"Cê", novo disco de inéditas de Caetano Veloso

O título do álbum que chega às lojas na terça, com 12 músicas inéditas, é um jeito coloquial de dizer você. Cê quer caetanear?

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Por Agencia Estado
Atualização:

O cantor e compositor Caetano Veloso, de 64 anos, chegou a uma fase da carreira que - com sua licença, Djavan - só quer caetanear o que há de bom. Tem o intento de não compor mais só por compor. Acha que já existem canções demais no mundo e que ele próprio contribuiu para uma quantidade ridícula delas. Palavras dele. Pensa muito em cantar canções já existentes porque lhe dá prazer interpretar. Caetano expõe esse pensamento justamente no mesmo momento em que seu amigo Gilberto Gil afirma que não quer mais a vida de cantor ou compositor, pois considera sua missão cumprida. Três discos especiais O desejo de Caetano não é o de parar de produzir, mas diminuir o ritmo. Na verdade, admite que isso é apenas um julgamento, não sabe se vai conseguir, de fato, se conter. Afinal, ele passou os últimos tempos elaborando músicas para três possíveis discos especiais: um CD de sambas, outro de canções sentimentais e um terceiro, ainda, de "rock clandestino" Não fez nenhum dos três, mas um quarto álbum, que traz uma coisa aqui e acolá daqueles três almejados projetos que não vingaram. O novo trabalho poderá ser encontrado nas lojas a partir de terça-feira, ostentando em letras garrafais e chamativas o título "Cê" (a palavra ?você? usada de maneira Coloquial). Fico de dedo coçando para fazer mais "Fiz 12 canções rapidamente para este CD e deixei outras para os próximos discos. E fico de dedo coçando para fazer mais. Fico todo dia tendo idéias, fazendo outras canções", afirma o compositor, em entrevista na produtora Natasha. "Gil está tendo outra atividade na vida e, nesse momento, ele acha que já cumpriu a tarefa de compositor. Eu talvez deveria pensar assim, porque fiz canções à beça, mas ainda fico com vontade de fazer, para ver até se melhoro as anteriores. Esse disco tem muito esforço nesse sentido." No novo CD "Cê" (gravadora Universal), Caetano não vem sozinho - a não ser na criação de cada uma das 12 faixas. Ele acabou se vendo cercado por um grupo de jovens músicos, encabeçados por seu filho biológico Moreno Veloso e seu filho por afeição Pedro Sá - ambos na casa dos 30 anos, amigos de infância e produtores deste novo disco. Querendo ou não, a convivência próxima com o ?Pedro Sá adulto? - que Caetano conhece desde que era o ?Pedro Sá criança? - parece ter influenciado o compositor baiano. Com Moreno idem, apesar de ambos não manterem a mesma troca contínua de informações, como a que Caetano cultiva com Pedrinho. "Eles são meninos que cresceram nesse ambiente. Para medir o quanto dei a eles e quanto eles me têm dado, é difícil saber." Em tempo: entre amanhã e o dia 11, todas as faixas de "Cê" estarão disponíveis para venda no site http://megastore.uol.com.br. Cada faixa custa R$ 2,49 e todo o disco pode ser baixado por R$ 23. Rock ao estilo Caetano de ser O tão sonhado CD de rock clandestino de Caetano Veloso, e confabulado durante anos com Pedro Sá, não saiu. Mas, à primeira audição do CD "Cê", percebe-se que seu repertório ganhou muito com essa desistência. Obviamente, "Cê" não tem nada de clandestino, mesmo porque aquele projeto primeiro previa um Caetano literalmente na clandestinidade, com sua voz distorcida, para que não fosse identificada, e canções despersonificadas. "Cê" herdou muito desse material rock ao estilo de Caetano de ser, mas com o compositor mostrando devidamente sua persona. Até a formação de sua banda, um trio power com Pedro Sá na guitarra, Ricardo Dias Gomes no baixo e piano rhodes e Marcelo Callado na bateria, lembra uma formação clássica de uma banda de