Qualquer pessoa que tente entender os critérios de seleção de um grande festival, como o de Berlim, corre o risco de chegar a um beco sem saída. Na competição desta Berlinale, há dois filmes argentinos - El Premio, de Paula Markovitch, e El Mundo Misterioso, de Rodrigo Moreno. São insatisfatórios e indefensáveis. O melhor argentino está na seção paralela Panorama. É Medianeras, de Gustavo Taretto.Três ou quatro grandes filmes numa seleção de 20 é, afinal, um resultado honroso. O problema é que os restantes são quase todos fracos. Ontem pela manhã, passou o terceiro grande filme do festival. Come Rain, Come Shine, de Lee Yoon-ki, concorrente coreano. Nada além da separação de um casal, contada num estilo deliberadamente lento. O tempo está sendo o grande personagem dessa Berlinale.Come Rain, Come Shine faz a síntese dos dois maiores da seleção. Tem o tema da separação do casal do iraniano Nader and Simin - A Separation, mas sem a urgência social do filme de Asghar Farhadi. Usa, senão exatamente o tempo, a riqueza de uma mise-en-scène detalhada por Bela Tárr, sem as implicações bíblicas de O Cavalo de Turim.Logo na abertura, um longo diálogo, filmado dentro de um carro - quase dez minutos - introduz o casal. Ele está levando a mulher para o aeroporto. A princípio silenciosos, falam de várias coisas. De repente, ela anuncia que está deixando a casa. Como? Tem outro, quer se separar. Na sequência, o casal passa seu último dia - sua última noite - na casa. Chove torrencialmente. Ambos ficam ilhados.Como no filme de Bela Tárr, são poucas as interferências externas - um gato que invade o casa, outro casal que vem procurar pelo animal. Durante todo o tempo, é o casal. Ele segura sua onda. É solícito. Chega a se oferecer para ajudá-la a empacotar suas coisas. A mulher se exaspera, puxa uma briga (que não acontece). E então, tão inesperada quanto a confissão de que tem outro e está indo embora, ela parece vacilar. Ambos vão preparar o jantar. O gato reaparece. A narrativa termina em aberto. O que vai ocorrer com esses dois?Hyun Bin, que faz ele, é um astro da TV coreana. Lim Soo-jung, ela, também é muito popular no país e no exterior. Estrelou I"m a Cyborg, But That"s OK, que foi premiado em Berlim, há cinco anos. Formam o casal mais belo desse festival. E são talentosíssimos. O Urso de Ouro para Farhadi, o de Prata (direção) para Bela Tárr, os Ursos de interpretação para o elenco de Come Rain? Seria a premiação de sonho. Lee Yoon-ki entende tudo sobre o casal. Um Eric Rohmer coreano? Não acontece muita coisa em Come Rain, Come Shine. Mas, como em outras obras essenciais, nada pode ser tudo.