Weffort analisa seus 7 anos à frente do MinC

O mais duradouro ministro da Cultura que o País já teve diz que não faz distinção entre vanguarda e tradição, revela que já foi patrulhado e afasta candidatura

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Por Agencia Estado
Atualização:

Nascido em Quatá, no interior de São Paulo, o ministro da Cultura, Francisco Correa Weffort, está desde 1995 à frente da pasta. Entra para a história, até agora, como o mais longevo dos ministros da Cultura do País. Aos 64 anos, ele experimenta o último ano à frente da pasta num clima de intensa cobrança. Ao fim da "Era Weffort", produtores e agentes culturais querem saber o que fazer ante o impasse que enfrentam as leis de incentivo e também cobram o desatrelamento da cultura brasileira da dependência da iniciativa privada, que acaba ditando tendências. Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e professor-titular (aposentado) do Departamento de Ciência Política da USP (onde também foi Chefe do Departamento), o ministro disse em entrevista que não será candidato a cargos eletivos no ano que vem. "Sou candidato a voltar ao meu trabalho de sempre, como professor e pesquisador." Seu ministério é um dos cinco envolvidos no Programa de Modernização do Poder Executivo Federal (ao lado dos da Justiça, Educação, Meio Ambiente e Defesa e algumas secretarias). Agência Estado - Após sete anos à frente do Ministério da Cultura, o sr. acredita que deixa uma estrutura sólida para seu sucessor no ano que vem? A Secretaria do Audiovisual é a estrutura ideal para gerir o cinema nacional, a seu ver? Weffort - A consolidação da Lei Rouanet e da Lei do Cinema ocorreu no meu período à frente do Ministério da Cultura. Consolidamos, também, a estrutura administrativa, hoje com quatro Secretarias finalísticas (do Patrimônio, Museus e Artes Plásticas; da Música e Artes Cênicas, do Audiovisual - Cinema - e, finalmente, do Livro e Leitura) que trabalham em harmonia com as instituições vinculadas ao ministério: Fundação Biblioteca Nacional, Iphan, Funarte, Fundação Cultural Palmares e Fundação Casa de Rui Barbosa. Embora a Secretaria do Cinema tenha sido muito eficiente, o que explica que tenhamos crescido tanto nesta área, transformar o cinema em indústria exigirá a criação de um órgão próprio, ligado à política de desenvolvimento e à indústria. A Secretaria do Audiovisual do ministério deverá ficar com os aspectos especificamente culturais da atividade (formação, documentários, curtas-metragens, etc.). O Ministério da Cultura investiu sobremaneira na retomada do cinema nacional. São mais de R$ 300 milhões investidos desde 1995 por meio das leis de incentivo. O sr., quando iniciou esse processo, falava em erguer as bases de uma indústria cinematográfica no País. Acha que essa base já está surgindo? Weffort - Produzimos em média 25 a 30 filmes por ano, desde 1995. Esta é a base que construimos com apoio na Lei do Cinema. Para crescermos além disso, precisamos de uma política de Estado que trate o cinema como atividade industrial. Uma atividade que continuará necessitando de estímulos de Estado, mas que deverá ter objetivos econômicos mais definidos do que se pode fazer apenas com as leis culturais. O governo fixou uma nova cota de tela do cinema nacional nas salas de cinema que oscila hoje entre 11 e 217 filmes por ano. Ainda assim, dizem que a lei não é o principal problema, mas a fiscalização. A extinção do Concine tornou esse problema praticamente insolúvel. O que o governo pensa em fazer a respeito disso? O Gedic encaminhou uma série de metas à Presidência da República. Entre elas, destaca-se a ocupação, até 2005, de 40% do mercado cinematográfico nacional, 30% do mercado de vídeo e 15% do mercado de DVD; ampliação do número de salas de exibição (para 4 mil salas em 2008) e a criação de um fundo setorial de investimento. Para que essas metas sejam atingidas na sua gestão, não é necessário aprovar medidas importantes no Congresso Nacional ainda este ano? Weffort - Suas perguntas mencionam projetos que estão sendo analisados no Gedic. Também creio que devemos caminhar mais rápido