A pouco conhecida história de Tennessee Williams ambientada na Itália pós-guerra

Conto confirma sua antiga paixão pela Itália e revela preocupações sobre como os italianos se sentiam em relação aos americanos

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Por Hillel Italie
Atualização:

NOVA YORK - Para Tennessee Williams, Roma foi um caso de amor de longa data, “a capital do meu coração” com seus céus de um "azul inoxidável" e domos de catedrais "banhados em luz dourada"

Tennessee Williams em foto de 1940 Foto: Dan Grossi/AP

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Às vezes, ele se preocupava sobre como os romanos se sentiam em contrapartida. Homenageado mundialmente como dramaturgo, Williams também escreveu dezenas de contos. Uma narrativa pouco conhecida, The Summer Woman, ambientada na Itália, foi publicada essa semana na edição de outono da revista literária The Strand Magazine.

The Summer Woman foi escrito no começo da década de 1950 e conta a história de um acadêmico americano, “o notadamente jovem chefe do departamento de inglês em uma importante universidade do sul”, que visita Roma com frequência e espera encontrar-se com uma amante italiana que ele conheceu “nas ruas” e ajudou financeiramente na esperança de mantê-la “fora das ruas”.

“Ali na Europa, sobretudo na Itália, ele viveu sua outra vida, a existência pela qual seu coração ansiava: boêmia, sensual, nem um pouco acadêmica, nem um pouco reservada”, Williams escreve. “Ele não tinha encontrado essa outra vida através de nenhum grandioso e poderoso gênio. Ela lhe foi entregue por outra pessoa, uma garota romana chamada Rosa. Ela o tomou por seus dedos frios e nervosos e o conduziu por aquele país e rapidamente fez com que ali se sentisse em casa”.

Um nativo do Mississipi que ambientou Um Bonde Chamado Desejo e outras peças no sul dos Estados Unidos, Williams identificou-se fortemente com a Itália, vendo-a como uma fuga da condenação - e de seu inabalável “sentimento de culpa” - que enfrentou nos EUA enquanto um homem gay. Ele viveu na Itália por muitos anos após a Segunda Guerra Mundial e sempre escreveu sobre as paixões e confrontos entre americanos e italianos, seja na peça The Rose Tattoo, no romance The Roman Spring of Mrs. Stone ou no conto Man Bring This Up Road.

Robert Bray, diretor fundador da Tennessee Williams Annual Review, observou que a ligação de Williams com Roma tornou-se muito pessoal: Seu companheiro Frank Merlo era de ascendência siciliana, e ele estabeleceu uma amizade próxima com a atriz italiana Anna Magnani, que estrelou a adaptação de The Rose Tattoo para o cinema.

Bray disse que Williams estava “encantado com a sexualidade que os jovens italianos exalavam e com uma facilidade para os relacionamentos entre homens que ele não encontrava em casa, na rigidez maior dos Estados Unidos”.

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Mas The Summer Woman é um instantâneo de um país ainda se recuperando da Guerra, e cuja recepção aos americanos não era mais a mesma. O protagonista lembra-se de ter ouvido uma vez saudações amigáveis de "Ei, Joe”, mas agora é saudado com gritos de “coco”, um insulto referente à arma biológica - cocobacilos - que os americanos supostamente teriam usado em sua guerra contra a Coreia do Norte. Ele imagina o que teria acontecido com as pessoas que pareciam “mais doces” que em outros países.

“Acho que essa é uma dimensão de Williams que a maioria dos leitores não conhece muito”, diz o editor-chefe da Strand, Andrew Gulli. “Pensamos em Tennessee Williams como o cronista da grandeza desvanecida, da angústia e da fraqueza, mas suas viagens e interações mostram que ele era um observador muito versátil de como a política estrangeira americana era vista pelo mundo”.

No rascunho do manuscrito de The Summer Woman, Williams tinha colocado outro título: The Marshal Plan, uma referência ao massivo programa de assistência que os EUA criaram para os países europeus. Em uma carta de 1948 para o crítico de teatro do New York Times, Brooks Atkinson, Williams preocupava-se com as terríveis condições de vida dos italianos e expressou preocupações que poderiam facilmente se aplicar ao Afeganistão contemporâneo.

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“Realmente parece que setenta por cento da população italiana é formada por pedintes e prostitutas, famílias estão vivendo em partes sem teto de prédios em cidades bombardeadas como Nápoles, ele escreveu para Atkinson.

“Eu sinto que se tivéssemos feito esforços reais para aliviar a tensão europeia os comunistas não teriam apelo. Desse jeito, as pessoas em circunstâncias realmente péssimas, desnorteadas com os governos fantoches e vacilantes chefiados por figuras fracas e sutilmente oportunistas, sem raízes em nenhum partido, política ou filosofia definida, são uma presa natural e fácil para extremistas"./TRADUÇÃO DE LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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