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Banda Mantiqueira faz 25 anos com show no Bourbon e álbum com participação de Wynton Marsalis

Sob direção do clarinetista e saxofonista Nailor Proveta, um dos principais grupos instrumentais do País faz apresentação nesta terça, 31, na casa de show de Moema

Foto do author Julio Maria
Por Julio Maria
Atualização:

Nailor Proveta é um músico a ser estudado. Um clássico da espécie, o homem que começa sua história nas ruas do interior, aos sons do pai e do avô acordeonistas, e que segue com o que ouve dos amigos, que passa pelos coretos de praça, pelos clubes de baile, pelos palcos de hotel, por uma pensão na Bela Vista, por programas de TV e que chega à academia. Então, quando poderia se deslumbrar com o acúmulo de conhecimento saindo pelos poros, ele volta onde tudo começou, conta três, quatro, e seu pelotão ataca. O baterista sai em um giro rápido, os metais entram quentes e as madeiras suavizam. A cama está pronta. Segura Ele, o choro de Pixinguinha e Benedito Lacerda, é um tiro desferido pelo pandeiro de Cleber Almeida e reforçado pelos solos de clarinete do próprio Proveta e pelo flugelhorn de Wynton Marsalis, um senhor que não é exatamente do ramo, mas que aprende rápido nas ruas de Proveta.

Banda Mantiqueira em pausa de ensaio, no Greenman Studious Foto: JF DIORIO /ESTADÃO

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A Mantiqueira está no palco. É uma experiência vê-la ali, juntando histórias que saem de sopros, cordas e percussão. A sensação é dupla, de se ouvir o todo e ouvir cada um, talvez reflexo do que pensa o próprio clarinetista diante da partitura em branco. “Fazer arranjo é como tirar uma foto de quem vai tocá-lo. Não podemos perder o músico dentro do arranjo.” A Mantiqueira faz 25 anos com um álbum novo. Com Alma, que sai pelo Selo Sesc, é o primeiro nos últimos 12 anos. A agenda de apresentações já seguiu por unidades do Sesc de São Carlos, Jundiaí e Pompeia, mas há ainda a chance de vê-los no charme do Bourbon Street, hoje, a partir das 22h.

Con Alma é um tema de Dizzy Gillespie, o trompetista norte-americano que faria 100 anos no próximo 21 de outubro se não tivesse partido, em 1993. Seu disco, assim, é uma homenagem por tabela ao centenário de Dizzy, um presença que também pode ser sentida no espírito da Mantiqueira. “Dizzy, que vem direto de Louis Armstrong, faz um elo com a rua. Ele nunca perdeu a dança de vista”, diz Proveta.

Quando fala de Dizzy, também fala de si. A música que toma seu pensamento de arranjador e clarinetista busca uma comunicação com um público iniciado ou não e que, em essência, não é nada diferente dele mesmo. Eis um dos mistérios da eternidade da Mantiqueira. Desde que surgiu no começo dos anos 1990, com uma linguagem pioneira, seus músicos se divertem tocando para si e, logo, tocando para todos. A esfera em que cada um da plateia embarca é eleita pelas almas. Os estudantes se apegam às harmonias, às aberturas de vozes ou a qualquer outro estratagema técnico que brilhe uma arquitetura como a feita no novo disco para Desafinado, de Tom Jobim, com violão de Romero Lubambo. Outros, sem ouvidos treinados, mas de quadris fervendo, só gostariam de estar de pé na sala de concerto para deixar o corpo responder aos estímulos de Forrólins, um frevo de Cacá Malaquias feito em homenagem ao saxofonista norte-americano Sonny Rollins. Lubambo volta para outros dois temas, Con Alma, com outro solo de flugel de Marsalis, e De Frente Pro Crime, um aceno carinhoso ao padrinho, João Bosco.

Nailor Azevedo, o Proveta, despencou na São Paulo dos anos 1980 quando Leme, no interior paulista, ficou pequena para sua batuta. O pai pedreiro, com ouvido tinindo, já havia se orgulhado do garoto regendo banda aos 9 anos de idade ou fazendo baile aos 14. Aos poucos, envolveu-se com músicos, ganhou respeito e seu nome circulou. Chiquinho de Moraes, o arranjador de Roberto e Elis Regina, se viu um dia desfalcado para o show da cantora Simone. O primeiro sax alto da orquestra, Lambari, não poderia tocar. Ligaram para Leme. “Você encara essa?”, Proveta mordeu o osso e não largou mais. Da orquestra de Simone seguiu para o time do saxofonista argentino Hector Costita. Sua escola agora teria o nome de 150 Night Club, o antológico pub do Hotel Maksoud Plaza, rota do jazz internacional em São Paulo.

Um dia, ligaram em sua casa. “Proveta, você pode dar uma chegada aqui na Sala São Paulo? Wynton Marsalis quer fazer um som com você.” De clarinete no estojo, sem um único ensaio, sem saber nem que tema tocaria, pra lá foi. Subiu ao palco como convidado, fez o serviço e voltou para casa.

A Mantiqueira surge dos amigos músicos que vivem em uma república na Rua Conselheiro Carrão, 291, na Bela Vista. Nailor Proveta idealiza um grupo nos moldes das big bands norte-americanas, mas fazendo música brasileira. Algo que não existia. Os adeptos chegam mais e o líder aprende a equilibrar 14 copos em uma bandeja. Cada um ali, mesmo por representarem o melhor que se tem em seus instrumentos, tem outros trabalhos o ano todo. É preciso juntá-los, organizá-los, cobrá-los. E, no momento de compor os arranjos, fazer suas fotografias. É assim que fica a foto da Banda Mantiqueira, pelo próprio Proveta: Ubaldo Versolato (sax barítono, flauta e piccolo): “Um sopro clássico da bossa nova”. Josué dos Santos (sax tenor e flauta): “Desenvolve uma espécie de pós-jazz”. Cássio Ferreira (tenor, soprano e flauta): “O cruzamento do jazz com a música brasileira”. Valdir Ferreira (trombone de vara): “Um grande melodista”. Odésio Jericó (trompete e flugelhorn): “A genuína gafieira”. Nahor Gomes (trompete): “Trompete de big band nato”. Walmir Gil (trompete): “Um bebopeiro”. François de Lima (trombone de válvula): “É do suingue”. Jarbas Barbosa (guitarra): “Crossover, jazz brasileiro”. Edson Alves (baixo e violão): “Criador de canção brasileira”. Cleber Almeida (percussão): “Conhece jazz muito bem”. Fred Prince (percussão): “Um sambista de nascença”. Celso de Almeida (bateria): “Outro cara demais do samba”. Cacá Malaquias (sax, participação especial no disco): “Nosso Sony Rollins do Nordeste”.

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