neste assunto. Mas creio, mais ainda, em que é necessário ouvir os segmentos da área num debate público que, evidentemente, deverá passar pelo Congresso, para que as novas iniciativas tenham suficiente base de apoio. A decisão do ministério de criar a TV Cultura e Arte, que almeja ter um público de 8 milhões de espectadores, foi criticada por produtores culturais. Temem que esse canal acabe se prestando à função de house organ do governo, promovendo e fazendo propaganda em vez de estimular a arte. Temem também que o ministério esteja enveredando por uma área de competição comercial, coisa que não é o seu papel. Como o sr. vê essa questão? Weffort - A TV Cultura e Arte não é comercial nem house organ do governo. É um serviço do Estado brasileiro à difusão da cultura no País. Há áreas que não alcançaram visibilidade durante esses últimos sete anos, áreas de interesse mais localizado, como a música erudita, as orquestras e a produção dita de vanguarda. O que foi feito nesses setores pelo ministério? Weffort - O ministério tem programas de apoio à música erudita. Além disso, desde 1997, foi introduzido na lei um dispositivo que assegura dedução tributária integral para empresas que apóiem espetáculos de música erudita. Se uma produção é de vanguarda ou não, isso depende da iniciativa dos artistas, dos criadores. Apoiamos iniciativas culturais, sem a preocupação de defini-las previamente como tradicionais ou vanguardistas. Uma das principais críticas que se faz à sua gestão no Ministério da Cultura é que o sr. empenhou-se principalmente em ajudar gestões ligadas ao PSDB, que é o partido do governo. Em São Paulo, por exemplo, o MinC foi parceiro de obras vistosas na área da cultura, como a Sala São Paulo, a Pinacoteca do Estado e outras. O sr. refuta essa acusação de preferência política? O que se fez no Rio, por exemplo? Weffort - Essa crítica não tem nenhum fundamento. As portas do ministério estão abertas a qualquer um. A qualquer partido ou a qualquer região do País. Temos projetos, grandes e pequenos, em todos os Estados do Brasil. Ao contrário do que a sua pergunta parece sugerir, não é São Paulo o Estado que mais apresenta demandas ao ministério, mas o Rio, onde, aliás, temos o maior contingente do Iphan, boa parte dos bens tombados do País e alguns dos nossos maiores museus públicos. A exceção, em São Paulo, não é a Sala São Paulo nem a Pinacoteca, aliás magníficas, mas a Mostra do Redescobrimento, maior investimento cultural do período e que se tornou itinerante, viajando para vários Estados brasileiros e diversos países. Recentemente, o ator Paulo Betti foi acusado de ter se deixado seduzir pelo governo de Fernando Henrique Cardoso - principalmente por benesses pessoais que poderia advir do governo. Como é um rosto ligado sempre ao PT, isso causou espanto. Houve também o caso de Gal Costa, que se empenhou em defender o senador Antonio Carlos Magalhães. Para o sr., houve patrulha ideológica, como eles dizem? O sr. acha possível desvincular cultura e política no Ministério da Cultura? Weffort - A maioria da área cultural consegue desvincular cultura e política partidária, embora não pretenda desvincular cultura e política em sentido amplo. Talvez isto nem seja possível. Os patrulheiros, sim, existem, aliás não apenas na esquerda, também na direita. Eu mesmo já fui patrulhado por apoiar centros de candomblé e por dar mão firme à resistência dos movimentos contra o racismo. A melhor coisa a fazer com as patrulhas é não lhes dar nenhuma importância. O sr. pensa em desincompatibilizar-se no ano que vem para disputar eleições? É pré-candidado ao senado ou a uma cadeira de deputado? Weffort - Permanecerei no ministério enquanto o Presidente assim o desejar. Sou candidato a voltar ao meu trabalho de sempre, como professor e pesquisador. Qual é a lição que o cientista social leva de suas incursões pela área artística? Weffort - No ministério, aprendi que o Brasil é maior do que pensava, muito mais rico e diversificado culturalmente do que eu conseguia imaginar em meus estudos de sociologia e política.

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