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Dramaturgo norte-americano Edward Albee morre aos 88 anos

Autor de 'Quem Tem Medo de Virginia Woolf?' era considerado um dos mais importantes escritores dos Estados Unidos

Foto do author Antonio Gonçalves Filho
Por Antonio Gonçalves Filho
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Em 1962, a Broadway foi sacudida pela estreia de uma peça amarga com muitos palavrões e um casal de professores neuróticos que infernizava a vida de outro casal, uma jovem grávida e seu marido. Quem Tem Medo de Virginia Woolf? acabou conquistando o prêmio Tony de melhor peça do ano, revelando um autor que passou quase desapercebido três anos com a peça Zoo Story. Hoje instalado no panteão onde figuram Arthur Miller, Eugene O’Neill e Tennesseee Williams, Edward Albee, morto nesta sexta, 16, aos 86 anos, em sua casa em Montauk, Nova York, de doença não revelada por seu assistente, será lembrado principalmente por Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, embora tenha assinado outras peças desestabilizadoras, entre elas Três Mulheres Altas (1990).

Todas as suas peças, dizia Albee, eram sobre pessoas que perderam o barco e se desiludiram ainda jovens, chegando à velhice com um insuportável gosto de fel na boca. É possível ver nessa autoavaliação ecos da infância conturbada do garoto adotado por uma família abastada, que deve ter se arrependido do gesto. Albee era gay e sentia-se hostilizado como um rinoceronte numa loja de cristais. Não sem razão, em Zoo Story, curiosamente encenada em Berlim antes de ser montada em Nova York, ele faz seu solitário protagonista vociferar contra a família, dizendo que nela sempre foi um eterno visitante – e que seu verdadeiro lar era a rua.

Albee, em Nova York, em 2008 Foto: AP Photo/Mary Altaffer, File

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No Brasil, Marco Nanini interpretou o jovem perturbado de Zoo Story, que tenta desesperadamente se aproximar de outro ser humano sem muito sucesso. Albee, por sentir o mesmo em relação à família, proprietária de salas teatrais de vaudeville, decidiu sair de casa e tentar a vida por conta própria, após ser expulso de todas as escolas por onde passou. No bairro boêmio de Greenwich Village, Nova York, onde desembarcou aos 13 anos, Albee teve vários empregos, enquanto tentava carreira como dramaturgo. 

Zoo Story, peça de um ato, levou pouco mais de duas semanas para ficar pronta. Dos dois personagens, só o do jovem solitário e desesperado Jerry convence. O outro, Peter um executivo de classe média, casado e pai de duas garotas, é apenas um rascunho. Albee reconheceria isso anos mais tarde. Em contrapartida, todos os personagens de Quem Tem Medo de Virginia Woolf? são bem delineados (Albee já tinha cinco peças encenadas). Em três atos, o casal formado por George e Martha evolui de um diabólico jogo emocional com seus dois convidados a um circo de horrores em que, afinal, a verdade sobre o filho fictício dos anfitriões é revelada. Patético é uma palavra que define bem o epílogo da peça, levada ao cinema em 1966 com Elizabeth Taylor e Richard Burton nos principais papéis sob a direção de Mike Nichols.

No Brasil, ela teve como intérpretes quatro grandes atores, três deles mortos: Cacilda Becker, Walmor Chagas e Lilian Lemmertz. O quarto era um jovem Fulvio Stefanini, recém-chegado aos palcos. Outras peças de Albee foram montadas no País, entre elas A Cabra ou Quem é Sylvia?, dirigida por Jô Soares em 2008 com o falecido José Wilker interpretando Martin, um arquiteto casado, pai de um filho, que se apaixona, claro, por uma cabra – que pode ser também um bode expiatório num nível mais metafórico, como o garoto dos cabelos verdes de Joseph Losey ou algum outro ser rejeitado pela sociedade.

Os excluídos sociais, os desajustados e solitários, ganham sempre a simpatia de Albee em suas peças, como o filho gay da senhora A da peça Três Mulheres Altas, uma mulher à beira do colapso, em seus 90 anos de vilania sobre o planeta, que ainda tem duas outras versões, a senhora B, cinquentona, e a senhora C, com vinte e tantos. A última peça escrita por Albee foi Me Myself and I (2007), uma tentativa falha de entrar na turma de Ionesco, elegendo uma mãe que dá o mesmo nome a dois filhos. Não foi exatamente um sucesso. Triste fim de um dramaturgo genial.

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