rock. Caetano segue o trio ao violão e nos vocais. A única participação especial que consta é a de Jonas Sá, irmão de Pedro, que aparece no coro e nos arranjos vocais da última faixa do CD, "O Herói". "Cê" pode ser considerada uma pequena obra rock de Caetano, sem ser só um CD de rock. Longe disso. "Esse disco tem muito do que poderia ter sido o disco de rock que eu iria fazer. E como esse disco seria clandestino, eu ia fingir ser outra pessoa." Mas existe razão outra para toda essa impessoalidade, que não passa impune, já que sua discografia anterior é marcada pelas canções autobiográficas, sejam de pequenos documentários, sejam de personagens da vida real. "É que não estou com vontade, nem acho oportuno no momento contar muitas coisas sobre a minha vida", diz ele. "Mas há canções nele, como ´Minhas Lágrimas´, ´Waly Salomão´ e, sobretudo, ´Não me Arrependo´, que são documentais, dizem respeito a situações reais que tenho vivido." Músicas documentais Uma das últimas a entrar no repertório, "Waly Salomão" foi escrita no dia de sua morte. Triste, não passava de um texto sem pretensões, a não ser de um desabafo, de uma lembrança. Não era poesia, nem tinha estrutura para isso. Resgatou esse texto e em cima dele, criou dois acordes, o que deu origem a uma música Caetano diz ter sentido muito sua morte, curiosamente de todos os amigos que se foram, é de Waly que mais sente a perda. "Me emocionava muito a brincadeira que ele fazia, de que Deus não dava asa à cobra, mas a esta aqui..., gritando e apontando para mim." Ainda nos resquícios autobiográficos, "Minhas Lágrimas" fala de sua estranheza em relação à cidade de Los Angeles. Caetano gosta de cidades. Quando mora em uma cidade, prefere que sua casa esteja numa região onde a cidade é cidade. "Teria horror a morar num condomínio na Barra da Tijuca ou em Alphaville. Gosto de morar onde também estão as livrarias, as padarias e as pizzarias." E esse aconchego de cidade Los Angeles não lhe oferece. Gíria carioca da garotada Para ainda mostrar que nem tudo é tão impessoal assim, em "Rocks" Caetano se apropriou de uma gíria bem carioca, típica da garotada da idade de seu filho adolescente. "Você foi mor rata comigo", diz um trecho dela. Se tem uma coisa que atrai a atenção de Caetano é a gíria atualizada de uma geração. "Os meus discos têm as gírias da época. Sinto a língua viva, tem um frescor. Serei sempre aquele tipo de velhinho que fala as gírias dos jovens", diverte-se. Em contrapartida, este trabalho torna-se mais pessoal na medida em que Caetano participou ativamente de todo o processo dele, inclusive sua feitura sonora. Sempre tendo Pedro Sá como sua referência, seu ponto de apoio. "O diálogo com Pedrinho foi essencial para esse disco porque não teve uma canção que eu não mostrasse primeiro a ele, que não dissesse a ele como gostaria que fosse feita. Esboçava no violão e mostrava a ele." Não a Lula Caetano diz ainda não saber ao certo em quem votará nas próximas eleições para presidente, mas tem certeza que não votará em Lula. Diz não se arrepender de ter votado nele na primeira vez, mas não o fará de novo. "Achei os escândalos do mensalão realmente ´indignantes´. Não gosto dessa onda de passar esponja e apagar." Ele afirma ainda não gostar da idéia de reeleição, nem para Lula, nem para FHC, ou para outro candidato. "O que Fernando Henrique nos deu com isso? Oito anos dele e oito anos de Lula. Ou seja, 16 anos de esquerda marxista da USP. Eles podem ficar 16 anos, mas não por meu gosto, nem com meu voto." E completa: "Não tenho medo de Geraldo Alckmin com a Igreja Católica no poder, ou de Lula com o bispo no poder. A única coisa que tenho medo é a reeleição de Lula no primeiro turno." (A repórter viajou a convite da gravadora Universal)

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