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"Calado" retoma delicadeza e melancolia do samba

Rômulo Fróes lança seu CD promissor com show em São Paulo Clique para ouvir "Calado" Clique para ouvir "Suíte"

Por Agencia Estado
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O cantor e compositor paulistano Rômulo Fróes, de 32 anos, parece roqueiro, mas faz samba. É grandalhão, mas canta suavemente. Vive bem e feliz, mas faz canções tristes. Seu promissor disco de estréia, Calado (Bizarre Music), foi composto por não-músicos, mas quem toca é a fina flor do choro de São Paulo. O entremeio desses e outros contrastes resultou num dos discos mais bonitos e interessantes das temporadas recentes. É a cara do outono. O samba predomina, mas não é exatamente um CD de sambista. "Não quero ser identificado como um bastião, que considera o samba algo intocável. Ao mesmo tempo não defendo misturas com guitarra ou drum´n´bass. Defendo a música boa. Paulinho da Viola não é careta, não tem idade, não tem tempo. Não precisa de um filme para se defender disso. Quem o acusa de tradicionalista é que está errado", diz Fróes sobre um de seus mestres. Calado é um disco que reforça a tendência de retorno à delicadeza no samba (ou em torno dele), que reverencia os ancestrais. Os trabalhos recentes das cantoras Teresa Cristina, Mônica Salmaso, Adriana Maciel, Jussara Silveira e Vanessa da Mata vêm difundindo essa vocação. "Tomara que se configure essa tendência, porque a maioria hoje só tem como referência Jorge Aragão, Zeca Pagodinho. Não quero defender a tradição, mas a canção. E a canção brasileira é naturalmente triste. Isso não é defeito, ao contrário. A tristeza na música não tem nada a ver com a tristeza na vida. Ao contrário dos americanos que cantam pra fora, o brasileiro canta baixo, pede licença, como João Gilberto. Isso vem da nossa timidez de homens cordiais. É um contraponto a essa alegria besta, desvairada, erotizada, que predomina." Amanhã Fróes e banda fazem show único de lançamento do CD no Sesc Pompéia, em São Paulo. As influências facilmente identificáveis no disco são de Batatinha, Nelson Cavaquinho, Paulinho da Viola e Cartola - ícones do samba delicado e triste -, além de Jards Macalé. O show mantém a aura em torno do imaginário desses sambistas clássicos, mas Fróes diz que vem tentando se livrar das referências para produzir algo mais autoral. Ele é aglutinador de idéias conjuntas, como também tem sido tendência no pop brasileiro. O cantor de voz envolvente divide a autoria das canções com Eduardo Climachauska (o Clima) e o artista plástico Nuno Ramos, de quem é assistente há cinco anos. Essa é outra surpresa do disco. "Há um amadorismo, no melhor sentido de quem pode experimentar, mas não tem nenhum naïf ali. Somos frutos da cultura." O disco abre com a vinheta Agosto, que tem apenas uma cuíca... "latindo". No miolo, a ótima faixa instrumental Calado lembra Moacir Santos, mas tem um baixo desafinado propositalmente. Em Não me Pergunte, um coro masculino, o que já é pouco comum, acompanha Dona Inah, em perfeita falta de sincronia. (Fróes conheceu a veterana Dona Inah e o grupo de chorões que o acompanha em noitadas pelos bares.) "A minha filiação é da música do Rio e, no caso de Batatinha, da Bahia, mas só em São Paulo poderia fazer esse tipo de experiência, sem ser cobrado por qualquer filiação. Aqui é mais fácil não pertencer a nenhuma linha ou escola." Duas das faixas mais lindas e melancólicas do disco, Diferente de Quem Fica Rindo e Será Que Ela É Feliz, falam de amor e solidão. Têm algo de pop que os arranjos camuflam em grandes achados, à base de violão, contrabaixo e trombone. Fróes prefere cruzar Ataulfo Alves com Noel Rosa em Na Cadência do Samba e Fita Amarela, em brilhante interpretação com que encerra oficialmente o disco. Na seqüência, uma faixa oculta (um tipo de piadinha que ele detesta, mas que concedeu por sugestão alheia) funciona como um manifesto conceitual do trabalho. É Pra Que Cantar (Nuno Ramos), que diz: Pra que cantar com alegria/ Cantar assim faz mal a quem é triste/ ...Me deixe fora dessa euforia de três dias/ É carnaval, ninguém resiste/ Espalha-se a felicidade. Batatinha assinaria embaixo. Rômulo Fróes. Amanhã, às 21horas. De R$ 3 a R$ 10. Teatro do Sesc Pompéia. Rua Clélia, 93, tel. 3871-7700.

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