Trilogia debate relação homem-tempo

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Por Agencia Estado
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Médico, roteirista e dramaturgo, Doc Comparato foi fisgado pelo embate entre o homem e o tempo ao recriar a história de outro médico, o vidente Michel de Nostradamus (1503-1566), capaz de prever o futuro, porém prisioneiro da angústia de não poder modificá-lo. "Nostradamus lutou contra a peste negra que assolava a Europa, previu a morte de sua mulher Sabine e seus dois filhos, mas nada pôde fazer para evitá-las." A peça estreou em 1986, em São Paulo, com Antônio Fagundes como protagonista. Ano passado, Renato Borghi retomou o texto em nova montagem protagonizada por Cecil Thiré, no Rio. Há dois anos, Comparato estava em Barcelona, às voltas com uma série para a televisão, quando foi "capturado" pela idéia de completar a trilogia. "Grahan Green, Luis BuÏuel, Borges e vários outros autores já explicaram esse estranho acidente que consiste em ser atingido de chofre por poemas, livros e peças, em momentos quase sempre inoportunos", afirma o autor. "Foi o meu caso." Pouco antes, havia caído em suas mãos, presente de um amigo, o livro Visão do Paraíso, de Sérgio Buarque de Holanda (Editora Nacional). Foi a primeira fonte de inspiração para a segunda peça da trilogia, Michelângelo, o Prisioneiro do Presente. " O livro fala da documentação em poder do Vaticano sobre a descoberta do novo mundo e mostra a visão paradisíaca que os Europeus tinham dos trópicos. Comparato passou então a ler livros como I Pontifici Romani, de Massimo Carpilli, Les Anges et les Démons, de Sophie Cassagnes Brouquet. E visitou mais uma vez a Capela Sistina. Tudo para melhor desenvolver o essencial no tema. O embate de um homem obrigado a aprisionar para sempre a visão do paraíso de seu tempo. Um embate entre o suposto paraíso terrestre e o que povoava o imaginário da sua época. "Prisioneiro do Presente, Michelângelo criou a maior obra do milênio." Se em Michelângelo o embate central se dá entre a arte e a realidade, na terceira peça da trilogia, Círculo de Luzes, a comédia e a tragédia se confrontam. "Molire é prisioneiro do passado, ele está preso ao riso", argumenta Comparato. "Até hoje, quando alguém fala seu nome, a gente sorri." A peça tem como ponto de partida uma aposta sobre a capacidade de Molire mudar o rumo de sua dramaturgia. Comparato seguiu o mesmo método de trabalho na criação de toda a trilogia. "Primeiro pesquiso intensamente; depois jogo tudo numa gaveta e engulo a chave", brinca. Terá conseguido realmente criar uma trilogia sobre o tempo? "Só o tempo dirá", conclui.

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