Com orgulho de ser Ramone

As brigas, gravações, vitórias e derrotas dos Ramones, segundo o seu baterista

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Por Redação
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Lenda viva do punk rock, o baterista Marky Ramone se apresenta neste sábado, 26, no Manifesto Bar, em São Paulo, com a banda Marky Ramone’s Blitzkrieg, que inclui o vocalista Michael Graves, ex-Misfits. O repertório será composto por clássicos dos Ramones, como I Wanna Be Sedated, mas deve trazer também versões acústicas de canções do Misfits e músicas do primeiro álbum do Marky Ramone’s Blitzkrieg, If and When, lançado em 2011. Ao Estado, Marky antecipa que também deve homenagear Joey Ramone com uma música do álbum solo do cantor, que morreu em 2001.

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"Vamos tocar 35 clássicos dos Ramones e algumas surpresas", diz, por telefone. Ao falar sobre a participação de Graves na banda, não poupa elogios. "Ele era o cantor, frontman e compositor dos Misfits, e escreveu os discos mais conhecidos da banda. Por isso estou feliz por tê-lo a bordo. Ele conhece as canções (dos Ramones) muito bem, é profissional, mas traz o próprio estilo. Ele não é um clone do Joey (Ramone, vocalista) e eu acho isso muito importante." Marky confirmou que a banda deve tocar também algumas canções do Misfits escritas por Graves. "Não é um supergrupo, são apenas uns caras se divertindo", explica.

Misturando bom humor e acidez, como sempre foi o estilo dos Ramones, Marky aproveita a pergunta para criticar a formação atual dos Misfits, que conta apenas com o guitarrista Jerry Only como membro da formação original. "Eu não considero o Misfits como o Misfits mais, porque só tem um membro (original) no grupo", diz. "Eu não gosto de chamar a banda pelo nome a não ser que tenha pelo menos dois ou três membros originais. Eu nunca chamaria esta banda de Ramones", afirma. "Não é justo com os fãs."

Ironicamente, Marky não é um membro original dos Ramones, tendo entrado na banda em 1978 no lugar de Tommy Ramone, que formou o grupo ao lado de Joey, Johnny e Dee Dee. Apesar disso, é lembrado por ter sido o baterista que ficou mais tempo no grupo - "cinco vezes mais do que Tommy", segundo ele - e que esteve presente nos principais discos.

"Eu fiz 1.700 shows (com os Ramones). Eu gravei dez discos, Tommy gravou três. Olha, nós dois fizemos nosso trabalho direito. Tommy estava cansado das provocações de Johnny e Dee Dee e ele queria deixar o grupo", diz Marky sobre sua entrada na banda. "Aí, Johnny e Dee Dee me convidaram para participar do grupo. Tommy decidiu que queria produzir e foi isso. Ele nem quer mais ser chamado de Tommy Ramone, agora quer ser chamado de Uncle Monk. Eu respeito isso, mas você tem que se lembrar de onde veio também", concluiu ele.

Questionado sobre os problemas de relacionamento entre Joey e Johnny, o roqueiro admitiu que existia um clima muito ruim na banda, mas ressaltou que, no palco, todos deixavam os problemas de lado. "Johnny não gostava do fato que Joey era um liberal, um democrata, e Joey não gostava de Johnny porque ele era um ultra conservador, apoiador da Associação Nacional de Rifles (NRA, organização que defende o direito ao porte de armas nos EUA). Eles não gostavam um do outro desde o início."

Para Marky, as brigas entre Johnny e Joey foram o fator que motivou a saída de Dee Dee da banda. "Quando as pessoas não conversam e você fica em uma van por oito, dez horas, e você sabe que tem dois caras no grupo que estão prontos para matar um ao outro, não é uma boa sensação. Num dia eu ia conversar com o Joey, e o Johnny me puxava de lado e dizia: ‘E então, hoje você é amigo dele?’ (risos). E a mesma coisa com o Johnny. E eu dizia para os dois: ‘Eu amo vocês como irmãos e não vou tomar lados’", conta. "Os Ramones eram uma grande banda, mas o que vinha junto, as discussões e as brigas, eram algo que você tinha que aguentar."

