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Depois de polêmica com Crivella, Bienal do Rio não vai recolher HQ com personagem gay

A edição de 'HQ  Vingadores - A Cruzada das Crianças', que mostra beijo gay, esgotou na manhã desta sexta, na Bienal, segundo os organizadores; escritores e editores comentam

Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

A Bienal do Livro do Rio de Janeiro diz que é um direito do consumidor solicitar a troca de um produto que ele comprou, e não gostou, como prevê o Código de Defesa do Consumidor. Essa foi a resposta dada, em comunicado, depois que o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, mandou recolher a HQ  Vingadores - A Cruzada das Crianças, da Marvel Comics, com a justificativa de que é preciso proteger as crianças.

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Lançada em 2010, Vingadores - A Cruzada das Crianças, que não é destinada ao público infantil, mostra os personagens Wiccano e Hulkling como namorados, e mostra beijo entre os dois.

A Marvel não participa da Bienal do Livro do Rio com estande, mas seus livros estavam à venda no estande de outros expositores. Segundo a assessoria da Bienal do Livro do Rio, a edição de Vingadores - A Cruzada das Crianças esgotou na manhã desta sexta-feira, 6, em apenas 35 minutos. 

HQ 'Vingadores - A Cruzada das Crianças' é censurada na Bienal do Livro Foto: Marvel/Reprodução

"Pessoal, precisamos proteger as nossas crianças. Por isso, determinamos que os organizadores da Bienal recolhessem os livros com conteúdos impróprios para menores. Não é correto que elas tenham acesso precoce a assuntos que não estão de acordo com suas idades", disse Crivella em vídeo publicado em seu perfil do Twitter.

Para o prefeito, "livros assim" precisam estar em um plástico preto, lacrado, avisando o conteúdo.

"A Bienal Internacional do Livro Rio, consagrada como o maior evento literário do país, dá voz a todos os públicos, sem distinção, como uma democracia deve ser. Este é um festival plural, onde todos são bem-vindos e estão representados. Inclusive, no próximo fim de semana, a Bienal do Livro terá três painéis para debater a literatura Trans e LGBTQA+. A direção do festival entende que, caso um visitante adquira uma obra que não o agrade, ele tem todo o direito de solicitar a troca do produto, como prevê o Código de Defesa do Consumidor". disse a Bienal do Livro em comunicado.

'Vingadores - A Cruzada das Crianças' foi lançado em 2009 pela Marvel Foto: Marvel/Reprodução

Nesta quinta-feira, 5, os organizadores da Bienal receberam Paulo Amendola, coronel reformado e atual secretário da Ordem Pública do Rio, e cerca de 15 policiais da Guarda Municipal, que deixaram a notificação. Eles não chegaram a entrar no Riocentro, mas disseram que voltariam nesta sexta-feira, 6, para ver se a orientação foi cumprida. 

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Recentemente, também no Rio, o livro Meninos Sem Pátria, escrito por Luiz Puntel para a lendária Coleção Vaga-Lume e situado na ditadura militar, foi retirado de lista do Colégio Santo Agostinho. Em 2013, um juiz de Macaé, também no estado do Rio, mandou recolher exemplares de Cinquenta Tons de Cinza da Livraria Nobel.

Escritores e editores comentam polêmica envolvendo 'Vingadores - Cruzada das Crianças'

Cassius Medauar, editor especializado em HQ

"É muito triste para mim saber de uma declaração absurda como esta do prefeito do Rio. A HQ citada, Vingadores – A Cruzada das Crianças, saiu pela primeira vez no Brasil em 2012 e, depois, foi relançada em 2016. Não é voltada para crianças e sim para adolescentes. E não tem nada de pornográfico, só um beijo entre dois namorados. Estamos em um caminho perigoso de banalizar a censura no Brasil e, pior, censurando algo absolutamente comum como um beijo."

Santiago Nazarian, escritor e convidado da Bienal

"Esse é o resultado de décadas de desigualdade social profunda: sermos governados por gente sem o mínimo nível cultural, intelectual ou de civilidade. Um pastorzinho chinelo, que nunca devia ter saído de uma igreja de fundo de quintal, ainda não tem a mínima ideia da sociedade em que habita. Em plena Bienal do Livro, com tantas obras atuais e importantes retratando a realidade LGBT para o público infantojuvenil, é compreensível, no entanto, que ele implique justamente com uma HQ – é mais fácil para ele entender as figuras."

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