Uma única peça em cartaz nos palcos de São Paulo

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Por Agencia Estado
Atualização:

Todos os palcos de São Paulo estão calados neste fim de ano, exceto o do Sesc Vila Mariana. Ali, o espectador poderá ver uma obra-prima de Anton Chekhov, O Jardim das Cerejeiras, única produção de grande porte que ousou enfrentar a fuga dos espectadores durante as festas. A temporada nos palcos, que começará a voltar ao normal a partir da próxima semana, foi testemunha em 2000 de muitas produções ambiciosas. Jardim das Cerejeiras é uma delas. O texto radiografa uma família decadente, aristocratas russos que não movem uma palha para impedir que sua última propriedade ? em que há um um imenso, magnífico e inútil pomar de cerejeiras ? vá a leilão. O espetáculo, produzido por Renato Borghi e dirigido por Élcio Nogueira Seixas, não oferece ao espectador uma montagem convincente e envolvente da obra de Chekhov. O texto, escrito e estreado em 1904, ano da morte do autor, é dotado de uma força poética, de um lirismo que não estão quase nunca presentes em cena. A montagem de Nogueira é pesada, lenta e desencontrada. As atuações do elenco parecem ir cada qual em uma direção, sem estabelecer um todo orgânico. Os cenários de Hélio Eichbauer e os figurinos de Simone Mina, assim como a iluminação de Wagner Pinto, são bem elaborados e compõem uma bela moldura para a trama de dores amortecidas, de vida suprimida, contada por Chekhov. Mas o encenador recheou o trabalho com soluções pouco felizes, como o grande polichinelo que pula de sua caixa de armar no primeiro ato ou a invasão da cena por bolas de bilhar, no segundo. Isso tudo seria irrelevante se a história de Chekhov fosse narrada com nitidez. Mas a diversidade dos atores, que poderia ser um trunfo, não funciona. Tônia Carrero fica longe do tom da personagem, a frívola proprietária do jardim, Liúba Andrêievna. A atriz, que parece consciente da distância que a separa de Liúba, tenta transpor essa brecha por meio de muitas expressões faciais, da exibição de rompantes de emoção. O resultado não é satisfatório. O desequilíbrio de Tônia, figura central do drama, tira do eixo os demais atores. Há uma boa série de momentos individuais. A começar por Renato Borghi como Gaiev, o irmão de Liúba, que mostra bem a perplexidade e a inconseqüencia do personagem. Beth Goulart e Ana Kutner, como filhas de Liúba, também têm atuações intensas. Milhem Cortaz, como o capitalista emergente Lapakhin, e Roberto Alvim, como o idealista Trafimov, são atores vigorosos. Estão deslocadas naprodução as interessantes intervenções dos atores veteranos Dirce Migliaccio, que faz a governanta Charlotta, de Abrahão Farc, como o vizinho endividado Pichtchik e do palhaço Picolino, ou Roger Avanzi, que estréia no teatro aos 78 anos. Élcio Nogueira é um encenador inquieto, sensível, inteligente. Mas ainda não é senhor da linguagem que aspira dominar. O Jardim fica longe de se comunicar-se com a platéia. O Jardim das Cerejeiras ? Teatro Sesc Vila Mariana (R. Pelotas, 141, tel.: 5080-3000). Sexta e sábado, 21h. R$ 20 (sexta) e R$ 30 (sábado). Domingo não haverá sessão. O espetáculo retorna quinta-feira.

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