Quais são as influências de Elena Ferrante?

Escritora italiana, que tem novo livro, 'A Vida Mentirosa dos Adultos', lançado no dia 1º de setembro no Brasil, já falou sobre suas principais referências

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Por Guilherme Sobota
Atualização:
Edição americana da série napolitana, maior sucesso de Elena Ferrante. Foto: CHRIS WARDE-JONES / THE NEW YORK TIMES - 4/12/2014

Quando o assunto é Elena Ferrante, leitores apaixonados saem de todos os lugares e escolhem seus temas preferidos: a força investigativa singular que sua obra aplica ao universo feminino e nas relações interpessoais de forma geral; sua identidade real, cercada de mistério - explicada, nas raras entrevistas, pela necessidade de que sua persona não interfira em sua obra; as influências que ela usa de maneira tão hábil para criar mundos particulares.

Sobre estas últimas, é possível encontrar caminhos na obra da autora, nas entrevistas esporádicas, e também no seu livro Frantumaglia, uma reunião de cartas, ensaios e conversas com jornalistas publicado mais recentemente, em terceira edição, em 2016.

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Veja a seguir algumas das principais influências de Elena Ferrante:

Elsa Morante

A própria Ferrante (ou quem quer que responda seus emails) já admitiu ser fã da escritora italiana Elsa Morante (1912-1985) - especula-se que escolheu de propósito um pseudônimo sonoramente parecido com o nome de Morante. Ela própria muito discreta, veio a ganhar reconhecimento internacional apenas após sua morte, e especialmente com os livros A História e A Ilha de Arturo, este publicado no Brasil em 2019 pela editora Carambaia. 

Não deixa de ser interessante que Morante tenha se debruçado sobre a infância do ponto de vista masculino. A versão é disputada, mas há quem aposte que Elena Ferrante é na verdade um escritor.

Marguerite Duras

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Ferrante disse em entrevistas que Marguerite Duras (1914-1996) é sua autora em língua francesa preferida. “Seu livro com quem eu passei mais tempo foi Le Ravissement de Lol V. Stein (1964); é seu livro mais complexo, mas também com o qual o leitor pode aprender mais”, disse ao Los Angeles Times em 2018.

Sigmund Freud e a psicanálise

Quem explica é a pesquisadora Fabiane Secches, autora de Elena Ferrante – Uma Longa Experiência de Ausência (editora Claraboia): “Nos textos de Frantumaglia (antologia de entrevistas, cartas, ensaios e artigos de Ferrante), a autora recorre muitas vezes à psicanálise. Menciona o texto Totem e Tabu, por exemplo, para argumentar sobre o que chama de ‘desejo neurótico de intangibilidade’. Diz que leu Freud desde muito cedo e é entusiasta de seus escritos. Ferrante também diz ter lido apaixonadamente a psicanalista inglesa Melanie Klein, cita o psicanalista francês Jacques Lacan e a pensadora belga Luce Irigaray, que tem trabalhos que transitam entre a psicanálise, a filosofia e a linguística. Quanto mais releio as obras de Ferrante, mais encontro elos possíveis e interessantes com a psicanálise”.

Bairro de Nápoles, cidade que é cenário constante nas obras da escritora italiana. Foto: NADIA SHIRA COHEN / THE NEW YORK TIMES - 11/5/2017

Suas próprias origens

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Em entrevista à Vogue americana em 2014 — ano em que o terceiro volume da tetralogia napolitana, História de Quem Foge e de Quem Fica, foi publicada nos EUA — Ferrante disse: “Escrever esse romance não me fez voltar ao passado; em vez disso, afirmou a ideia de que é impossível escapar das nossas origens”. Sua tetralogia também apresenta em caráter detalhado regiões de Nápoles, a cidade onde ela nasceu e cresceu (talvez o único dado biográfico livre de controvérsias), impossível de ser construído sem um largo estudo sobre a cidade. 

Ippolito Nievo

Na mesma entrevista, ela confessa profunda admiração por Ippolito Nievo (1831-1861), cujo romance Confessioni Di Un Italiano, publicado postumamente em 1867, é considerado um dos maiores clássicos da literatura italiana do século 19. O livro é também recordado como um retrato sólido da Itália do Risorgimento, o movimento político que levou à unificação do país.

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Madame Bovary e Mulherzinhas

O livro de Gustave Flaubert (1821-1880) também aparece como uma das paixões literárias de Ferrante em um texto em Frantumaglia. Em entrevista ao Los Angeles Times, publicada em 2018, Ferrante diz: “Como uma garota, quando eu lia, eu puxava as histórias e os personagens para o mundo em que eu vivia, e Emma (Bovary), não sei por que, parecia próxima a muitas das mulheres na minha família". A personagem tem ressonância importante também no novo livro de Ferrante, A Vida Mentirosa dos Adultos, que começa com a narradora, Giovanna, dizendo: "Dois anos antes de sair de casa, meu pai disse à minha mãe que eu era muito feia". Em Madame Bovary, Emma comenta, a respeito da própria filha: "É estranho como é feia essa criança". Ferrante também fala do livro de Louisa May Alcott ao jornal americano: "Mas antes de Madame Bovary, eu amei Mulherzinhas, eu amei Jo (personagem principal). Esse livro está na origem do meu amor pela escrita”.

Cena de 'My Brilliant Friend', série da HBO inspirada na tetralogia napolitana. Foto: DIVULGAÇÃO HBO

Personagens femininas

Outras personagens que Ferrante cita, na mesma entrevista, como algumas de suas influências são: Moll Flanders (do livro de Daniel Defoe, publicado em 1722); a Marquesa de Merteuil (de Ligações Perigosas, livro do francês Pierre Choderlos de Laclos, de 1782); Elizabeth Benneth (de Orgulho e Preconceito, de Jane Austen); Jane Eyre (do romance de Charlotte Brontë, de 1847); e Anna Kariênina, do livro de Liev Tolstói.

Italo Calvino

Em Frantumaglia, Ferrante usa o autor italiano Italo Calvino para defender sua própria privacidade. Calvino era um ferrenho defensor da tese de que tudo que um escritor tem a dizer se encontra na própria obra que ele escreve.

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