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Zé Celso recria "Os Sertões" no Oficina

Estréia no sábado para o público a concepção do encenador para A Terra, a primeira parte do clássico de Euclides da Cunha, escrito há cem anos

Por Agencia Estado
Atualização:

Depois da sessão especial apresentada na segunda-feira, no centenário de lançamento do livro Os Sertões, de Euclides da Cunha, estréia sábado para o público, no Teatro Oficina, a concepção de José Celso Martinez Corrêa para A Terra, a primeira parte do relato do autor sobre o massacre de Canudos. Em cena, 40 atores recriam cenicamente - por meio de imagens e diálogos - a singular geografia do sertão, assim como vegetação e clima, antecipando no martírio da terra, assolada pela seca, o anunciado massacre. Não é fácil teatralizar A Terra. A primeira parte de Os Sertões não é fácil nem mesmo de ler. Nessa parte do livro, Euclides procura entender o ecossistema do sertão. Há quem fale em vôo aéreo para explicar a forma como Euclides descreve rios, montanhas, rochas, vales, vegetação. A arquitetura do Oficina - um comprido corredor cercado por três andares de arquibancadas - propicia essa vista aérea sobre o sertão recriado no palco. Num dos momentos do espetáculo, Euclides dialoga com Hegel. Não se trata de uma invenção do encenador. No livro, o autor cita Hegel, que não previu em seus estudos uma terra como o sertão, um deserto capaz de florescer após uma chuva - florescimento que resulta numa das bonitas cenas do espetáculo. A interferência de Zé Celso limita-se a transformar o texto original em diálogo. "Euclides se apaixonou também por aquela terra, que não é totalmente deserta nem fértil, um terra toda contraditória, extremada, como o ser humano", diz Zé Celso. "A terra do sertão tem uma fertilidade subterrânea. Atualmente já existem condições técnicas para que as pessoas não morram na seca." Euclides viu o massacre de Canudos como um crime e lançou mão de todos os conhecimentos a seu alcance para denunciar esse crime." Um crime que começa pelo martírio da Terra, apunhalada na encenação do Oficina por antigos bandeirantes e bem contemporâneos especuladores imobiliários. As mais variadas vegetações ganham diferentes formas no corpo dos atores à medida que são nomeadas pelo coro, sempre fiel ao texto original. Num dado momento, fala-se sobre a necessidade das raízes desceram fundo na terra, para evitar o sol inclemente. Mas, contraditoriamente, o solo seco resiste às raízes, que acabam por se entrelaçar formando um emaranhado na superfície da terra e assim retém a umidade, única forma de sobrevivência. Simultaneamente à fala do coro, a imagem do que é dito vai sendo criada por um coletivo de corpos/plantas que tentam penetrar no fosso localizado no palco, mas são rejeitados e se "emaranham" pelo palco. "Aprendi com Euclides que essa terra tão humana do sertão tem força nela mesma para superar todas as torpezas. Assim como o teatro. Assim como o homem." Zé Celso já tem preparada boa parte de O Homem e A Luta, o restante do livro, que devem estrear em março e agosto. "Vamos mostrar A Terra sábado e domingo e continuar ensaiando O Homem e A Luta durante a semana." Em A Terra, há uma cena muito forte, na qual Euclides encontra um soldado morto há três meses cujo corpo está intacto, mumificara, tal a secura do ar. Essa imagem é retomada em A Luta, de forma ainda mais impactante. "Numa das batalhas, o Exército manda os feridos embora, pois não tem como cuidar deles. É uma coisa trágica, eles partem e vão morrendo pelo caminho, uma multidão de cadáveres mumificados. E Euclides chama de turbilhão da vida uma cena em que o vento dá vida aos cadáveres que dançam pelos ares. O Marcelo Pelegrini está compondo uma valsa para esse momento em que o vento dá vida ao soldado morto, vai ser uma cena muito bonita", adianta o diretor. Os Sertões. Direção José Celso Martinez Corrêa. Duração 3h30. Sábado e domingo às 18 horas. R$ 30,00. Teatro Oficina. Rua Jaceguai, 520, tel. (11) 3106-2818. Até 22/12.

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