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Violões, garra e maturidade

Quaternaglia comemora 18 anos com disco primoroso que repassa sua carreira bem-sucedida

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Por Redação
Atualização:

Estampas. Os integrantes do quarteto, que chega à maioridade: álbum recupera obras e compositores que marcaram atividade do grupo ao longo dos anos.

 

Crítica: João Marcos Coelho

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****ÓTIMO

 

O melhor quarteto de violões brasileiro comemora sua maioridade com um disco deslumbrante. Aos 18 anos de atividades, o Quaternaglia conquistou não só o País como a cena internacional. Excursiona regularmente para os EUA. Foi lá, por exemplo, que gravou em fevereiro de 2007 o CD Estampas, que agora é lançado no Brasil em produção independente, com distribuição da Tratore Discos.

Primorosamente gravado por David Hirschy no Yavapal College de Prescott, Arizona, teve produção, mixagem e masterização realizadas no Miramontes Studios pelo técnico norte-americano, indicado por Sérgio Abreu. Estampas é uma espécie de síntese da trajetória do grupo. E, simbolicamente, une as motivações que provocaram o nascimento do quarteto: o citado violonista Sérgio Abreu, hoje emérito lutiê de 61 anos, de um lado; e, de outro, o compositor cubano Leo Brouwer, de 71 anos. O grupo sempre tocou e gravou em instrumentos feitos por Abreu (três violões de seis cordas e um de sete); e teve em Brouwer seu compositor preferencial.

Os integrantes do Quaternaglia revisitam a maravilhosa transcrição de Abreu para as Bachianas Brasileiras nº 1 de Heitor Villa-Lobos (quinze anos atrás, esta foi a primeira gravação mundial da transcrição, que o quarteto lançou em seu primeiro CD).

 

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Áudio: Ouça trecho da faixa Uarekena

 

Outro Sérgio, também violonista, mas que leva o sobrenome Assad, também muito conhecido, assina a última faixa - um dos momentos culminantes do CD. Uarekena ou Guarakena, como explica Molina no texto do folheto do CD, "é uma língua indígena falada por pouquíssimos habitantes que vivem na fronteira do Brasil com a Venezuela". A peça é de 1997, e foi dedicada ao Los Angeles Guitar Quartet. O Quaternaglia já a havia registrado em disco dez anos atrás - mas a segunda leitura é ainda mais entusiasmante que a primeira, porque une garra e maturidade.

João Luiz, integrante do Quaternaglia, assina o excelente arranjo das três danças argentinas de Alberto Ginastera, saborosas miniaturas para piano solo escritas em 1937 - foi Egberto Gismonti quem sugeriu ao grupo a transcrição para quatro violões.

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O núcleo central, porém, é ocupado pela série de oito Estampas, que dá título ao CD, escritas originalmente para quarteto de violões pelo compositor espanhol Federico Moreno Torroba (1891-1982) no final de sua vida, em 1976. Ele as dedicou ao quarteto Los Romeros. O Quaternaglia as interpreta com imensa autoridade. Leva-nos a partilhar as delícias do mundo popular espanhol, desde a inicial "Bailando um Fandango Charro" até "Fiesta en el Pueblo", passando pelo delicado "Amanecer" e a festiva "La Boda". Torroba verte o dia a dia feito de trabalho, festas e ritos comunitários com uma facilidade difícil de se obter sem esbarrar na banalidade.

Neste CD, fala, ou melhor, soa mais alto, porém, a extraordinária música de Brouwer, um dos raros compositores contemporâneos a unir elevadas voltagens criativas com música que não afugente ouvidos leigos. As Tres Danzas Concertantes foram compostas pelo cubano em 1958, às vésperas da Revolução de Fidel Castro, que sacudiria a ilha no início de 1959. Curiosamente, Brouwer é até hoje usado como símbolo do regime - mas sua música passou incólume, neste 61 anos, de qualquer pressão. Respira uma liberdade inesperada. E muito bem-vinda. Não entendi bem o que quer dizer versão "preparada", expressão que Molina usa no texto para qualificar o trabalho de transcrição (ou arranjo?) para quarteto de violões por outro integrante do Quaternaglia, Fábio Ramazzina. Mas isso pouco importa, já que é belíssimo o trabalho de Ramazzina.

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