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Retratos e relatos do cotidiano

Sintonia aniversariante

Em vez de matar aula no bar, Bea e eu matávamos aula na cantina, tomando toddynho

Por Ruth Manus
Atualização:

Eu tinha entre 3 e 4 anos quando conheci a Gigi. Não sei bem se nessa altura eu já entendia de aniversários. Suponho que sim porque sempre fui uma criança um pouco esquisita. De toda forma, sabia que o aniversário da Gi era no dia 19 de julho, exatamente o mesmo dia do Pajé, meu irmão. Esse simples fato já fazia com que a Gigi tivesse um lugar especial no meu coração, porque se o dia 19 de julho era o dia dela, ela já ganhava automaticamente alguns ares do Pajé. E para mim, ter ares do Pajé era (e ainda é) uma das características mais encantadoras que alguém pode ter.

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Quando tinha 10 anos, realizei o sonho de ter amigas gêmeas. A Fê e a Má, que nasceram no dia 12 de março de 1988, no dia do aniversário de 37 anos do meu pai. Elas eram um combo extremamente vantajoso, porque eram duas amigas, gêmeas e pertencentes a essa data tão soberana. A Má é a amiga que perdi para um câncer estúpido quando eu tinha 18 anos. E fico feliz por saber que a Fê não ficou sozinha no dia 12 de março: meu pai continua com ela, honrando essa data de saudade.

Entrei na faculdade e logo conheci a Bea. Nós éramos parecidas porque ainda não tínhamos aprendido a gostar de cerveja, por isso, em vez de matar aula no bar, matávamos aula na cantina, tomando Toddynho. Era uma expressão válida de rebeldia. O dia do aniversário da Bea é 19 de setembro, o mesmo dia da minha mãe. Amá-la era absolutamente inevitável: ela nasceu naquele dia intangível e nunca me julgou por causa das caixinhas de achocolatado.

Quando vim morar em Lisboa, conheci a Ana Valente. Acredito que Ana Valente seja o nome mais bacana que eu conheço, competindo apenas com Radegunda Gavião, que uns amigos diziam ser a oficial do Cartório de Notas de Birigui, mas eu nunca soube se era verdade. Mas a Ana, além de ser Valente, nasceu no dia 5 de novembro, dia da minha avó Rita. A Ana não poderia ser melhor do que é.

Houve apenas um processo invertido a essa lógica de amar – ainda mais – certos amigos por causa de escolhas tão certeiras de dias para nascer. Foi a Carol. A Carol é minha amiga atemporal e interplanetária. Amo-a desde os meus 5 anos, independentemente do fato de ela ter nascido no dia 1.º de agosto. Mas logo que eu completei meus 7, nasceu o Mathias, meu primo-irmão-caçula-paixão-eterna, bem no dia do aniversário da Carol. O Mathias já veio duplamente amado por mim, por ter indícios de Carol.

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Ainda não ganhei nenhum amigo de 13 de abril, aniversário da Nina, minha irmã. A Anninha passou raspando, mas se apressou pro dia 12. Contudo, o sogro da Nina é de 13 de abril e eu tenho por ele um afeto raro. Talvez sejam os olhos cor de piscina, talvez seja por comer tão devagarzinho quanto ela ou talvez seja apenas o 13 de abril. Não sei. A Amanda, minha amiga mais certa, é vizinha do meu saudoso avô Zé. Ele era de 21 de abril, ela é 22. Ambos são amigos de Tiradentes. E a Fê, minha amiga de 12 de março recebe meus parabéns também todo dia 21 de abril, numa persistente e infeliz piada por ela ser dentista.

O marido da minha chefe faz aniversário junto com o meu marido. Portugal faz aniversário junto com a minha enteada. Minha cunhada faz aniversário junto com a Independência norte-americana, minha sogra faz aniversário junto com uma das minhas madrinhas de casamento. E assim eu vou nutrindo afetos gratuitos.

No ano passado, ganhei um presente especial de aniversário. A esperada sobrinha do Léo nasceu no dia 3 de junho, quando completei meus 28. Para completar, seu nome é Nina, como a minha irmã. Um pacote completo de vínculos que emana carinho por todos os lados.

É uma bobagem. Nada disso significa coisa nenhuma. Mas, dentre as insignificâncias da vida, gosto muito dessas, que fazem com que a gente goste mais, comemore em dobro e abra os braços.

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