Olga Tokarczuk e Peter Handke ganham o Prêmio Nobel de Literatura de 2018 e 2019

A polonesa Olga Tokarczuk, autora de 'Vagantes', e o dramaturgo austríaco Peter Handke são os vencedores do Prêmio Nobel de Literatura de 2018 e 2019

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Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

A polonesa Olga Tokarczuk é a ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura 2018 e o austríaco Peter Handke é o vencedor da premiação em 2019. O anúncio foi feito pela Academia Sueca nesta quinta-feira, 10.

Olga Tokarczuk e Peter Handke ganham o Prêmio Nobel de Literatura de 2018 e 2019 Foto: Maciek Nabrdalik/The New York Times e Dominic Ebenbichler/Reuters

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Olga Tokarczuk precisou encostar o carro que dirigia por uma estrada alemã para conseguir absorver a notícia: tinha acabado de ganhar o Prêmio Nobel de Literatura. Aos 57 anos, ela era a quarta colocada nas casas de apostas, e perdia para Anne Carson, Margaret Atwood e Maryse Condé na preferência dos apostadores, mas conquistou os membros da Academia Sueca num dos períodos mais conturbados da centenária instituição. 

“Estou extremamente feliz e orgulhosa porque meus romances, que se passam em pequenas vilas da Polônia, podem ser lidos como universais e podem ser importantes para pessoas ao redor do mundo”, ela disse à TVN24. E completou: “Acredito no romance como um profundo meio de comunicação, que transcende fronteiras, linguagens e culturas e que ensina a empatia.” Ela é autora de Vagantes, publicado em 2014 no Brasil e que será reeditado pela Todavia em 2020 possivelmente com o título Viagens. Antes, em novembro, a editora lança Sobre os Ossos dos Mortos (leia um trecho), o mais recente dela - ele mistura thriller e humor ao refletir sobre a condição humana e a natureza. 

Olga Tokarczuk é a 15.ª mulher a ser premiada pela Academia Sueca desde a criação do Nobel de Literatura, em 1901. Ela nasceu em 1962, estreou na literatura em 1993 e ganhou Booker International em 2018 com Flight. É um dos principais nomes da literatura polenesa e vem ganhando destaque em países de língua inglesa.

Olga Tokarczuk ganhou o Nobel de 2018 – vale lembrar que no ano passado, ainda mergulhada no escândalo de assédio sexual e de vazamentos envolvendo o marido de uma das integrantes, a Academia decidiu pular o ano e dar dois prêmios agora.

Mais conhecido o leitor brasileiro do que Olga, Peter Handke, que aos 76 ganhou o Prêmio Nobel 2019, teve livros lançados pela Brasiliense nos anos 1980 e estava presente nas livrarias com três títulos até o anúncio do Nobel. Segundo a Estação Liberdade, o estoque de A Perda da Imagem: Ou Através da Sierra de Gredos e de Don Juan (Narrado Por Ele Mesmo) esgotou assim que saíram os vencedores.

O editor Angel Bojadsen garantiu que já mandou imprimir uma nova tiragem e que tem mais um livro de Handke no prelo – Ensaio Sobre o Maníaco dos Cogumelos, uma obra que resume o que ele pensa sobre escrever, cinema e suas influências. A editora tem outros quatro contratos com o autor, que encerram essa série de ensaios: Ensaio Sobre o Cansaço, Ensaio Sobre o Jukebox, Ensaio Sobre o Dia Feliz e Ensaio Sobre a Calmaria.

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É autor, ainda, Peter Handke: Peças Faladas, publicado em 2015 pela Perspectiva, com quatro textos de meados dos anos 1960 (Predição, Insulto ao Público, Autoacusação e Gritos de Socorro). 

Na porta de casa, nos arredores de Paris, Handke se disse “atônito”. “Nunca pensei que me escolheriam. Foi muito valente da parte da Academia esta decisão”, completou. Handke foi duramente criticado por sua defesa dos sérvios na Guerra da Bósnia. Já Olga é criticada pela extrema-direita polonesa e recebeu até ameaça de morte. 

Peter Handke nasceu na Áustria em 1942. Para o Nobel, ele é "um dos mais influentes escritores europeus depois da Segunda Guerra Mundial". Entre os trabalhos destacados no anúncio está A Sorrow Beyond Dreams, romance de 1975 sobre o suicídio de sua mãe. No cinema, colaborou com Wim Wenders no roteiro de Asas do Desejo e de Os Belos Dias de Aranjuez.

A Academia Sueca destacou que Olga é foi escolhida por sua "imaginação narrativa que, com paixão enciclopédica, representa o cruzamento de fronteiras como uma forma de vida". Já Handke, "por um trabalho influente que, com engenhosidade linguística, explorou a periferia e a especificidade da experiência humana".

