Daniela Mercury foge do axé em novo álbum

Seu flerte com a música eletrônica, iniciado em seu último disco, ganha ainda mais relevo em Sou de Qualquer Lugar, o sétimo de sua carreira

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Por Agencia Estado
Atualização:

O clima chuvoso e nublado de São Paulo na última quinta-feira foi um tanto cruel com Daniela Mercury. Acostumada ao sol de sua hometown Salvador, a cantora e compositora baiana recebeu a reportagem numa das suítes do Sofitel paulista apresentando os primeiros sintomas da gripe. Mas como o profissionalismo ensina que o show não pode parar, Daniela discorreu sem pausa para respiro sobre o álbum Sou de Qualquer Lugar (BMG), o sétimo de uma carreira fonográfiaca iniciada há dez anos. "Começei a cantar muito cedo, entre 1989 e 1990 gravei discos com o grupo Companhia Chic, mas como artista solo só apareci mesmo em 1991. Nossa! São sete discos em dez anos, nem tinha feito essa associação ainda", continua. "Gosto do número sete, me lembra a Sétima Dança e o título de um dos discos do Iron Maiden, aquela coisa de o sétimo filho do sétimo filho. Vai ver o meu ciclo é diferente, tem dez anos e sete discos." Sou de Qualquer Lugar realmente fecha um ciclo. O flerte com a sonoridade eletrônica, iniciado no álbum anterior Sol da Liberdade, está cada vez mais aparente. Na toada dos beats seqüenciados, sai o altruísmo e a militância em favor das manifestações soteropolitanas e entra uma visão mais globalizada. Pop internacional em detrimento da axé music que caracterizou os primeiros trabalhos de Daniela. "Mesmo não me incomodando musicalmente, eu quis fugir daquele estereótipo. Acho lindo as percussões da Bahia, mas o meu desejo é contribuir dentro do universo eletrônico e pop agregando fusões com a MPB" Percussão - Com o conhecimento de causa de quem reina soberana nos trios elétricos, ela diz que a cultura da música percussiva do carnaval baiano sempre existirá e vai se reciclar dependendo, é claro, da necessidade de inovação dos próprios artistas. "Se pudesse, eu congelaria o Olodum como está, ou melhor, congelaria o Olodum antes da saída do Neguinho do Samba. O som deles é emocionante daquela maneira tradicional." Outra das características que saltam aos olhos em Sou de Qualquer Lugar é o viés da sensulidade, algo até então relegado ao segundo plano. No encarte, a cantora aparece bela e insinuante trajando uma combinação de biquíni preto de bolinhas e camisa transparente em estilo vitoriano. Isso entre outros agradáveis momentos de deleite visual. "Trata-se de um disco essencialmente feminino, onde pude exercitar também a sedução. Acho que no trabalho gráfico (assinado por Gringo Cardia) há uma erótica elegância." Não que a cantora esteja apostando todas as fichas nos atributos da carne. Daniela mostra desenvoltura ao acumular as funções de compositora e produtora de faixas como a techno-flamenca Aeromoça, ("Posso até deixá-lo tomar conta dos meus lábios / Posso até guardá-lo em meu corpo pra que me aqueça / Posso ouvir os teus anseios e lutar por eles também / Mas eu tenho que voar"); o samba-reagge digital Ata-me, ("Forje a despedida/sem calma, me ame/com pressa, me chame/serei tua mulher"); e Nina, ("Sou filha da terra inteira/E hoje canto pra ver o teu balé"). Daniela assina ainda a produção de Baiana Havaneira e Bora Morar, ambas da lavra de Carlinhos Brown. O álbum traz releituras pontuais. "De Chico Science, eu regravei A Praieira. Conseguir agregar jovialidade e atualidade a uma música que já nasceu moderna, foi um grande desafio mim", diz. "Mutante, de Rita Lee e Roberto de Carvalho, é a prova da admiração que tenho pela irreverência e pela capacidade eternamente mutante da Rita." As demais músicas do disco são inéditas. Gilberto Gil compôs o xote Quem Puder Ser Bom que Seja, gravado com a banda que o acompanha atualmente e da qual a própria Daniela foi backing vocal nos anos 80. "Gil é uma das minhas maiores referências." A amizade com Lenine rendeu a faixa que inspira o título do CD. "Nunca tive muitos artistas com os quais eu dialogasse. Foi ótimo conhecer Lenine, pois ele compreende a diversidade de gêneros. O engraçado é que ficamos mais próximos durante as turnês pelo exterior." O cidade negra Tony Garrido completa a lista de colaboradores. Canta o reggae Estrelas. Saúde Daniela.

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