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Um rito de passagem

Abertura foi marcada por homenagens a Leon Cakoff e apoio à sua viúva

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Rubens Ewald Filho vestiu-se de gala para apresentar a cerimônia de abertura da 35.ª Mostra Internacional de São Paulo. O pedido foi do próprio Leon Cakoff, quando Rubinho o visitou no hospital. Ele pediu que o apresentador fosse 'com sua roupa de Oscar'. "Um pedido do Leon era uma ordem", disse Ewald Filho no palco do auditório Ibirapuera. A cerimônia começou com um vídeo que dava a palavra ao criador do maior evento de cinema da cidade.O próprio Leon Cakoff contava a origem da Mostra, sua luta contra a censura, durante o regime militar. O público, espontaneamente, levantou-se e aplaudiu de pé o criador da Mostra, morto na sexta-feira da semana passada, aos 62 anos. No fim, de novo o público se levantou para aplaudir, mas desta vez a ovação foi para Renata de Almeida. Durante mais de 20 anos, ela foi a fiel escudeira de Leon. Sua parceira, no cinema e na vida. A mãe de seus filhos. Renata guerreira. Caberá a ela, agora, dar continuidade à Mostra, ser a sua timoneira. O aplauso foi muito mais que um incentivo do público.Rubinho destacou o significado da cerimônia. Foi um rito de passagem. "Não foi uma despedida para o Leon, porque ele estará sempre conosco." Mas foi o reconhecimento de que a Mostra está em novas, e boas, mãos. Renata dificilmente mudará o perfil humanitário do evento, o seu compromisso com a diversidade, a luta para trazer ao Brasil um cinema diferente. Manuel Rangel, da Ancine, disse que Leon, no exterior, foi um embaixador do cinema do Brasil. No País, foi o embaixador de todas as culturas, e de todos os cinemas, que ajudou a impor num mercado que também abriu. Se São Paulo é hoje uma das cidades mais cinéfilas do mundo, isso se deve a ele, reforçou o secretário municipal de Cultura, Carlos Augusto Calil. E viva a Mostra, viva Renata!Havia o temor de que a cerimônia de anteontem fosse uma missa de sétimo dia. A noite foi longa. Começou atrasada, todos os patrocinadores e apoiadores subiram ao palco. Os discursos não foram derramados. Todo mundo se conteve tanto que predominou uma certa frieza. Do prefeito aos representantes das empresas patrocinadoras, todo mundo reafirmou o apoio à Mostra, mas a maioria, senão todos, estava lá principalmente para reafirmar sua marca. Poucos discursos foram realmente emocionados, lembrando o homem Cakoff.O secretário Calil, o presidente da Ancine, Manuel Rangel, e o diretor do Museu da Imagem e do Som, André Sturm, puseram o coração nas palavras, sem cair no sentimentalismo. E aí veio a viúva de Elia Kazan, Frances. Ela está em São Paulo acompanhando a retrospectiva que traz nove filmes de seu marido, entre eles Sindicato de Ladrões, Vidas Amargas, Clamor do Sexo e o mais raro de todos, Terra do Sonho Distante (America, America). Frances disse que seu marido teria ficado 'thrilled and delighted' com a homenagem. Frances não chegou a conhecer Leon Cakoff, mas manifestou sua solidariedade a Renata. Com a experiência de ser a viúva de um grande homem - e de levar adiante seu legado -, ela desejou 'coragem' à viúva de Leon. E começou a maratona, com a exibição, para convidados, do curta Viagem à Lua, de Georges Méliès, na versão restaurada e colorizada, e o longa O Garoto de Bicicleta, dos irmãos Dardenne. Desde ontem o evento rola para o público, com cerca de 250 títulos. O sonho de Cakoff sempre foi que o público entrasse em qualquer filme certo de assistir a um bom programa. A confiança foi algo conquistado ao longo destes 35 anos.

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