As sutilezas da canção francesa

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

A bela e jovem soprano européia Véronique Gens, que se deixa acompanhar pelo piano luxuriante de Roger Vignoles, faz-nos participar de uma aventura a um só tempo refinada e cativante. Durante toda uma hora, essa cantora nos mergulha nas sutilezas da canção francesa, com o auxílio de miniaturas lapidares assinadas por Fauré, Debussy e Poulenc (Cd importado do selo Virgin Classics). Como se sabe, no domínio da música clássica, foi durante o século passado que os alemães desenvolveram a canção para voz solista com acompanhamento pianístico camerístico a que chamaram de Lied (literalmente: canção). Na França, esse gênero camerístico - aqui chamado, por alguns, de "canção artística", na tentativa pernóstica e inútil de diferenciá-lo da canção popular - ganhou o nome de mélodie. Explorada desde o início do Romantismo por visionários como Berlioz, a mélodie frutificou grandemente na terra de Verlaine e Rimbaut. E, no último quartel do século, atingiu estratosféricas alturas criativas. Um dos responsáveis por essa fantástica floração foi Gabriel Fauré (1845-1924), que aliou texto poético e música de maneira singular. Depois de um sonho, À Beira D´Água, A Borboleta e a Flor e Luar, que estão entre as oito canções suas escolhidas por Mademoiselle Gens para a presente antologia, são sutis e inesquecíveis aquarelas sonoras. Mais jovem que Fauré e ainda muito mais ousado que ele foi Claude Debussy (1862-1918), que também deixou mélodies estupendas, portadoras de reticente expressividade. Em Canções de Bilitis, Festas Galantes, Noite de Estrelas e Tarde Linda, dentre outras incluídas nesse CD, ele se mostra o inquieto gênio das soluções imprevisíveis. Em suas canções, as melodias-quase-falas da voz são imersas em semoventes constelações de sons que o piano não se cansa de renovar. Já Francis Poulenc pertence a outra galáxia de cancionistas. Vivendo entre 1899 e 1963, ele parece ter-se divertido em colocar em suas canções ora o tom deliciosamente rebuscado de Banalidades, ora o sentimentalismo algo café-concerto de Os caminhos do Amor. E, aqui e ali, deixa aflorar a ironia própria do artista sofisticado e (surpresa!) um bocado ingênuo. Véronique Gens possui uma linda voz, uma pronúncia saborosa e um estilo superior. Ela consegue emprestar vida nova a esse repertório que tem a força dos rendandos bem feitos. E fica difícil imaginar outro pianista tão compreensivo à sua arte quanto Rober Vignoles, que realiza tudo com suprema finesse.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.