DJ Dolores quer modernidade sem perder raízes

O sergipano Helder Aragão de Melo, conhecido como DJ Dolores, é um dos indicados ao Prêmio Multicultural Estadão. Quinta, faz show em SP com o Santa Massa

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Por Agencia Estado
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O som criado pelo sergipano Helder Aragão de Melo, o DJ Dolores - um dos indicados para o Prêmio Multicultural Estadão - é uma afronta à pausterização da música. Sua união à Orchestra Santa Massa deu origem à "coesão" de estilos e pontos de vista musicais diferentes. De um lado, as influências eletrônicas e sampleadas de DJ Dolores. Do outro, as raízes regionais dos músicos da Santa Massa. Resultado: som moderno, da melhor qualidade, com um forte sotaque nordestino. Eles estarão no palco do Urbano, em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, na quinta-feira. Para Helder, a mídia tenta definir, mas de forma equivocada, o som desenvolvido por eles. "É engraçado quando as pessoas definem nossa música como ´uma mistura de regional e eletrônico´. Pelo contrário, há muita coesão e esse é meu maior orgulho", diz o DJ. "Somos de origens diferentes e, respeitando a formação de cada um, transformamos as diferenças em música rica e cheia de vida." Enquanto Maciel Salustiano, filho de Mestre Salustiano e um dos integrantes da Santa Massa, toca rabeca, instrumento antigo, Helder recorre a máquinas com tecnologia de ponta. O nome DJ Dolores surgiu de uma maneira um tanto quanto inusitada. Em 1996, Helder foi convidado para fazer sua primeira trilha sonora, a do filme Enjaulado. Precisava de um nome artístico para assinar o trabalho. Pegou "emprestado" o nome da tia de um amigo, que se chama Dolores. "Meu amigo sabe que usei o nome da tia dele, mas nunca falamos sobre o assunto." Helder fez parte do núcleo embrionário que veio a se chamar mangue beat. Contemporâneo de Chico Science, discorda que o termo mangue beat seja usado para definir o som de todo artista ou grupo que surja no sempre produtivo cenário musical recifense. Para ele, aquele foi um movimento isolado, lançado por uma turma no Recife, no início dos anos 90. Tanto nas pistas quanto nos shows, diz ter preocupação em transmitir mensagens, dialogar com as pessoas, sem propriamente querer agradá-las. "Mas se você conseguir as duas coisas, melhor ainda." Na concepção "doloriana", entretenimento é uma ferramenta poderosa. "Por meio da diversão, podemos nos comunicar com as pessoas, nos conectar de uma forma diferente da linguagem oral ou escrita. Ainda considero uma pista de dança um desafio estimulante", define ele. Se hoje DJ Dolores é um nome respeitado no universo dos disc-jóqueis ou um sucesso nas danceterias, nada disso fora planejado ou imaginado por esse sergipano. Nascido na cidade de Propriá em 1966, Helder mudou-se para Recife em 1984, onde decidiu estudar Design, na Universidade Federal de Pernambuco. "Sempre tive jeito para desenhar. Quando adolescente, meus pais planejavam que eu iria para uma escola de Belas Artes, mas quando me dei conta estava lendo manifestos dadaístas, descobrindo Marcel Duchamps e profundamente desinteressado pela arte feita para galerias", conta. Como designer, Helder elaborou material gráfico para bandas da então nova cena musical pernambucana, como Chico Science e Nação Zumbi, Mestre Ambrósio e Mundo Livre S/A. Atuou também como cartunista num jornal diário recifense, quando recebeu convite do Instituto dos Arquitetos do Brasil, em 1988, para confeccionar o jornalzinho da entidade. Foi a oportunidade que encontrou para suas experimentações, principalmente na diagramação. Dois anos depois, surgiu mais uma proposta de trabalho, desta vez para trabalhar com vídeo, operando com os raros computadores gráficos existentes na época. Passou a desenvolver projetos dentro da produtora, como videoclipes para as bandas que despontavam no Recife. Em parceria com o roteirista Hilton Lacerda, de Baile Perfumado e Amarelo Manga, produziu o primeiro clipe do Mestre Ambrósio, com o qual conquistaram o primeiro lugar na Bienal de Design da Associação dos Designers Gráficos. Saiu da TV Viva para dirigir e roteirizar séries da Cultura, em São Paulo, como Expresso Brasil e Mestres de Ofício. Em 96, recebeu convite do jornalista e videasta do Recife, Kléber Mendonça, para elaborar a trilha sonora do filme Enjaulado - aquele mesmo que incitou a criação do nome DJ Dolores. Por causa desse trabalho, Adriana Calcanhotto o convidou para participar de uma faixa do disco Marítimo. De volta ao Recife ("Descobri o quanto sou nordestino no frio de São Paulo"), Helder tocou no festival Abril Pro Rock. Houve uma aceitação de público e crítica. "A partir desse momento, decidi encarar a música de um jeito profissional." Fez trilhas para cinema e teatro, como o espetáculo A Máquina, de João Falcão. Nesse projeto, a Orchestra Santa Massa começava a surgir. Atualmente, DJ Dolores tem-se dedicado a remixagens e a uma turnê, que passará também por Rio, Belo Horizonte e outras cidades.

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