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Um golpe na baixaria televisiva

Por Agencia Estado
Atualização:

A queixa não é inédita, mas a cada mudança na grande de programação, parece que fica mais difícil para o controle remoto encontrar alguma atração razoável na tevê aberta. Um toque no aparelho, e lá vem uma pegadinha com travestis; outro zapping, um casal se esbofeteia; uma nova tentativa, e surge um close em alguém que ameaça pular do alto de um prédio. Quem não agüenta mais testemunhar tal avalanche de atrações de gosto duvidoso, nesta semana pode ter mais esperança. No Forum Social Mundial, em Porto Alegre, encerrado na segunda-feira, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados (CDH) lançou a cartilha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania - Uma Campanha pela Valorização dos Direitos Humanos na Televisão. A cartilha é uma forma de divulgar as ações da comissão, formada no final do ano passado. A campanha consiste no acompanhamento permanente da programação da televisão para indicar os programas que - de forma sistemática - desrespeitam e ferem os direitos humanos e a cidadania. Nas linhas do texto, há um bombardeio contra a transmissão de atos violentos, de cenas que afrontam a dignidade de alguém, imagens preconceituosas ou que estimulam a precipitação da sexualidade infantil e infanto-juvenil, incluindo entrevistas sobre dificuldades no interior da família. "Ou seja, aqueles testes de DNA, exploração de criancinhas doentes, cenas de sexo gratuitas e tudo aquilo que a gente costuma ver naqueles programas vespertinos horrorosos, ou nos imbecilizantes shows de auditório que entopem o horário nobre e a grade dos domingos", diz Laurindo Leal Filho, presidente da ONG TVer, uma das 42 das entidades que apóiam a CDH. Na prática, a comissão colocou no ar um site (www.camara.gov.br/cdh) no final do ano passado. Nele, há um espaço para que os internautas-telespectadores façam suas queixas. O telespectador também pode fazer sua denúncia por meio dos emails cdh@camara.gov.br, eticanatv@docline.com.br ou ligando para 0800.619.619, (61) 318-8284 e (61) 318-8285. "No dia 12 de fevereiro vamos fazer uma reunião com o material apurado e verificar quais serão as primeiras emissoras e produtores procurados", diz Laurindo. O deputado Orlando Fantazzini (PT-SP), idealizador da campanha, explica quais serão os próximos passos: "Como toda organização democrática, vamos nos reunir com os produtores da atração ´baixaria´, colocando as principais queixas e em quais pontos eles desrespeitam o telespectador. Caso não acatem, vamos entrar em contato também com os patrocinadores desses programas, afirmando que eles patrocinam a baixaria. E, caso nenhuma mudança seja realizada, vamos divulgar o nome dos programas e o nome dos produtos, além de promover uma campanha nacional para que o telespectador deixe de assistir a tais atrações." A campanha não é o primeiro passo contra os excessos cometidos pelos programadores da televisão. Trata-se, na verdade, de uma batalha mais lenta e repetitiva que o cotidiano de meses e meses de um reality show. Amanhã, por exemplo, será arquivado o projeto de lei 6077/2002 de autoria do deputado Marcos Rolim (PT/RS). O texto será deixado de escanteio porque não foi debatido em plenário e o político não conseguiu se reeleger. Com 49 artigos, o projeto previa a criação de uma Comissão Nacional pela Ética na Televisão (CNPET), além de estabelecer uma série de normas de ética. "Não é censura. Mas sim um mecanismo pelo qual as emissoras serão responsabilizadas pelos eventuais abusos que pratiquem. É necessário o direito de expressão sim, mas sem o ´vale tudo´ que a gente vê hoje em dia", diz Rolim. O projeto deverá ser reapresentado por Fantazzini. "Mas certamente será um percurso de anos", diz. Nesse novo projeto, estuda-se uma modificação na lei de concessão das emissoras. "Poucos sabem, mas as concessões públicas têm de ser renovadas a cada 15 anos, no caso das tevês. A intenção seria simplificar as leis para a troca de proprietários. Assim, seria mais fácil fazer uma campanha para uma troca da concessão, caso a grade dessa rede seja muito apelativa", diz Laurindo. "Quando a gente acredita que a qualidade da programação da TV brasileira chegou ao fundo do poço surge nas telas uma nova atração tenebrosa. E ai nós percebemos que o poço é ainda mais fundo", completa Laurindo. E ele encerra: "Mas temos esperança de que um dia, com leis mais rígidas, fiscalização e bom senso dos programadores, a situação vai se reverter."

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