Sem apoio, Jornada de Literatura de Passo Fundo é cancelada

Mais tradicional iniciativa de formação de leitores do País, ela já recebeu nomes como Mia Couto e Carlo Ginzburg

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Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

Pela primeira vez em sua história, a Jornada Nacional de Literatura desiste de uma edição por falta de patrocínio. O orçamento inicial era de R$ 3,5 milhões, valor que poderia ser captado por meio das leis Rouanet e de Incentivo à Cultura (RS). Com as dificuldades iniciais, diminuíram para R$ 3 milhões. Depois, para R$ 2,5 milhões. Não adiantou.

Nunca foi fácil organizá-la e, nas últimas três décadas, houve momentos em que Tânia Rösing, a idealizadora e coordenadora do evento, pensou em se resignar. Mas, mesmo aos trancos e barrancos, as lonas de circo eram montadas ano sim, ano não no câmpus da Universidade de Passo Fundo, para que 18 mil crianças e adolescentes e entre 3 mil e 5 mil professores pudessem participar de encontros com escritores e pesquisadores. A semana do evento costuma ser o encerramento de uma etapa do grande projeto de formação de leitores que é a Jornada – iniciado em sala de aula com a leitura de obras literárias e com trabalhos feitos a partir desses livros. A prática é constante nas escolas da região – em ano de Jornada ou não. 

Bienal, a Jornada promove o encontro de leitores de todas as idades com os autores dos livros que leram previamente Foto: UPF/Divulgação

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“Eu sempre dizia que o impossível não existe. Este ano, ele se fez presente”, disse Tânia Rösing ao Estado. O programa estava fechado e o tema seria Leituras em Liberdade. O cancelamento deve ser anunciado nesta quarta-feira, 20. 

Segundo a professora, mesmo empresas não afetadas pela crise usaram “a conjuntura financeira” como desculpa. “Acha que elas estão mal? Não, estão apenas na onda, surfando com a crise”, disse. Mas o silêncio vem de todos os lados. “Visitamos o governador (José Ivo Sartori) e até hoje não nos disseram se o Banrisul, que deu R$ 200 mil na edição passada, ajudaria com alguma coisa. Procuramos o secretário da Educação (Carlos Eduardo Vieira da Cunha) para pedir a liberação dos professores e nenhuma resposta. Pedimos audiência com o ministro da Educação (Renato Janine Ribeiro), que já veio a Passo Fundo como escritor, e nada. As portas do Ministério da Cultura estão fechadas - sem novos editais. Assim não dá. Ou fazemos uma coisa decente, de acordo com o conceito desenvolvido, ou não fazemos nada. E não vamos fazer, é definitivo.”

O Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon, no valor de R$ 150 mil e já vencido por nomes como Mia Couto, Chico Buarque, João Almino e Ana Maria Machado, também será suspenso este ano.

A Jornada seria realizada entre os dias 28 de setembro e 2 de outubro e este ano foi contratada uma empresa de captação de recursos, com atuação também em São Paulo e no Rio de Janeiro, já que o cardiologista de Tânia Rösing a proibiu de fazer as andanças que ela faz todos os anos para tentar fechar a conta. A professora, no entanto, considera que o resultado teria sido o mesmo se fosse ela batendo na porta das empresas. 

Quanto a buscar apoio fora do Rio Grande do Sul, ela diz: "Não deveríamos estar disputando, no Rio de Janeiro, espaço com a Flip. Admiro o trabalho que eles fazem, mas não temos nada a ver com a Flip. E não vou ficar disputando beleza com o BNDES, com a Eletrobrás, porque a bancada carioca é mais forte do que as outras". A Flip, aliás, também comentou suas dificuldades financeiras ao anunciar a programação no dia 12. A Casa Azul espera captar R$ 7,4 milhões para a edição de julho - e já conseguiu R$ 6,1 milhões. No ano passado, o orçamento final superou os R$ 8 milhões. 

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