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Dançando na fogueira

Charli XCX canta no dia 31 em São Paulo e conta como pegou atalho do star system

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

Desde Dido e mais recentemente Kate Nash e Lily Allen, a ideia de que uma garota comum de classe média possa fazer sozinha seu caminho para o estrelato pop foi se estreitando cada vez mais. A própria noção de estrelato mudou – quase não há mais indústria musical, e o universo do que se conhece como "êxito" hoje pode se restringir a um mundo de 30 mil seguidores no Facebook e 2 mil downloads.

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Mas ainda é possível topar com algumas surpresas nesse negócio. Charli XCX, por exemplo. Com apenas 21 anos, a inglesinha Charlotte Emma Aitchison, de Stevenage, Hertfordshire, chegou reivindicando com energia um lugar ao sol. Sem nenhum trunfo aparente a não ser a cara de pau (diz que compõe canções em uma hora porque não gosta de desperdiçar tempo que pode gastar com farra), ela colocava suas musiquinhas no MySpace e chamou a atenção de "um cara", que a levou para tocar na cena underground das raves quando tinha apenas 14 anos.

"Você é dos anos 1970, mas eu sou uma piranha dos anos 90", diz a letra de uma de suas músicas, Love It, que ela fez sob encomenda em 2012 para o duo sueco Icona Pop – e que se tornou um megassucesso (64 milhões de views no YouTube). Ligeiramente dark, mas com ingenuidade adolescente, um híbrido de eletro e de pop de rádio – e eis os ingredientes para a mágica.

Sacaram que Charli tinha talento para hitmaker e logo ela abria shows de Coldplay, Santigold e Justice. E não é que conseguiu ir ainda mais longe? Acaba de assinar um contrato com a Atlantic Records. "Estou no controle do que faço, escrevo minhas próprias canções. Não vejo mudança, a não ser o fato de que, quando vou gravar, é muito melhor ter uma companhia grande, tem mais estrutura, estúdios melhores. Fora isso, não há muita diferença de gravar por selos indie", disse Charli XCX, falando ao Estado por telefone na semana passada.

Pode ser que em uma temporada ninguém mais se lembre de Charli, mas não se pode negar que ela sabe se anunciar. É pequena e mirradinha, tem um rosto que lembra uma fusão de Amy Winehouse com uma Victoria Beckham teen e é ela mesma quem produz e faz seus videoclipes. Na contramão de grandes sucessos individuais contemporâneos, que têm muito a ver com grandes investimentos em estratégias de marketing, como os casos de Lana del Rey e mesmo Lady Gaga, Charli XCX fez seu caminho à moda antiga. Aos 16 anos, já tinha um contrato com dois selos indie, This is Music e Iamsound Records. Tocava de madrugada quando nem tinha idade para isso. "Era estranho porque tinha de chegar lá umas 8 horas da noite e ninguém se apresentava antes da meia-noite."

O gol de Charli XCX é justamente o da despretensão. "Sou preguiçosa e obstinada. Odeio reescrever as coisas. Para que me chatear gastando um dia inteiro numa coisa quando posso fazer em uma hora, e então compor outra canção em outra hora? É isso que me estimula."

Mas não caia na armadilha de pensar que ela não sabe lhufas do seu métier: é esperta. Para se vestir, vai buscar inspiração em David LaChapelle e Vivienne Westwood. Tem sua pesquisa icônica: acaba de lançar um single que é absurdamente punk, Allergic to Love, que pode ser ouvido na internet. É a regravação de um sucesso do obscuro grupo punk Snuffed By The Yakuza, da Suécia. Lembra terrivelmente coisas como QueenAdreena ou mesmo Pogues. "Meu pai era muito ligado em punk rock. Ouvia muito Sex Pistols, tinha uma compilação que eu adorava. Gosto de ouvir os mais destacados grupos punk daquela época, mas isso não quer dizer que esteja embarcando em uma onda punk no novo disco."

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"Sempre quis escrever música pop. Nunca quis ser cool", ela diz. Originalmente, sua maior inspiração, conta, veio dos artistas do selo francês Ed Banger, a cena do electro francês – que lançou gente como Justice, Sebastian, Cassius, Uffie, Feadz, Breakbot, entre outros. "Mas, como eu cresci nos anos 1990, tive influência de todo tipo de música pop, como toda garota da minha idade. Adorava Madonna, Britney", lembra.

Tem também uma quedinha pelo hip-hop, o que transparece no seu trabalho. Uffie (a rapper e artista eletrônica americana Anna-Catherine Hartley) foi sua maior referência nessa seara. "Tive, é claro, grande influência do grime britânico. Ouvi o rapper The Streets, gostei. Mas o que mais gosto não é o grime, não é o rock. É o pop".

Abrir shows para o Coldplay foi o teste supremo para a garota. "Era esquisito. Tinha noite que eu tinha umas 10 mil pessoas à minha frente. Eu só tinha tocado em clubs até então, não tinha a noção do que era fazer um show para uma plateia daquele tamanho. E o público têm dificuldade para aceitar novos artistas quando estão esperando a sua banda. Os fãs do Coldplay às vezes podem ser muito desagradáveis. Me chamaram de vagabunda, me hostilizaram. Mas eu fui pegando o jeito".

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Charli é divertida. Em uma entrevista recente, contou o que sentiu ao fazer seu primeiro videoclipe profissional, o da música You’re The One, dirigido por Ryan Andrews. Até então, ela apenas ela mesma quem produzia seu aparato visual. "Ele me levou para o alto de uma montanha no País de Gales, num frio congelante, ao lado do oceano. Pelada, molhada, gelada. Foi maravilhoso, meu primeiro vídeo. Eu me senti como uma superestrela. Pensei: Britney teria uma tenda, e um pelotão de gente em volta segurando secadores de cabelo".

Não é pretensiosa, principalmente. "Compor é legal, mas me apresentar ao vivo é a coisa sobre a qual tenho maior controle. Acho que tenho talento para as duas coisas, hoje em dia me sinto confortável nas duas atividades", ela diz. Em vias de lançar o terceiro disco, gravado em Estocolmo, ela conta que ainda não tem um título para o álbum, mas enquanto isso já desembarca aqui para três shows com o disco do ano passado, True Romance. Canta em São Paulo, no Cine Grand Metrópole, no dia 31 deste mês. Está na programação do Meca Festival.

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