Desde quando Ceumar defendeu a canção "Achou!", de Dante Ozzetti, no Festival de Música da TV Cultura (2005), descobriu afinidades com ele. Ponto para os dois. Ceumar teve acesso a canções de um autor requintado, de antecedentes eruditos, capaz de sutis experimentações, de índole inovadora. Sem, contudo - agora mais do que antes -, parecer difícil, como se convencionou classificar os expoentes da vanguarda urbana paulistana, no meio da qual ele surgiu. Dante, que tem na irmã Ná Ozzetti sua melhor intérprete, encontrou outra à altura, inteligente, dinâmica de voz cristalina, bem modulada e afinada - qualidade tão em desuso entre as novas cantoras brasileiras. Resulta que o diálogo de ambos faz o CD "Achou!" (MCD) entrar para a lista dos grandes prazeres sonoros deste ano. "Achou!" causou sensação no festival, tornou-se a preferida do público, mas perdeu, sob protestos, para a vaiadíssima "Contabilidade" (Danilo Moraes/Ricardo Taperman). Tanto pelos arranjos de Dante como pela interpretação vivaz de Ceumar, a graça e a sutileza da faixa-título se espalham por todo o álbum. Além de Tatit, com quem divide outras seis faixas além de "Achou!", Dante agrega Alzira Espíndola, Zeca Baleiro, Zélia Duncan, Chico César e Kléber Albuquerque a sua sociedade de parceiros. O diálogo afinado entre intérprete e autor (que também tange seu violão de nylon na maioria das faixas), balança na sonoridade acústica, contemporânea, urbana, mas com o pé na terra. Os responsáveis por ela são Sérgio Reze (bateria e percussão), Du Moreira (baixo), Milton Mori (bandolim), Webster Santos (violões), com eventuais colaborações de Lincoln Antônio (piano), Bocato (trombone), Swami Jr. (violão) e Dimos Goudaroulis (violoncelo). As canções, compostas entre janeiro e fevereiro de 2006 para este projeto, são repletas de colorido, alegria e calor, seja pelo envolvimento dos contornos melódicos, pela diversidade rítmica ou pelos achados poéticos, que fulguram no canto de Ceumar. Pra lá (Tatit) abre o CD como convite a uma expedição por um espectro musical que vai muito além do "rancho fundo", de um país "muito além da TV". Em Partidão, Zeca Baleiro consegue superar a vulgaridade da metáfora futebolística para falar de amor. Alguém Total é outro achado poético de Tatit em torno de um confortável e terno abraço. Das mais belas do CD, Alto-Mar, também letrada por ele, mergulha em heranças portuguesas, na forma de morna cabo-verdiana. Meio rock, meio baião, "Parei Querer" (Zélia) contrasta com a bluesy, dissonante "Parte B" (Alzira). Polirrítmica, "Saia Azul" (Chico César) traz uma das porções Didinha de Ceumar, com versos de cadência lúdica. Entre o samba-choro torto e a marcha-rancho, "Visões" (Tatit) contribui com mais e melhores estranhamentos no jogo vocal de Dante e Ceumar. Delicada, de mínima instrumentação, "A Tardinha" (mais Tatit) refere-se ao Barquinho da bossa nova e prepara os ouvidos para o final festivo com o samba brejeiro "Praga" (Tatit) e o frevo "Lenha na Quentura" (Kléber). Quem estiver atrás de ser um grande CD de música brasileira contemporânea, achou. Como este, atualmente sai um em centenas.