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Todo dia é um dia infinito

'Grande Sertão: Veredas' é um dos trabalhos mais belos de Caio Blat, que leva consigo um elenco jovem e impetuoso ao Sesc Pompeia

colunista convidado
Por João Wady Cury
Atualização:

Digo sim, todo dia é um dia infinito porque não cabem nele mesmo, ao longo dos anos, todos os fatos do mundo: guerras, amores, nascimentos, mortes, feitos heroicos, covardias lambuzadas de horror. Um dia infinito não cabe em nós, e mesmo toda a Terra, o sistema solar, o tal do universo são ínfimos diante de cada dia, suas horas e os segundos. Um dia infinito – como é cada um dos dias a que chamamos ano – é aquele em que mergulhamos em nós e descobrimos o outro.

O ator Caio Blat na peça 'Grande Sertão: Veredas' Foto: Roberto Pontes

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Hoje é um dia infinito para o ator Caio Blat, que aos 38 anos arrasta consigo, de 2018 para este 2019 pleno de falso frescor, o formoso João Guimarães Rosa e seu Grande Sertão: Veredas na montagem da diretora Bia Lessa. Se não o melhor, é um dos trabalhos de interpretação mais belos de Blat. E de quebra leva consigo, meiga e delicadamente, um elenco jovem e impetuoso no árido do Sesc Pompeia. O que vemos ali é sertão e vida em forma de morte – mas é a morte que nos faz renascer em poucos minutos no mesmo dia infinito.

Também é infinito o dia para dramaturgas que veem se firmando no palco como Ave Terrena, Carol Spitzer, Dione Carlos, Grace Passô, Maria Shu e Rita Batata, geração de mulheres que, a cada degrau para cima ou para baixo, não importa, demarcam seus territórios imaginários com textos e cenas de momentos sem igual, que nunca se repetirão. E certamente para elas este novo ano tem mais, muito mais de onde vem saindo tudo isso.

Hoje também é dia do ator Ralph Fiennes. Depois de finalmente desencarnar de você sabe quem, da série de filmes Harry Potter, neste dia infinito que é 3 de janeiro Fiennes sobe ao tablado do National Theatre, em Londres, para mais uma apresentação de Antônio e Cleópatra, do bom e velho Will Shakespeare. Mas, peninha. Só quem já tem ingresso poderá assistir hoje e a toda temporada da tragédia que envolve o general romano Marco Antônio e a imperatriz egípcia – e pérfida nas horas vagas – Cleópatra.

Todos os tíquetes foram vendidos até 19 de janeiro, quando acabou-se o que era doce. Para os que ficaram sentados com o picolé de goiaba na mão, uma linha do texto de Will para aliviar a alma, na voz da musa do Nilo, nossa preferida: “Eternity was in our lips and eyes” (“A eternidade estava em nossos lábios e olhos”).

Quando leu as palavras de Cleo pela primeira vez, o gramático e lexicólogo incorrigível Pierre Larousse deve ter-se decidido pela profissão, ele, que neste dia infinito, cantou para subir no longínquo 1875. A aventura nunca é vã. Ficou a obra máxima e a esse conteúdo dá-se o nome de Enciclopédia Larousse, além de mais de 20 dicionários. Todos são como o dia, infinitos em desvelar palavras, definições, emoções.

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