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Allen Toussaint provou a fama de originador

Na base do funk, do soul e do R&B de New Orleans, pianista fez show eclético e vibrante na abertura do Bourbon Street Jazz Festival

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

Allen Toussaint em apresentação em 2011, em Nova York Foto: LUCAS JACKSON/REUTERS

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Allen Toussaint disse aos seus músicos, apontando para a plateia no Parque do Ibirapuera. “Gente, é o Brasil!”, numa atitude de real entusiasmo. “Essa é minha primeira vez no Brasil. Estou feliz de estar aqui”. Após quase 60 anos de carreira, um dos pilares do R&B norte-americano desembarcava em um show ao ar livre para apresentar sua arte fundadora ao público nacional, às 17h40 de domingo, para um público que ia de fãs do jazz a skatistas de passagem e corredores esgotados.

Justamente por isso, foi uma delícia descobrir que ele trouxe de tudo em sua bagagem. O piano de Toussaint viveu o auge do funk (mas seu groove é diferente), viveu o auge do soul (mas sua suavidade é meio movediça, pantanosa), o auge do rock’n’roll (mas seu rock’n’roll é menos ardido) e do R&B (mas seu R&B é meio cajun). O repertório da tarde incluiu tudo isso e mais, até reggae ele tocou. O baixo do funk de New Orleans tem uma pulsação distinta, daí porque é uma escola à parte no funk norte-americano, seus metais não vivem de espasmos como no funk nova-iorquino. Por isso, a presença do toque sofisticado de Gary Brown, o saxofonista de Toussaint, causava tanto efeito de aquecimento na noite fria do parque.

O show era de alta combustão sonora. Músicas como Soul Sister (do disco Live, Love and Faith, de 1972), traziam um atmosfera de blackexploitation, de balé urbano ao Ibirapuera, que era corroborada por outras pulsações de rock original, como A Certain Girl (composição dele de 1961, que estava no primeiro compacto dos Yardbirds). De terno art-nouveau vermelhão e sandálias franciscanas, Toussaint cantava e impulsionava os solos de sua banda, mostrando sua importância não só como pianista, homem de frente, mas também como um dos originadores dos principais ritmos que hoje conhecemos dentro do invólucro geral de “música negra”.

Toussaint está com a voz firme e os dedos correm ágeis pelo piano, não é um Jerry Lee Lewis se arrastando pelos palcos (e sua arte também não é fundada num arrastão sonoro, ele é refinadíssimo). Pouca coisa foi mais inspiradora, para gerações de funkeiros ou rappers, que Get Out of My Life, Woman, cuja cadência sua banda espalhou pelas toalhas de piquenique do Ibirapuera como um Bordeaux de primeira linha, fundada numa delicada treliça de piano e metais, com os vocais repetidos como num culto pagão.

A cadência e os ritmos da Louisiana entraram pela lã dos suéteres no Ibirapuera quando ele tocou a elétrica Sneakin’ Sally Through the Alley (que foi gravada por Lee Dorsey nos anos 1960 e por Robert Palmer nos anos 1960). Ao seu lado, descalço, estava um vibrante Renard Poché, guitarrista que também tocava flauta e servia como uma espécie de showman de frente do concerto. Foi à frente do palco com Mother in Law, “recuerdo” dos vibrantes anos 1950, dançando e provocando, enquanto Toussaint fazia tanto a voz principal quanto o corinho. Debulhando no piano. Um show para não ser esquecido tão cedo.

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