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Alice Ferraz: Na alegria ou na tristeza?

Em momentos de sucesso na vida, a gente está alegre, o coração leve, um mundo de possibilidades transborda de nossos olhos e sorrisos. Somos nesse momento um ímã que atrai

Por Alice Ferraz
Atualização:

Muita gente diz que a gente vê os amigos de verdade quando temos sucesso. Se eles estão lá, felizes, comemorando conosco, esses sim são amigos. Vou ter que discordar. Em momentos de sucesso na vida, a gente está alegre, o coração leve, um mundo de possibilidades transborda de nossos olhos e sorrisos. 

Somos nesse momento um ímã que atrai, uma porta que se abre com promessas dessa satisfação para todos que estão próximos. Conviver com quem está nessa fase nos conta intimamente que isso é possível para qualquer um de nós, se ele/ela pode, eu posso! 

Ilustração para a coluna de Alice Ferraz Foto: Juliana Azevedo

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Meu pai foi uma pessoa de relativo sucesso profissional durante boa parte da minha infância e adolescência. Um homem fisicamente forte e carismático e me lembro de amigos enaltecendo suas qualidades, aplaudindo suas conquistas e comemorando ao seu lado. 

De um dia para outro, literalmente, ele ficou doente e os amigos foram um a um se afastando. Depois de algum tempo, minha mãe ligava pedindo para virem tomar um café, passar meia hora para um papo, mas ouviu inúmeras vezes que era “duro demais ver ele como estava”, ou seja, doente. 

Como se a doença, que não era contagiosa no caso do meu pai, abrisse a tal porta ao contrário, com a lembrança de que existe a possibilidade de algo tão ruim acontecer para qualquer um de nós. 

Escrevo isso no contexto de uma trajetória de vida de conquistas e derrotas. O “efeito sucesso” já me fez entender quem vem por ele e, normalmente, entendo a posição do jogo e sigo. Mas nessa última semana, quando a doença bateu à porta de alguém que amo, assim como amei meu pai, lembrei a sensação de abandono quando compartilhar a dor fica pesado demais para a maior parte dos humanos. 

Recebi inúmeras ligações que se esvaziaram em uma semana em que a situação parecia piorar. Como diz meu marido sobre minha personalidade, “finquei uma bandeira” sobre o assunto e mandei mensagens tentando entender o sumiço de pessoas amigas. 

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Sinto dizer que nada de novo apareceu na paisagem desde que há 30 anos meu pai adoeceu. A doença, o fracasso, a dor são fontes de insegurança e conviver de perto com elas é pedir demais para o frágil equilíbrio que sustenta nossa certeza pessoal sobre a felicidade e saúde. Ah, já está tudo bem, e os amigos voltaram a ligar. 

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