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Um olhar britânico sobre o Rio

Por Agencia Estado
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No início do século 19, a atenção da Grã-Bretanha voltava-se para o Brasil. O exotismo e a riqueza da colônia de Portugal despertavam o interesse da superpotência e não foram poucos os cientistas e artistas que visitaram o País e o retrataram em desenhos, pinturas e/ou mapas. Essa imagem que os britânicos fizeram do País perdura até hoje e é tema do livro "O Rio dos Viajantes", que a arquiteta Luciana de Lima Martins brasileira radicada na Inglaterra, lança quinta-feira. Em arquivos do Reino Unido ela obteve documentos em que viajantes descreviam o Novo Mundo usando códigos estéticos e técnicos que o decifrassem a seus conterrâneos. "As imagens que estudo dão indícios do Rio no passado, mas também nos oferecem traços da sociedade britânica oitocentista", explicou Luciana por e-mail, da Austrália, onde dá continuidade a suas pesquisas. "Trata-se de um trabalho comparativo, pois às imagens do Rio junto a de outros portos situados nos trópicos, percorridos por britânicos." O trabalho de Luciana vai além de mostrar imagens do Rio feito já obtido na exposição "A Paisagem Carioca", que esteve no MAM este ano. Ela compara os diversos autores e lembra que sua função era informar não o viajante, mas quem tomava a decisão de financiar as expedições. Esses artistas deviam também deixar a marca do financiador por onde passavam e os trabalhos eram prova de que eles haviam estado lá. Luciana cita a chegada do navio que trouxe o cientista Charles Darwin ao Rio, em 1832. O comandante mandou parar a embarcação na entrada da baía "para ver e ser visto". Luciana lembra também que entre o fim do século 17 e meados do 18, período em que focou sua pesquisa, a Grã-Bretanha era a maior potência mundial. Seus domínios se estendiam por todo o mundo (dizia-se que o Sol jamais se punha no Império Britânico), mas o Brasil não era cobiçado, por ser colônia de Portugal, país com quem mantinha vantajosas relações comerciais. E a fotografia ainda não havia sido inventada e a reprodução se fazia por meio de desenhos e pinturas. "Arte e ciência nunca estiveram tão juntas como nessa época. O olhar que mapeava, media e comparava as feições das paisagens também se deleitava esteticamente ao sabor da comparação pitoresca dessas mesmas paisagens." Hoje, o valor desses desenhos é também histórico. "Por meio deles, obtemos testemunhos do Rio do passado e pistas do processo de formação de um novo olhar sobre a paisagem, da emergência do observador moderno." Esse observador misturava mapas com imagens da fauna e flora brasileiras. A paisagem incluía tipos humanos e tudo era traduzido em termos que podem ser facilmente reconhecidos até os dias de hoje. O contorno das montanhas cariocas, por exemplo, era (e é até hoje) descrito como o desenho de um homem deitado, sendo a Pedra da Gávea a cabeça e o Pão de Açúcar os pés. A exuberância da natureza era representada em cores mais próximas às encontradas na Europa do que aqui. E apesar de ter se centrado nos britânicos, Luciana reconhece que houve um olhar europeu sobre o Novo Mundo, do qual os exemplos mais conhecidos são o francês Debret e o bávaro Rugendas. Pena que a editora Zahar tenha economizado na edição: as reproduções nem sempre estão à altura dos originais, hoje guardados em instituições européias nada acessíveis ao público. A maior parte das imagens são em preto-e-branco e não reflete o valor dado a elas no texto. Mas esse cuidado certamente encareceria o livro, que chega ao mercado por R$ 32.

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