Bob Spitz fala com exclusividade ao estadao.com.br

'Yoko tentou fisgar primeiro Paul, depois John. Mas acredito que o interesse de John por ela foi natural', diz

PUBLICIDADE

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

O jornalista e escritor Bob Spitz, americano de Connecticut, conseguiu uma rara proeza: escrever um livro dos Beatles cheio de revelações. The Beatles - A Biografia é um calhamaço de quase 1.000 páginas e chegou esta semana às livrarias (Editora Larousse, R$ 99). Está sendo considerada uma das melhores obras sobre os Fab Four.   Spitz concedeu entrevista exclusiva ao portal estadao.com.br por e-mail, no início da tarde desta quarta-feira, 19. Ele é autor de vários livros sobre a música pop, como Making of Superstars, Barefoot in Babylon e uma alentada biografia de Bob Dylan. Escreve regularmente para publicações como New York Times Magazine, In Style e Esquire. A edição brasileira de The Beatles - A Biografia tem prefácio de Sérgio Dias, dos Mutantes.   'The Beatles - A Biografia' levou 8 anos de pesquisa. Em que medida a autobiografia oficial dos Beatles foi útil para você? O que há de verdade e mentira naquele livro?   Bob Spitz - Quando entrevistei Paul McCartney, em 1997, ele explicou que a ‘biografia oficial’ dos Beatles, de Hunter Davies, de 1967, era só 60% verdadeira. O resto foi ocultado pelos Beatles para proteger amigos, famílias e namoradas dos lados mais sombrios das histórias. Infelizmente, os Beatles repetiram essa história tanto tempo que esqueceram o que era verdadeiro e o que eles inventaram. O livro Anthology, ou isso a que você se referece como The Beatles' Autobiography, é uma confusão de fatos. Os Beatles contam experiências que eles ouviram falar por outras pessoas, não sabendo dizer o que é verdade ou não. Por isso, muitas partes daquele livro contém imprecisões. Os Beatles adaptaram isso como a sua história e realmente acreditaram no que eles diziam. Minha intenção, em The Beatles - A Biografia, era formular uma biografia do grupo baseada apenas em fatos, o que me consumiu 2 anos e meio de pesquisa e outros 5 anos e meio para escrever.   Você descreve Yoko Ono como uma espécie de caçadora, obcecada por Lennon e fazendo todo o necessário para caçá-lo. Muitas biografias descrevem o interesse de Lennon por ela como natural, não forçado. Você tem certeza do que escreveu?   Sim, tenho certeza. Yoko tentou fisgar um dos Beatles - primeiro Paul, e depois John. Mas também acredito que o interesse de John nela foi completamente natural. Ela conseguiu divertir e cativar o interesse - e finalmente conquistá-lo, Por muito tempo, John foi um homem muito frustrado - seu casamento com Cynthia, o qual ele não amava, e sua música e relações com os Beatles, dos quais ele se distanciava. Sua frustração o consumia. Yoko mostrou a ele o caminho e o libertou.   Você teve à disposição, para pesquisa, quase 500 livros escritos sobre os Beatles e seu legado. Eles foram a mais retratada banda do mundo. Qual é a diferença deles e dos Beatles? Dylan não é uma figura muito pública, é um misantropo. Foi mais difícil com Dylan?  Para mim, foi mais fácil escrever a respeito de Dylan porque as pessoas que foram mais próximas a ele são muito articuladas e habilitadas para oferecer um retrato muito íntimo de Bob. Além disso, quando escrevi sobre Bob, o único livro que havia sobre ele era uma por assim dizer ‘biografia’ escrita por Anthony Scaduto, feita basicamente de entrevistas com Dylan as quais ele considerava fiéis. Entrevistei 400 pessoas. E tive sorte - a experiência estava ainda muito fresca nas mentes dessas pessoas naquela época.   Seu foco é muito centrado nos primeiros anos da vida dos Beatles, especialmente o período em Hamburgo, na Alemanha. Você acredita que aquele início foi decisivo no futuro dos Beatles? Acredito verdadeiramente que os Beatles são produtos de Liverpool. Tudo que se tornaram é um resultado direto de terem crescido em Liverpool, tocando em bandas lá - aquela incrível comunidade musical que eles integraram. E Hamburgo foi onde mais tarde se tornaram Os Beatles. Antes de Hamburgo, eram conhecidos como "a pior banda de Liverpool", e aquilo era justo. Eles eram terríveis, não tinham traquejo de palco, não tinham sonoridade, não tinham baterista, não tinham música original. Quando foram para Hamburgo, foram forçados a tocar muito, sets de 10 horas seguidas, e foram empurrados para o êxito. Quando retornaram a Liverpool, eram outro grupo, e mudaram todos os outros grupos em Liverpool, criando um som, um visual e uma mística que era sedutora e completamente original.   Há um filme de ficção que fala de uma oferta milionária para os Beatles fazerem um único show. O filme mostra Paul McCartney visitando Lennon para convencê-lo a fazer o concerto por aquela fortuna. Você acredita que haveria uma quantidade razoável de grana para mudar a decisão dos Beatles de nunca mais tocarem juntos?   Sem dúvida, os Beatles nunca poderiam aparecer no palco de novo como Os Beatles. Nenhuma quantia em dinheiro mudaria isso. Um empresário de Nova York ofereceu U$ 30 milhões, que seriam doados para a caridade, se aceitassem sua oferta, e eles nem mesmo levaram a sério. Uma coisa sobre a qual os Beatles concordavam era que seu legado era uma coisa preciosa. Eles nunca fariam algo - qualquer coisa - que danificasse essa reputação. Eles foram os Beatles durante 10 anos. Posso assegurar a você que aquela performance deles juntos do telhado de seus escritórios em 1970 teria sido sua última - eternamente -, mesmo se todos eles tivessem conseguido viver até os dias de hoje.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.