Assim como ocorreu em 2018, a Academia Sueca não premiou nenhum escritor em 7 ocasiões - nenhuma delas envolvendo crimes como os cometidos agora, mas, sim, duas guerras mundiais: 1914, 1918, 1935, 1940, 1941, 1942 e 1943. Em outras 7 ocasiões, ela adiou para o ano seguinte: 1915, 1919, 1925, 1926, 1927, 1936 e 1949.

​Livros de Olga Tokarczuk

Vagantes (Tinta Negra, 2014)

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Coleção de relatos, alguns fictícios e outros baseados em fatos reais, reunidos por uma única narradora jamais nomeada. Ela assume ser uma vagante ou errante movida por um interesse de conhecer tudo que é estragado, imperfeito ou quebrado.

Sobre os Ossos dos Mortos (Todavia, 2019)

Subversivo, macabro e discutindo temas como mundo natural e civilização, Sobre os Ossos dos Mortos parte de uma história de crime e investigação convencional para se converter numa espécie de suspense existencial. 

Livros de Peter Handke

Peter Handke: Peças Faladas (Perspectiva, 2015)

A antologia reúne os primeiros textos teatrais de Peter, escritos durante os anos de 1960. Nomeadas como Predição, Insulto ao público, Autoacusação e Gritos de socorro, as quatro peças são caracterizadas por uma contestação de princípios e valores da tradição ocidental. 

Perda da Imagem: Ou Através da Sierra de Gredos (Estação Liberdade, 2009)

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O livro conta a história de uma banqueira que viaja para a região espanhola da Mancha, até a Sierra de Gredos, em busca de um escritor contratado para escrever a sua biografia. Lá, ela se depara com uma cidade surreal em que os meios de comunicação dominam todos os âmbitos. O romance discute o poder da imaginação, a importância da imagem e a influência do ritmo capitalista na vida e nas relações pessoais.

Don Juan (narrado por ele mesmo) (Estação Liberdade, 2007)

A história da figura lendária de Don Juan é recontada na contemporaneidade por um cozinheiro solitário que tem hábito de leitura. Um belo dia, ele decide dar um basta nos livros, justamente no mesmo momento em que o próprio Don Juan chega no jardim do albergue onde ele vive, nas ruínas de um monastério de Port-Royal-des-Champs, na França.

Entenda por que o Prêmio Nobel de Literatura não foi concedido em 2018

Em novembro de 2017, 18 mulheres acusaram uma conhecida personalidade da cultura francesa, com quem a prestigiada instituição tinha vínculos estreitos, de violência e/ou assédio sexual. O episódio envolvia o dramaturgo Jean-Claude Arnault, uma grande figura cultural na Suécia e marido da poeta Katarina Frostenson, membro da Academia.

A Academia cortou relações com Arnault e determinou uma auditoria sobre suas relações com a instituição, mas desacordos internos nas medidas a tomar geraram confusão. 

Diante das circunstâncias, sete membros da Academia - de um total de 18 - renunciaram, incluindo a secretária permanente, Sara Danius. Eles eram designados de forma vitalícia e não tinham "autorização" para renunciar, mas poderiam optar por não participar das reuniões e decisões.

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O relatório da auditoria descartou que Arnault tenha influenciado em decisões sobre prêmios e confirmou que a confidencialidade sobre o ganhador do Nobel foi violada em várias ocasiões.

O escândalo provocou especulações nos meios de comunicação sobre o destino do prêmio liteário, que foi entregue em 2017 ao autor britânico-japonês Kazuo Ishiguro, e no ano anterior ao cantor e compositor americano Bob Dylan.

O rei da Suécia, Carlos XVI Gustavo, que é o principal responsável pela Academia fundada em 1786, concordou em modificar os estatutos para permitir que os membros renunciem e sejam substituídos, garantindo assim a sobrevivência da instituição.

Em maio, a edição 2018 do Prêmio Nobel de Literatura foi adiada para 2019.

Um novo capítulo da novela do Nobel foi acrescentado à história no dia 1.º de outubro. Aos 72 anos, Jean-Claude Arnault foi condenado a dois anos de prisão por estuprar duas vezes, em outubro e dezembro de 2011, uma jovem em um apartamento em Estocolmo.

Em janeiro de 2019, Katarina Frostenson deixou a Academia Sueca. A investigação sobre se ela vazou informações não foi levada adiante, e em comum acordo com a instituição ela formalizou sua saída.

O crítico literário André de Leones conversa com Ubiratan Brasil e Maria Fernanda Rodrigues, do Estado, sobre Olga Tokarczuk e Peter Handke, ganhadores do Nobel de Literatura; assista:

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