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"Vovô", a nova maravilha da Cia. Truks

Em cartaz no Sesc Belenzinho, espetáculo reafirma o lugar de destaque da trupe do autor e diretor Henrique Sitchin no cenário do teatro infantil de SP

Por Agencia Estado
Atualização:

Cidade Azul, O Senhor dos Sonhos, Contar até 10. Desde 1990, um espetáculo após outro, a Cia. Truks de Animação, da Cooperativa Paulista de Teatro, vem colecionando prêmios e conquistando o público no cenário minguado do teatro infantil de qualidade em São Paulo. Vovô, em cartaz há menos de um mês no Sesc Belenzinho, é a mais recente maravilha produzida pela trupe do autor e diretor Henrique Sitchin. Centrada na vida de um imigrante no Brasil, em meados do século passado, a peça privilegia temas fundamentais para a formação psicológica de uma criança, como a força inevitável da passagem do tempo e a necessidade vital de se transmitir histórias de geração a geração. A inteligente estrutura do espetáculo, aliás, segue, ela própria, a linha de uma história oral bem contada, com direito até a uma introdução. Uma galinha e uma vaca surgem em cena para familiarizar a garotada com a estética dos bonecos que se seguirá durante todo o espetáculo. E, logo de cara, entra o humor do primeiro bordão: "Você não é o meu avô", diz, repetidas vezes, a narradora. O texto, diga-se, é espertamente construído com base na repetição de algumas frases, forma astuta de enredar o público, mas que pode resultar inútil se não for um recurso usado com sutileza. Aqui não é o caso. Os bordões funcionam com graça e na medida certa. O personagem do vovô, por exemplo, interrompe mais de uma vez a narradora para dizer: "Esse pedaço da história, eu é que quero contar." Uma das cenas mais singelas é a do namoro do avô com a avó no alto de uma árvore. A mesma cena poderia ter sido feita de várias formas, mas a escolhida é inusitada, anticonvencional, sem abandonar a poesia própria de um namorico de antigamente. O piano insistente da trilha sonora talvez seja meloso demais e incomode os mais puristas, aqueles que acham que a música não deve forçar a emoção das cenas (como acontece muito nos filmes da Disney, por exemplo). Mas, em Vovô, tudo é tão azeitado que esse detalhe da trilha sonora não chega a atrapalhar. Há um achado de mestre, quase no final: o recurso de voltar ao que já foi contado pelo avô e pela narradora e repassar tudo em forma de desenhos, num pano comprido, que desliza pelo cenário. Cada cena do espetáculo é desenhada e revivida sem palavras, sem bonecos. De novo, a inteligência da montagem dá o tom, pois trata-se de uma referência crucial ao fato de que toda criança adora que se conte e se reconte várias vezes a mesma história. Fazer essa espécie de resumo das cenas, essa repetição pedagógica, acontecer com outra linguagem (a do desenho) - e uma linguagem complementar à que foi apresentada (a da animação) - significa mostrar ao público mirim as variações possíveis dentro das linguagens artísticas. Isso é de uma riqueza sem valor estimado para a formação de público. É ser "instrutivo" no palco sem a menor sombra de chatice ou de catequese. Nota dez para a Cia. Truks e essa sua preocupação constante em não fazer concessões às facilidades do teatro "educativo" tatibitate. E o final, bem, o final é muito bem arquitetado. É ver para crer. A companhia poderia ter sido explícita e, já que o tema da peça é a passagem do tempo, poderia mostrar a morte do avô e o sofrimento dos netos, com lágrimas, mais lágrimas, etc. etc. A platéia se emocionaria e seria cumprida, com certeza bem, a importante tarefa de se falar desse tema difícil de abordar em espetáculos infantis. Mas, não. A Truks mais uma vez não quis ser fácil. Emociona, só que de forma diferente. A morte está ali, sim, naquele final surpreendente, mas em forma de vida, porque, afinal, não existe uma sem a outra - e as crianças, assim como muitos adultos bem crescidinhos, precisam lidar com isso para virarem seres humanos completos. Vá aprender sobre vida e morte com Vovô, da Cia. Truks. Não vai estragar a surpresa final revelar que uma das últimas frases do espetáculo é: "Espero que todos vocês sempre tenham boas histórias para contar!" Vale a pena repetir a frase aqui, para desejar que a Cia. Truks também sempre tenha boas histórias para contar no teatro. Vovô é mais uma prova de que ganharemos todos se desejarmos vida longa para essa companhia. Vovô. Sábado e domingo, às 16 horas. R$ 2,00, R$ 2,50 (estudantes) e R$ 5,00. Teatro do Sesc Belenzinho. Avenida Álvaro Ramos, 915, zona leste de São Paulo, tel. 6605-8143. Até 29/9.

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