PUBLICIDADE

A inquietude áspera de certa Polly Jean Harvey

Quatro anos após o premiado Stories from the City, Stories from the Sea, a cantora inglesa lança Uh Huh Her, desde já um dos mais inventivos discos de 2004

Por Agencia Estado
Atualização:

Quatro anos depois do belo álbum Stories From the City, Stories From the Sea, P.J. Harvey, uma das cantoras mais inquietas e interessantes da música pop internacional, volta a ser notícia com outro álbum fenomenal: Uh Huh Her (lançamento Universal Music), consolidando-se como uma das vozes mais autênticas e independentes de sua geração. Primeiro, é preciso advertir: não é um disquinho para tocar em festinha nem para embalar namoricos. É denso, áspero, ousado. Agora com 35 anos, Polly Jean Harvey não pára. Já cantou com Nick Cave no sombrio álbum Murder. Fez música para a Mark Bruce Dance Company. Cantou Satisfaction com Björk em Londres, em 1994, durante a entrega dos Brit Awards. Em Uh Huh Her, ao contrário de Stories, ela compõe e interpreta sozinha. Não tem parceiros, como os do disco anterior, Thom Yorke (do Radiohead, que cantou em duas faixas) e Mick Harvey, baterista do grupo de Nick Cave. Há apenas uns vocais de apoio, como os de Evelyn Isaac em The Darker Days of Me & Him. P.J. escreve com caneta sobre fotos de polaroid no encarte do disco, apontamentos que parecem sem sentido. "No neurosis, no psychosis, no psycoanalysis", afirma, com seu nariz estranho, e olhar profundo, sério. Ouvindo-a, com sua inquietude áspera, é possível entender por que outro angustiado, Kurt Cobain, a incluiu na lista de seus 50 discos favoritos (com o álbum Dry). Em canções como The Desperate Kingdom Of Love, The Letter, Cat On The Wall e Pocket Knife, P.J. reafirma sempre aquela impressão de que, como escreveu a crítica Jennifer Vineyard, "não há drama louco sem pacífica tranqüilidade". Em alguns momentos, ela é comparada à misteriosa Nico (a cantora alemã Christa Päffgen, que integrou por breve e fulminante período a banda vanguardista Velvet Underground). De fato, há um componente de cabaré na sua performance. Mas é em Patti Smith que reside seu modelo mais durável, mais identificável. Ao contrário de Patti, no entanto, ela não viveu o sonho psicodélico e sua música é bem mais realista, dura, desesperada. Seu trabalho se estende a colaborações surpreendentes, inesperadas. Recentemente, ela trabalhou com Damon Albarn (do Blur) e Nick Cave nas composições do álbum Before the Poison, de outra musa alternativa, Marianne Faithfull, que deverá sair em setembro. O disco tem notas escritas pelo romancista inglês Will Self. Outro colaborador é o compositor americano Jon Brion. Em setembro, ela também inicia a turnê desse novo disco de nome quase impronunciável, Uh Huh Her. "Mantenha todos os barulhos, arranhões, assovios e pancadas nas demos", recomenda a cantora, num dos seus conselhos de post-it colados no encarte. Não deixe de ouvir e reverenciar a integridade de P.J. Harvey, ainda em busca de uma pureza e do ruído essencial que havia na música em outros tempos - talvez o ruído da agulha no vinil no final da última faixa, talvez o barulho da emoção intacta do intérprete.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.