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André Téchiné é reverenciado pelo Festival de Cannes e pelas atrizes com quem trabalhou

Diretor francês completa 50 anos de carreira

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

CANNES - Ele estava cercado por todas elas, suas mulheres maravilhosas. Elodie (Bouchez), Isabelle (Huppert), Juliette (Binoche), Sandrine (Bonnaire), Sandrine (Kiberlain). E, claro, Catherine (Deneuve). O tempo passa e a cabeleira continua de ouro. Na segunda, 22, Catherine não participou apenas da homenagem do Festival de Cannes a André Téchiné. Ele se esqueceu de Juliette - o diretor artístico Thierry Frémaux teve de soprar em seu ouvido quando Techiné disse que estava esquecendo alguém. Juliette levou na esportiva. Vestida de vermelho (paixão), deu uma sonora gargalhada que ribombou na Salle Debussy. Mas de Deneuve, Téchiné não se esqueceu. Lembrou que foram sete filmes, e se trata de uma parceria que deve continuar. “Ainda tenho muitos filmes dentro de mim”, anunciou o diretor.

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Na festa de seus 70 anos, Cannes tem prestado homenagens. Toda noite, a vinheta do festival - 33 segundos do Carnaval dos Animais, de Saint-Saëns, acompanhando a subida da escadaria que leva à Palma de Ouro -, tem celebrado os grandes diretores que fizeram história em Cannes. O topo, quem vai para o topo? Luchino Visconti, Federico Fellini, Robert Altman. O festival homenageou Téchiné por seus 50 anos de carreira, e fidelidade a Cannes. Projetou, em presença de suas estrelas, o novo filme do diretor - Nos Années Folles.

Uma história real, devidamente romantizada. Paul e Louise Braque. Ele desertou na 1.ª Guerra. Poderia ter sido fuzilado. A mulher criou uma persona feminina para ele se esconder. Paul tomou gosto pela coisa. Virou Suzanne. Macho com a mulher, e batia nela, era fêmea com os outros homens. Louise resistiu quanto pôde. A coisa terminou em tragédia. A noite foi linda - quatro minutos de aplausos ininterruptos. Toda a Salle Debussy, que abriga a mostra Un Certain Regard, de pé, para celebrar Téchiné. Mas o filme, infelizmente, não é um grande Téchiné. Ele disse que as mulheres, e não os grandes diretores de fotografia com quem trabalha, iluminam seu cinema. A bela da vez é Céline Sallette, mas a honra da noite foi de Catherine, a Deneuve, que celebra em Cannes Classics, outro cinquentenário. A Bela da Tarde, de Luis Buñuel, completa 50 anos em 2017. E está de volta, nesta terça, 23, em versão restaurada. Novo em folha.

Juntos. André Téchiné no centro entre Catherine Deneuve e Emmanuelle Beart Foto: Jean-Paul Pelissier/Reuters

Justamente ontem, o 70.º Festival de Cannes chegou à metade. Mais seis dias até a Palma de Ouro, que será entregue no domingo, 28. No domingo passado, 21, chegou o Michael Haneke. Vovô/Jean-Louis Trintignant conta uma história à netinha suicida. Mostra-lhe fotos, da ex-mulher. Conta que a amava loucamente e foram muito felizes, até que ela ficou doente. Terminal. Vovô sufocou-a, provocando sua morte. Não se arrepende. Foi a coisa certa a fazer. Ops! Já vimos esse filme - de Haneke, com Trintignant. Chamava-se Amor e lhe valeu a segunda Palma de Ouro (após a de A Fita Branca). Há um culto a Haneke. É um misantropo, mas isso não incomoda seus tietes. Happy End, o novo Haneke, mostra esse velho que quer se matar. Conseguirá? De fundo, o estado do mundo. Dinheiro, muito dinheiro. A miséria de sempre - refugiados. Como novidade, a pornografia na internet.

O mundo não é menos sórdido ‘chez’ Yorgos Lanthimos. O autor grego é outro cultuado em Cannes. Concorre à Palma com The Killing of a Sacred Deer, O Assassinato do Cervo Sagrado. Colin Farrell, Nicole Kidman. Ele é um cirurgião bem-sucedido. Liga-se a um jovem cujo pai morreu em suas mãos. O garoto tem uma agenda macabra. Mediante um sortilégio que nunca fica muito claro - os deuses - entra na vida de Farrell e sua família. Lança uma maldição que faz com que o casal de filhos fique paralítico. E é só o começo. O garoto exige - papai terá de matar uma das crias. Olho por olho, vingança. Lanthimos fez a sua versão (livre) de uma tragédia grega. Ifigênia, de Eurípides. O filme é belo de ver e ouvir, mas essa versão da lutas de classes numa Europa decadente - basta comparar a casa do garoto com a do médico - beira à repugnância moral. É mais ou menos como o patriarca Trintignant acuando imigrantes para que o matem, e os pobres, farejando mais encrencas que já têm, fogem apavorados. O festival avança. Chegam as mulheres da competição. Nesta terça, Naomi Kawase, Radiance/Vers la Lumière, Em Direção à Luz. Na quarta, Sofia Coppola, The Beguiled. Pedro Almodóvar, grande criador de personagens femininas, será sensível às autoras, como presidente de júri? Logo descobriremos.