A vida conturbada de uma diva do jazz

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Por Agencia Estado
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Ela não canta. Transmite sentimentos. Impressionado, o pianista Jimmy Rowles não escondia seu fascínio pela voz de Billie Holiday, que a acompanhava durante as apresentações nos anos 50. Uma admiração que cresceu ao longo dos anos, transformando-a em uma das maiores divas da história do jazz, rodeada de fatos míticos. Filha da doméstica Sadie Fagan, Eleonora (seu nome verdadeiro) foi abandonada pelo pai logo depois de nascer - em 17 de abril de 1915, segundo algumas fontes, ou 7 de abril. O guitarrista Clarence Holiday, que chegou a tocar com Fletcher Henderson, preferiu a vida na estrada e nunca se importou com a filha. Anos mais tarde, já famosa, Billie teve a chance de se vingar, recusando trabalho para o pai em seus shows. Criada no gueto negro de Baltimore, a menina sofreria dramas irrecuperáveis. Aos 8 anos, viu a bisavó morrer em seus braços. Acabou no psiquiatra, para se recompor. Aos 10, foi violentada por um pensionista de sua mãe. No julgamento, a justiça inocentou o acusado branco e ainda obrigou Eleonora a passar uma temporada em um reformatório, onde passou a primeira noite em companhia do cadáver de outra menina. A situação, que já era ruim, piorou: já morando no Harlem, o gueto negro de Nova York, mãe e filha sofreram com uma fome abjeta. Para sobreviver, Eleonora prostituiu-se e, aos 14 anos, já estava viciada em heroína e contava com uma lista de prisões e espancamentos. Certa noite, esfomeada e com frio, pediu emprego no Log Cabin Club. O proprietário Jerry Preston queria uma bailarina e rejeitou seus passos desajeitados. Desesperada, ela pediu nova chance: propunha cantar os blues de Bessie Smith e Ma´Raney, que ouvia em um bordel a poucos metros de sua casa - lá, Eleonora fazia o serviço gratuito de limpeza, só para ouvir aqueles discos. A fome e o frio transformaram sua voz em um lamento desesperado e os clientes choraram ao ouvir Body and Soul, obrigando Preston a contratá-la. A diva nascia. Logo estaria entre os grandes nomes, já batizada como Billie Holiday, cantando em bares elegantes, com uma gardênia ornamentando o cabelo. A associação com o pianista Teddy Wilson garantiu-lhe o título de dama do jazz. O saxofonista Lester Young apelidou-a de Lady Day. O auge da fama mostrou que ela também não era santa: teve brigas constantes com maridos e empresários, além de não perder o vício de heroína. O fracasso nos palcos apressou sua morte, aos 44 anos, a 17 de julho de 1959, em um hospital de Nova York. Seus pertences resumiam-se a US$ 75 em notas amarrotadas e uma conta bancária de 70 cents. O legado musical, porém, ultrapassa barreiras.

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