O audiobook na opinião de 5 escritores

Glauco Mattoso, Marina Colasanti, Ignácio de Loyola Brandão, Marcelino Freire e Nathália Arcuri falam sobre audiolivros e analisam se eles eles podem ajudar a atrair mais pessoas para a literatura

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Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

Nova aposta do mercado editorial internacional, que já está se tornando realidade e fazendo sucesso em países europeus e nos Estados Unidos, o audiolivro mobiliza editores brasileiros e players nacionais e internacionais na busca de alternativas num momento de crise - embora o investimento na produção ainda seja muito alto. É uma tentativa, também, de atrair mais pessoas para a leitura.

Conversamos com 5 escritores para saber a opinião deles sobre essa ‘nova-velha’ forma de leitura. 

Marina Colasanti, Ignácio de Loyola Brandão, Glauco Mattoso, Marcelino Freire e Nathalia Arcuri Foto: Estadão

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Ignácio de Loyola Brandão e Marina Colasantijá assistiram a outras tentativas de fazer o audiolivro vingar, com discos, fitas cassete e cds, e comentam o momento atual. Para ela, o formato pode funcionar com crianças, mas dificilmente ele levará os adultos que optam por livros em áudio para uma "literatura mais consistente". Já Ignácio quer dar seu audiolivro, que ele mesmo narra, para motoristas de táxi (a justificativa vem no formato de crônica).

Glauco Mattoso, que perdeu a visão por causa de um glaucoma, prefere que alguém leia para ele e acha que a poesia não é um gênero que se dê bem nos novos audiolivros. 

Marcelino Freire não costuma ouvir livros, mas disse que se todo mundo que precisa enfrentar o trânsito de São Paulo comprar um audiolivro, o sucesso está garantido.

Da nova geração, a best-seller Nathalia Arcuri, autora de Me Poupe!, sobre educação financeira, é entusiasta do formato.

O audiobook na opinião de 5 escritores

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Glauco Mattoso

Não compartilho das supostas "necessidades" dos demais cegos, não uso braile nem curto audiodescrição de filmes. Prefiro que alguém leia para mim ao vivo e interrompa a leitura sempre que eu queira comentar algo. Meu esposo assiste comigo aos filmes e vai descrevendo só quando peço, para não truncar as cenas. Quanto a livros e jornais, ele os lê em voz alta diariamente. Na verdade, acho péssima a dicção da maioria dos audiolivros, principalmente se for poesia, que exige ritmo na métrica e pausa nas rimas. Não gosto do ritmo declamatório que transforma versos em prosa pretensamente ‘fluente’. Quero marcação técnica das tônicas, especialmente nos decassílabos. Mas não desdenho do audiolivro quanto à utilidade para cegos em geral ou mesmo para normovisuais, pois muita gente prefere ouvir a ler e gosto não se discute. Meu computador falante converte texto puro (TXT ou DOC) em voz sintetizada, que posso comandar à vontade, fazendo voltar, repetir, soletrar, etc. Por isso prefiro trabalhar com texto pelo sistema dosvox.

​Marina Colasanti

A ideia do audiolivro me soa agradável. Afinal, foi através da oralidade que os humanos fizeram suas narrativas durante muitos séculos, e foi graças à oralidade que recuperamos parte delas. A oralidade pode ser mais imorredoura que os eventuais suportes. Eu mesma gosto de contar meu contos maravilhosos e já gravei dois cd com eles, para Luz da Cidade. Quanto a seu poder de atração para a leitura, sei que funciona magnificamente para a infância. Quanto aos adultos não leitores, desconfio. Creio que comprarão audiolivros não literários, para aproveitar o tempo do deslocamento até o trabalho, sem serem levados para os braços da leitura mais consistente.

​Ignácio de Loyola Brandão

Entrei no táxi, ouvi uma voz familiar. Sentei-me e descobri. Era a minha no rádio do carro. Dei meu endereço e o motorista dirigiu em silêncio, prestava atenção à narrativa. Segui a história com ela, apesar de conhecê-la. Uma das crônicas de meu livro Se For Para Chorar Que Seja de Alegria, meu primeiro audiobook. Fiquei quieto, deixando ele saborear. Uma sensação curiosa, ele sorria de leve, ou dava uma gargalhada, depois não tinha reação alguma. Uma hora, ficou triste. (A história continua aqui)

​Marcelino Freire

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Se todo mundo que enfrenta o trânsito de São Paulo comprar audiolivro, o sucesso de vendas está garantido. Acho uma ótima alternativa para engarrafamentos, para uso em aulas, para divulgação da língua portuguesa lá no estrangeiro. E gosto mais do audiolivro narrado pelo próprio autor ou autora. Mais tarde, valerá como documento histórico, creio. Não costumo ‘ouvir' livros... Gosto mais da palavra no papel. No entanto, sou curioso. E tenho até hoje um raro LP com leituras do Drummond. É uma leitura melancólica, única. Já gravei dois audiolivros, Angu de Sangue e o Contos Negreiros, e tenho vontade de gravar o romance Nossos Ossos. Eu sou muito guiado pela oralidade. Aí o áudio livro acaba virando música. Eu fico me sentindo um cantor mudo. Trabalhando os silêncios, as pausas. Gostei de gravar, mas não gosto de me ouvir. Tenho medo de mim. Espero que o leitor-ouvinte não reclame de alguma insônia depois de me ouvir lendo... eu pareço um fantasma.

Nathalia Arcuri

Estamos em um momento onde os podcasts estão com força total e o audiolivro tem todo o potencial para seguir o mesmo caminho. As pessoas podem ouvir seus livros preferidos enquanto dirigem, em casa fazendo alguma outra atividade ou antes de dormir e assim conseguem aproveitar melhor o tempo e como eu digo: tempo é dinheiro. O audiolivro inclui mais pessoas e isto é incrível. As pessoas com deficiência visual podem ter acesso a conteúdos de forma mais prática. E é um formato inclusivo de todas as maneiras porque também pode, mais facilmente, fazer parte da rotina corrida das pessoas.