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O legado feminista de Sonia Rykiel

A estilista francesa, que morreu na última quinta, marcou a moda e o modo de vestir das mulheres ao reinventar o tricô

Por Giovana Romani e Anna Rombino
Atualização:
Passarela. A estilista Sonia Rykiel viveu seu apogeu entre as décadas de 1970 e 1980 Foto: Jean-Christophe Kahn|Divulgação

O ano é 1968. Estudantes e trabalhadores tomam as ruas de Paris contra o abuso policial e o governo de Charles de Gaulle. A participação das mulheres é intensa e o movimento feminista, latente. Neste contexto, a estilista francesa Sonia Rykiel abre sua primeira loja na rue de Grenelle, na Rive Gauche, com uma proposta um tanto quanto incomum para a época: seu foco eram as peças de tricô, transformadas em elementos de moda por meio de modelagem minimalistas, tramas inovadoras e padronagens coloridas.

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“Antes considerados menores, o tricô e a malha ganharam sofisticação pelas mãos de Sonia”, afirma o jornalista Mario Mendes. “Na esteira de Vionnet e Chanel, ela propôs a volta do conforto para as mulheres em um momento importante da história.” Morta na última quinta-feira, aos 86 anos, Sonia viveu seu auge profissional na década de 1970.

O período anterior havia sido marcado pelas roupas estruturadas de pegada futurista, eternizadas por Pierre Cardin e Courrèges. A languidez das peças de tricô, próximas ao corpo e sensuais de Sonia Rykiel aparecem, então, como um contraponto bem-vindo, logo adotado por Brigitte Bardot e Catherine Deneuve. “A estilista simplificou a maneira da mulher se vestir ao libertá-las dos blazers, oferecendo a facilidade do gesto permitida pelo tricô”, diz a consultora de moda Gloria Kalil. “Por isso, integrou a geração que fez o prêt-à-porter se tornar importante.”

Se antes o mercado estava voltado para a alta costura, com suas cifras milionárias e clientes fiéis, agora a moda prática, fácil e rápida, mas com informação e estilo, crescia a passos rápidos. “Sonia foi a primeira estilista francesa que teve grande distribuição comercial e sucesso de venda nos Estados Unidos,”, conta Gloria. “Talvez pela facilidade da proposta dela, porque os americanos gostam muito de coisas simplificadas e facilitadoras da vida.” No caso, não se deve confundir simples com simplista. 

Sonia Rykiel sabia como explorar detalhes, brincar com as cores e produzir imagens vanguardistas. Com o rosto exótico emoldurado por uma franjinha e uma volumosa cabeleira ruiva e crespa, ela mesma estava longe da obviedade. Muitas vezes levou às passarelas e campanhas modelos que pareciam criadas à sua imagem e semelhança. “Ela nunca foi bonita, mas tinha um visual impactante e usava isso a seu favor”, diz Mario Mendes. . As publicidades mais marcantes da estilista foram feitas em parceria com a fotógrafa francesa Sarah Moon. Juntas, elas inauguraram uma estética que até hoje inspira editorias de moda mundo afora.

Tudo com uma aura de mistério e intelectual – valor importante para Sonia Rykiel. No último desfile da coleção Resort, em junho, as modelos desfilaram entre livros em estantes de uma biblioteca vermelha na loja da marca em Nova York. A unidade americana tem a mesma ambientação da matriz parisiense, no bairro de Saint-Germain-des-Prés, e das principais unidades da grife no mundo. Dentro delas, é possível se sentir imerso no universo criativo de vanguarda da estilista. 

Parkinson

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Sonia Rykiel se aposentou em 2009 e deixou o comando da grife nas mãos da filha, Nathalie Rykiel, que já era diretora artística da companhia desde 1995. Em 2012, Sonia revelou que sofria de mal de Parkinson há 15 anos em seu livro, “N’Oubliez Pas Que Je Joue” (“Não se Esqueça que Estou no Jogo”, em tradução livre). A estilista omitiu a doença, inclusive da família, até não conseguir mais esconder os sintomas. Como costumava descrever-se, era uma mulher “frágil, mas forte”.