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As histórias de Marky sobre os Ramones e a cena punk serão contadas em um livro que o baterista está preparando e planeja lançar em 2014. "Eu estou escrevendo por minha conta", explicou. "Estive trabalhando nele pelos últimos dois anos."

Desarmado. Um dos momentos marcantes da carreira dos Ramones foram as gravações do disco End of the Century, de 1979, sob o comando do lendário produtor Phil Spector, famoso tanto pelo talento como pelo gênio difícil e pelo fascínio por armas de fogo. Marky diz que pretende desmentir no livro a história segundo a qual Phil teria apontado uma arma para os Ramones dentro do estúdio. "É uma grande mentira", disse. "Eu estava lá o tempo inteiro e não sei quem inventou essa história mentirosa. Phil não era nenhum anjo, mas o estúdio era o estúdio, sabe?"

Ele relembra a história sobre a briga entre Phil e Johnny durante a gravação do clássico Rock ‘n’ Roll High School. "(Phil) era o produtor. Não havia razão para Johnny ficar irritado com o produtor, porque ele estava tentando registrar um som de sua guitarra. John teve que tocar o primeiro acorde de Rock 'n' Roll High School umas 40, 50 vezes. E daí? Se você está trabalhando com o maior produtor do rock, você tem que ouvi-lo. Você não deve ficar discutindo. No meio tempo, Phil conseguiu o som que ele queria."

Marky conta que Johnny acreditou que os pedidos de Phil para que ele repetisse o acorde tinham a intenção de irritá-lo. "Eles se confrontaram e John disse: ‘Phil, o que você vai fazer? Atirar em mim?’. Mas isso não quer dizer que Phil tinha apontado uma arma pra ele. John sabia que Phil tinha armas com ele e tinha medo dele."

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Durante as gravações, Marky se tornou amigo de Phil Spector e manteve a amizade até ele ir para a cadeia, em 2009. Atualmente, Spector cumpre pena de 19 anos de prisão nos Estados Unidos pela morte da atriz Lana Clarkson, em 2003. Em sua defesa, o produtor alegou que a arma que matou Lana teria disparado acidentalmente.

Marky diz que as histórias sobre o comportamento errático de Spector com armas de fogo criaram um precedente muito negativo aos olhos da Justiça. "Ele tirava a arma e apontava para as pessoas. Quando as testemunhas foram na Corte, elas disseram: ‘Sim, ele apontou uma arma contra mim’. Então, você começa a imaginar que ele realmente matou a garota, né? Mas foi um acidente." Marky defende o amigo e conta que ele estava presente no julgamento e ficou estarrecido com a sentença. "Mas o que você pode fazer? Não dá pra discutir com o sistema."

Relançamento. Antes de ser conhecido como Marky Ramone, Mark Bell, verdadeiro nome do baterista, tocou com a banda punk Voidoids, ao lado do cantor Richard Hell, do Television. Mas, antes disso, ele fazia parte do Dust, considerado um dos primeiros grupos de heavy metal norte-americanos. "Em 1970, não havia bandas de heavy metal na América", relembra Marky. Ele conta que era tão jovem na época que era obrigado a levar seus pais para os shows porque os locais onde a banda se apresentava serviam bebidas alcoólicas. "Johnny, Joey e Dee Dee estavam na plateia assistindo o Dust, assim como membros dos New York Dolls, antes de começarem os seus grupos", ele relembra.

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Durante sua curta existência, entre 1969 e 1972, o Dust gravou apenas dois discos, Dust (1971) e Karma (1972), que serão relançados em abril deste ano em versão remasterizada. "Até os punks gostam desses discos", afirma Marky, que participou da remasterização. O guitarrista do grupo, Richie Wise, mais tarde iria produzir os dois primeiros discos do Kiss, e o baixista, Kenny Aaronson, se tornaria um músico de relativo sucesso, gravando com nomes como Joan Jett e Blue Öyster Cult.

 

MARKY RAMONE

Manifesto Bar. Rua Iguatemi, 36, Itaim Bibi, telefone 3168-9595. Sábado, 26, a partir das 18 horas. R$ 100.

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