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Tempo não reduz impacto dos filmes e pinturas de Dalí

Por LOUIS CHARBONNEAU
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Oito décadas já se passaram desde que o artista surrealista Salvador Dalí e o cineasta Luis Buñuel, ambos espanhóis, mostraram um homem cortando o globo ocular de uma mulher com uma lâmina. Mas os espectadores ainda se chocam, gemem e cobrem os olhos diante da cena. A sequência abre o filme de 16 minutos "Um Cão Andaluz", um dos vários que estão sendo exibidos ininterruptamente numa exposição intitulada "Dalí: Pintura e Cinema" no Museu de Arte Moderna de Nova York. A julgar pelas reações das pessoas que lotaram a exposição no domingo, a cena não perdeu sua capacidade de fazer o público estremecer. A exposição, que poderá ser vista no MoMa até 15 de setembro, é uma coletânea fascinante que reúne sob o mesmo teto algumas das obras mais conhecidas de Dalí, normalmente espalhadas por museus e coleções particulares pelo mundo afora. As imagens de pesadelo criadas pelo surrealista ainda parecem inovadoras no século 21 -- relógios que derretem, enxames de formigas saindo de uma órbita ocular, ciclistas com baguetes nas cabeças, uma mulher cuja barriga se transforma em um buquê de rosas que sangram. O que é singular na exposição é sua ênfase sobre o papel central exercido pelo cinema, na época uma mídia ainda nova, na visão estética do então jovem Dalí, que nasceu em 1904. A curadora de desenhos do MoMa, Jodi Hauptman, explicou: "Dalí captou a capacidade aparentemente contraditória do cinema de combinar o real e o surreal, o objetivo e o imaginativo, o prosaico e o poético." "Paradas ou em movimento, pintadas ou filmadas, as obras de Dalí querem mexer profundamente com quem as vê, oferecendo uma experiência provocada pela imagem, mas concretizada na mente." Apesar de seu vanguardismo, Dalí não tinha nada contra o cinema comercial. Ele trabalhou com Alfred Hitchcock em uma sequência de sonho no filme de 1945 "Quando Fala o Coração", e também com os irmãos Marx. Outro filme que está sendo exibido no MoMa é um curta animado no qual Dalí trabalhou na década de 1940 com Walt Disney, mas que só foi terminado em 2003, muito tempo após sua morte. É um poema psicodélico sobre Cronos, o deus grego do tempo, e seu amor por uma mortal. Quando se vêem as telas mais famosas de Dalí ao lado de seus trabalhos no cinema, fica claro como a fotografia e o cinema foram cruciais para o homem visto como o segundo mais conhecido artista do século 20, depois do também espanhol Pablo Picasso. Dalí tinha consciência da importância do cinema para seu trabalho surrealista, que incentiva o espectador a enxergar o mundo sob outra ótica, destituindo os objetos de seu significado cotidiano, distorcendo-os e colocando-os lado a lado com outros. Em carta escrita ao poeta e teórico surrealista francês André Breton, Dali disse: "Estou em Hollywood, onde entrei em contato com três surrealistas americanos: Harpo Marx, Disney e Cecil B. DeMille". "Acho que os entusiasmei o bastante e espero que as possibilidades do surrealismo aqui se concretizem."

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