1987), que sai pela primeira vez em CD agora, não deu em nada. O grupo já estava legado ao esquecimento. A brasa virou cinza rapidamente. Há certas coincidências com os Secos & Molhados, que também começaram como quarteto: os dois grupos lançaram apenas três discos (um ao vivo), viraram mania nacional e seus ex-integrantes malograram carreiras-solo, com exceção do vocalista. A diferença é que há um abismo entre ser o volúvel Paulo Ricardo e brilhar como o versátil Ney Matogrosso. Revolução! traz, além dos três álbuns, outro CD que reúne remixes e faixas não incluídas nos LPs originais (como duas excêntricas parcerias com Milton Nascimento), e mais um DVD de Rádio Pirata ao Vivo. O DVD tem material do Globo Repórter e o dito show. Dá para se ter uma idéia da histeria que envolvia o grupo nos efêmeros dias de pico. Mas a imagem não é das melhores e o som, absolutamente datado, como, aliás, todo o material. E o que são aqueles penteados e aquelas roupitchas de ombreiras? Pior que isso, só a bateria eletrônica reverberada, ou O Trovador Solitário. O CD demo contra Renato Russo não vale nem o tempo de esperar baixar de graça na internet. É um apanhado de canções que o cantor/letrista da Legião Urbana registrou em fita cassete, aos 22 anos, com péssima qualidade técnica. Acompanhando-se ao violão, Renato ensaia canções que viriam a ser gravadas pela Legião (Geração Coca-Cola, Faroeste Caboclo, Eu Sei, etc.) e outras de sua outra ex-banda, Aborto Elétrico. A chatíssima Eduardo e Mônica aparece com letra diferente da que foi gravada pela Legião. Merecia ter ficado ali, enterrada no fundo baú. Já que o pobre Renato não está aí para se defender, a melhor atitude a favor de sua memória é ignorar mais essa violação necrófila.

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