PUBLICIDADE

Disputa de Neil Young com o Spotify ressalta problemas de desinformação em podcasts

Artista retirou suas músicas da plataforma depois de cobrar um posicionamento da empresa sobre um podcast antivacina

Por Maggy Donaldson
Atualização:

O ultimato de Neil Young ao Spotify, para que a plataforma escolhesse entre sua música e o famoso e controverso podcaster Joe Rogan, se tornou um ponto crítico no debate sobre desinformação digital e a responsabilidade corporativa de moderá-la.

Neil Young acusa o popular podcast de Joe Rogan, que é exclusivo do Spotify, de dizer mentiras sobre a vacina e sobre a pandemia. Foto: EFE/HANS KLAUS TECHT

PUBLICIDADE

Esta semana, o prolífico roqueiro exigiu que a gigante do streaming retirasse suas músicas (com 2,4 milhões de seguidores e mais de seis milhões de ouvintes mensais), a menos que o Spotify estivesse disposto a se livrar de Rogan, cujo programa é o mais popular da plataforma, mas é repetidamente acusado de propagar teorias da conspiração.

Rogan, 54, desaconselhou a vacinação em jovens e promoveu o uso não autorizado da ivermectina, um medicamento antiparasitário, para tratar o coronavírus.

"Percebi que não podia mais apoiar a desinformação no Spotify que ameaça a vida do público amante da música", disse Young, uma sobrevivente da pólio, em uma carta aberta.

Sua contestação veio após uma ação judicial apresentada por centenas de profissionais médicos pedindo ao Spotify que impedisse Rogan de promover "várias falsidades sobre as vacinas contra a covid-19", que, segundo eles, estariam criando "um problema sociológico de proporções devastadoras".

Rogan, que tem um contrato de exclusividade de US$ 100 milhões por vários anos com o Spotify, prevaleceu na decisão do Spotify.

Na quarta-feira, 26, os sucessos de Young, incluindo Heart of Gold, Harvest Moon e Rockin' In The Free World foram retirados da plataforma.

Publicidade

A empresa, que na quarta-feira lamentou a decisão de Young e citou a necessidade de equilibrar "tanto a segurança dos ouvintes quanto a liberdade dos criadores", não respondeu a um pedido de comentário da AFP.

No ano passado, o diretor executivo da plataforma, Daniel Ek, disse à Axios que não achava que o Spotify, que recentemente começou a investir pesadamente em podcasts, tivesse responsabilidade editorial por Rogan.

Ek comparou o podcaster a "rappers realmente bem pagos", dizendo que "também não ditamos o que eles estão colocando em suas músicas".

Neil Young (esq) retirou suas músicas do Spotify; ele pediu que a empresa agisse contra o podcaster Joe Rogan, por seu conteúdo antivacina. Foto: Alice Chiche and Carmen Mandato / AFP

Preocupações comerciais

PUBLICIDADE

A atitude do Spotify atraiu aplausos virtuais de organizações como o Rumble, uma plataforma de streaming de vídeo popular entre a direita, que elogiou a empresa sueca por "defender os criadores" e "a liberdade de expressão".

Mas Young, de 76 anos, também recebeu muitos elogios por se posicionar, inclusive do chefe da Organização Mundial da Saúde (OMS). O músico pediu a outros artistas que sigam seu exemplo.

Summer Lopez, diretora sênior de programas de liberdade de expressão da organização sem fins lucrativos PEN America, enfatizou que "Young é provavelmente uma dos únicos artistas que realmente podem se dar ao luxo de fazer esse tipo de ultimato".

Publicidade

No entanto, Lopez expressou preocupação com "pedidos mais amplos para boicotar o Spotify", porque "é um lugar essencial para os artistas alcançarem seu público e uma fonte de receita".

O papel de plataformas como o Spotify na moderação de conteúdo é complexo, destacou López, porque, diferentemente das redes sociais, é um serviço "projetado principalmente para amplificar a arte e as obras de arte".

"Acho que o verdadeiro problema aqui é que o Spotify não tem uma política clara sobre isso", analisou, levantando questões sobre se "há alguma independência significativa" entre "o processo de tomada de decisão e suas preocupações comerciais".

Experiência pessoal

Nos últimos anos, titãs da mídia online, incluindo Facebook e YouTube, foram criticados por permitir que teóricos da conspiração divulgassem seus pontos de vista.

Mas, apesar de seu crescimento explosivo, o podcasting passou despercebido.

Valerie Wirtschafter, analista de dados sênior da Brookings Institution que estuda a mídia contemporânea e o comportamento político, explicou que isso se deve principalmente ao fato do podcasting ser "um espaço tão grande e descentralizado".

Publicidade

No entanto, ele admitiu que o áudio é um meio particularmente poderoso para espalhar inverdades: "Há um tipo de experiência pessoal acontecendo lá".

A intimidade do som combinada com o estilo conversacional dos podcasts permite que os ouvintes processem a informação de uma forma que "potencialmente a torna um meio mais forte para essas falsidades".

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.