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Coluna semanal da jornalista Maria Fernanda Rodrigues com dicas de leitura

Opinião|De volta à casa de Saramago

'A Intuição da Ilha: Os Dias de José Saramago em Lanzarote', com crônicas de Pilar del Río, é um lançamento da Companhia das Letras para o ano do centenário do escritor

Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

Refaço uma viagem de 11 anos atrás, e é diferente. Chego a Lanzarote dessa vez na companhia de Pilar del Río e encontro a casa de Saramago cheia. O escritor português está lá, presente, vivo em cada gesto, nos encontros com amigos, na memória de sua companheira de tantos anos – em cada uma das histórias que ela conta em A Intuição da Ilha: Os Dias de José Saramago em Lanzarote

A casa em que Saramago viveu entre os anos 1990 e a morteé, hoje, um museu Foto: Maria Fernanda Rodrigues/Estadão

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Foi nesse livro que passei a última semana, e com ele voltei àquela pequena ilha vulcânica de ventos fortes nas Canárias, que conheci por um desses acasos do destino 10 meses depois da morte de Saramago – e um mês depois que sua casa, a casa que é cenário desta obra e que foi abrigo para o escritor, virou um museu.

A Intuição da Ilha traz mais de 70 breves crônicas – flashes dos últimos 18 anos de vida do escritor, o único Nobel de Literatura de língua portuguesa, que morreu ali, em seu quarto, no dia 18 de junho de 2010. 

“O dia não nasceu para que a morte nele se instalasse, mas a morte chegou. Fê-lo sem sobressaltar nem provocar dor, com a estranha serenidade dos momentos que se seguem uns aos outros. Foi assim: um momento antes estava, depois já não, apenas ficava no ambiente um sentimento de gratidão”, Pilar escreve. Começo pela morte, mas este é um livro sobre a vida – sobre escolhas que definem percursos e histórias.

Saramago tinha cunhados em Lanzarote, mas não conhecia bem a ilha. Em 1992, um ato de censura do governo de Cavaco Silva, que vetou O Evangelho Segundo Jesus Cristo de uma lista feita por três instituições culturais com obras que representariam a literatura portuguesa na Europa, mexeu – com razão – com o escritor, que lançou a pergunta à mulher: “E se fôssemos morar em Lanzarote?” 

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Em nove meses, a casa estava pronta e a mudança descia o Atlântico. Com esse movimento, Saramago se afastou, sim, de seu país por causa do governo e por desgosto. Mas o que começava a operar ali era algo muito mais profundo e íntimo. Afastando-se do barulho do mundo, ele voltava-se ao essencial. 

Dos cachorros de Saramago, Camões foi o único que sobreviveu ao dono e, como Pilar conta em um dos textos, chorou a noite toda quando ele morreu Foto: Maria Fernanda Rodrigues/Estadão

No livro, acompanhamos Saramago à padaria – era função dele comprar o pão. Conhecemos os bastidores de obras como Ensaio Sobre a Cegueira, a primeira que ele escreveu ali, e curiosidades sobre as visitas que recebia – seu ‘isolamento’ sempre foi povoado de amigos como Carlos Fuentes, Ernesto Sabato, Maria Kodama e Sebastião Salgado, entre outros. Pilar nos conta sobre a saúde de Saramago, nos leva com ele a outros lugares – para sempre retornar à casa, com seus livros e seus cães, e à ilha onde Saramago pôde reencontrar sua aldeia e rever as estrelas de sua infância.

A Intuição da Ilha, sobre os anos em que Saramago viveu em Lanzarote, é um lançamento da Companhia das Letras Foto: Companhia das Letras

A Intuição da Ilha: Os Dias de José Saramago em Lanzarote

Autora: Pilar del Río Editora: Companhia das Letras (304 págs.; R$ 99,90; R$ 44,90 o e-book)

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