PUBLICIDADE

USP lança sua Bienal de Teatro

Peças que compõem a programação ousam na forma e no conteúdo

Por Maria Eugenia de Menezes
Atualização:

A experiência de um sequestro. E, em seguida, do cativeiro dentro de uma prisão do regime de Bashar Al-Assad, na Síria. Com essa proposta, o espetáculo 66 Minutes in Damascus abre a 1ª Bienal Internacional de Teatro da USP. Mas a peça do diretor libanês Lucien Bourjeily é apenas uma das muitas criações de aspecto radical dessa programação, que começa no dia 31. “Buscamos trazer à cena experiências de fronteira, criações não convencionais, e muitas delas vindas de países que nem sempre costumam chegar ao Brasil”, comenta Deise Abreu Pacheco, curadora do evento ao lado de René Piazentin e Maria Tendlau.

PUBLICIDADE

Com a intenção de reintroduzir a universidade no panorama das artes cênicas da cidade, a Bienal buscou inspiração em festivais como o Lift, de Londres. Aqui, como lá, o foco está em propor experiências teatrais que escapem dos cânones, seja na forma, seja no conteúdo. “Quase todos os grupos são jovens. Não estamos trazendo mestres como Bob Wilson ou Peter Brook”, diz Deise. “O que fazemos é abrir espaço para carreiras que já tenham uma solidez, mas que não sejam o ‘mainstream’. Para obras que chamaram atenção no exterior, mas que tiveram recepção crítica polêmica.”

Em boa parte das escolhas – são cinco títulos internacionais e quatro nacionais –, o vínculo com a realidade aparece intensamente. “O aspecto documental é uma constante no teatro hoje, e isso está colocado aqui”, observa Deise. The Island foi escrita pelos sul-africanos Athol Fugard, John Kani e Winston Ntshona para tratar do apartheid. Na montagem a ser vista durante a Bienal – criada pelo Freedom Theatre, que lida com refugiados da Cisjordânia –, o drama ganhou novas tintas e novo sentido. Passou a refletir, mesmo que indiretamente, sobre as dificuldades vivenciadas hoje pelos palestinos.

Além de espetáculos, a grade prevê uma série de atividades paralelas. O Freedom Theatre irá apresentar um documentário do diretor Juliano Mer Khamis – assassinado na frente do campo de refugiados onde está sediado o grupo. Também trará atores retratados no filme para debater com o público.

Por caminho igualmente intrincado, segue a encenação de Damned Be the Traitor of his Homeland. Assinada pelo diretor croata Oliver Frljic – artista em evidência hoje na Europa – a obra é uma reflexão sobre o sofrimento provocado pela guerra. “E traz o texto em constante fricção com a forma dramática”, aponta a curadora. A estrutura da peça é fornecida por episódios do desmembramento da ex-Iugoslávia. Não por acaso, o título do espetáculo é justamente o último verso do hino do país extinto: “maldito seja o traidor da sua pátria”, em tradução literal.

Cenários grandiosos não estão no horizonte dessas produções, que focam outros aspectos da criação cênica. Duas delas, porém, fogem à essa regra, preocupando-se em envolver o público também por meio da ambientação. Macbeth - Leila and Ben: a Bloody History é uma delas. Vindo da Tunísia, o espetáculo deverá ser apresentado no Sesc Consolação, fora do espaço do Teatro da USP, que não tinha as condições técnicas para receber a montagem. Outra criação que demandou cuidados especiais da cenografia é a já referida 66 Minutes in Damascus. Depoimentos de jornalistas estrangeiros e de ativistas presos pelo regime de Assad foram usados para recompor com fidelidade os centro sírios de detenção. O público, restrito a apenas oito pessoas por sessão, toma o lugar de um grupo de turistas que acaba capturado pelo serviço secreto do país e é levado a um interrogatório.

Os espetáculos nacionais foram selecionados segundo um critério diferente daquele usado para escolha das obras estrangeiras. O vínculo com as discussões políticas contemporâneas – uma constante na ala internacional – é substituído pela preocupação em trazer grupos e diretores ligados à universidade. É o caso de BadenBaden, concebida dentro do ambiente da Universidade do Estado de Santa Catarina. E também de Arqueologias do Presente: a Batalha da Maria Antônia, comissionada pelo próprio TUSP. Criada pelo grupo Opovoempé, a peça discute o histórico enfrentamento entre os estudantes da Faculdade de Filosofia da USP e os alunos do Mackenzie, ocorrido em 1968.

Publicidade

PROGRAMAÇÃO66 Minutes in DamascusDo Líbano. Direção: Lucien Bourjeily. Dias 31/10, 14 h, 15 h, 16 h, 17 h e 18 h, 1º, 2 e 3/11, 14 h, 15 h, 16 h, 17 h, 18 h e 19 h

Arqueologias do Presente: a Batalha da Maria AntôniaDo Brasil. Direção: Cristiane Zuan Esteves. Dias 9/11, 21 h, 10/11, 19 h, e 11/11, 21 h

Mi Vida DespuésDa Argentina. Direção Lola Arias. Dias 15 e 16/11, 21 h, e 17, 19 h The IslandDa Cisjordânia. Direção: Gary M. English. Dias 6 e 7/12, 21 h, e 8/12, 19 h Damned Be the Traitor of His HomelandDa Eslovênia/Croácia. Direção: Oliver Frljic. Dias 12, 13 e 14/12, 21 h, 15/12, 19 h Macbeth - Leila and Ben: a Bloody HistoryDa Tunísia. Direção: Héla Soui. Dias 13 e 14/12, 21 h, e 15/12, 18 h

BIENAL INTERNACIONAL DE TEATRO DA USPDe 31/10 a 15/12. Locais: Tusp, Funarte e Sesc Consolação. Ingressos: R$ 20.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.