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Joselia Aguiar quer reconectar a Biblioteca Mário de Andrade com a literatura

Jornalista, biógrafa de Jorge Amado e ex-curadora da Flip, Joselia Aguiar assume a direção da segunda maior biblioteca do País e quer ampliar a programação cultural e garantir a presença de todos os tipos de literatura na agenda

Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

Depois de dois anos à frente da curadoria da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) e quatro meses após o lançamento da biografia que escreveu de Jorge Amado, a jornalista Joselia Aguiar pensou que passaria um tempo tranquila, cuidando da tese de doutorado que ela entrega em outubro. E então veio o convite de Erika Palomino, nova diretora do Centro Cultural São Paulo, para ela ser curadora de literatura do espaço. Joselia aceitou de pronto e, duas semanas depois, ainda se ambientando, mas feliz com a nova função, recebeu o recado: Alê Yussef, secretário municipal de Cultura, queria falar com ela.

E veio o segundo convite. Desde o dia 25 de fevereiro, Joselia Aguiar é diretora da Biblioteca Mário de Andrade – na sucessão de Charles Cosac, que pediu demissão em 15 de janeiro, depois de dois anos no cargo. 

Joselia Aguiar que uma literatura mais plural na Biblioteca Mário de Andrade Foto: Gabriela Biló/Estadão

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“Vou fazer o possível para reconectar a Mário de Andrade com a literatura, a mais plural possível”, assim ela resume, em entrevista ao Estado, seus planos para a segunda maior biblioteca do País. Cosac e Luiz Armando Bagolin, diretor entre 2013 e 2016, tinham uma ligação mais próxima com as artes visuais – tanto que um dos espaços mais bonitos do prédio, a antiga sala de leitura com portas para a Praça Dom José Gaspar, tinha perdido sua vista com a instalação de paredes para a realização de exposições. Dar um uso mais amplo para o local foi uma das primeiras ideias de Yussef para a biblioteca, conta Joselia.

“O secretário quer fazer ali um sarauzódromo (o nome não é oficial, mas o apelido pode pegar) – um espaço para apresentações, leituras dramáticas, encontros lítero-musicais, conversas com escritores, saraus, slams e até exposições.”

As paredes já foram retiradas e uma limpeza está sendo feita enquanto a equipe começa a pensar nos eventos, mas Joselia já adianta que a inauguração será com um “sarau bastante diverso”. “A biblioteca sempre foi uma referência de alta literatura e agora vamos ter mais diversidade aqui – de saraus a slams.”

Outra ideia é a criação do Festival Mário de Andrade. Inspirado na festa de Sant Jordi, tradicional na Catalunha com banquinhas de livros espalhadas pelas ruas e eventos em celebração do livro, o novo festival vai durar três dias e tomar as ruas ao redor da Mário de Andrade, com a participação de editoras e uma vasta programação na biblioteca, possivelmente no Teatro Municipal, que fica ali perto, e em outros espaços. Mário de Andrade dá o nome ao festival, mas não orienta a programação.

Antes, em maio, ela participa da Virada Cultural. Em junho, promove o Esquenta Primavera, em parceria com a Liga Brasileira de Editoras (Libre), que organiza, no Rio, a Primavera Literária, uma feira de editoras independentes. Por falar em feiras, se depender da biblioteca, a Miolo(s), realizada pela Lote 42 também com casas e artistas independentes, já está com sua sexta edição garantida.

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Mas fora isso há o dia a dia, e Joselia quer “ampliar muito a quantidade de atividades” acontecendo lá. Em 2018, foram realizados 665 eventos próprios, e ela acha que dá para triplicar com o R$ 1,5 milhão previsto pelo orçamento para ações culturais. A programação de teatro e cinema deve ser mantida, mas seu foco será mesmo na literatura. “Cada diretor deixa a sua marca, vai abrindo a Mário de alguma maneira e a renovando. Vamos tentar encorajar curadores independentes a pensar projetos e nos propor”, diz.

Volta à agenda o antigo O Escritor na Biblioteca, que ganha um significativo complemento no título: A Escritora na Biblioteca. O acervo terá destaque em exposições bimestrais. A primeira será Pioneiras, com obras raras de 50 escritoras brasileiras. 

Sala da Biblioteca Mário de Andradeperdeu as paredes que obstruíam a vista e ali vai funcionar o 'sarauzódromo' Foto: Gabriela Biló/Estadão

A nova diretora quer incentivar, ainda, visitas de escolas, atreladas a alguma programação mais consistente, e doação de livros para a coleção de obras raras ou para a circulante. Uma compra de livros no valor de R$ 85.964,25, referente a 2017-2018, está em andamento. Vale lembrar que Charles Cosac, criador da Cosac Naify, não acostumado à burocracia pública, fez compras de livros, e de outras coisas, com o dinheiro dele para agilizar as coisas.

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O orçamento anual da Mário de Andrade é de R$ 11,9 milhões. Descontada a verba para programação, há R$ 10,4 milhões para sua manutenção e funcionamento. E essa outra vida da biblioteca, como Joselia chama, é totalmente nova para a jornalista. Calor, fogo, fungo, segurança... “A primeira coisa que pensei quando vim para cá é que a biblioteca vai fazer 95 anos em janeiro, e ela tem que existir para sempre. Alguns cuidados são primordiais. E a primeira coisa que perguntei foi como está a questão de incêndio, quais são os riscos e se ela está preparada. Todos me tranquilizaram. Depois, perguntei sobre fungos, um problema de tempos atrás. Mais bem-sucedido será aquele que conseguirá dar atenção igual para essas duas vidas da biblioteca.”

São 2.500 visitantes por dia, entre leitores, pesquisadores brasileiros e estrangeiros e pessoas que participam da programação cultural. Uma licitação será aberta para a instalação de um café. E a polêmica envolvendo o fechamento do espaço à noite – por um tempo entre Bagolin e Cosac ela foi 24 horas – não deve ser resolvida, se é que ela será, tão cedo. Um novo estudo será feito, afirma Joselia que chega à direção da Mário de Andrade depois de uma passagem festejada pela Flip. “Acho que a escolha do meu nome tem a ver com a ideia de que estou aberta a pensar uma atuação na programação em diálogo com vários setores da cultura”, comenta a jornalista que vai tentar dar visibilidade à “literatura nova, à literatura que está esquecida, que precisa ser redescoberta, que está na periferia e não foi descoberta ou que precisa de mais visibilidade”.

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