"Silêncio" refaz percurso da cultura ocidental

Uma das melhores montagens do ano, a adaptação do monólogo de Peter Handke dirigida por Beth Lopes ainda pode ser conferida, terça e quarta, no Teatro Faap

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Por Agencia Estado
Atualização:

Silêncio, de Peter Handke, em cartaz por apenas mais dois dias em São Paulo (poderá ser visto na terça e na quarta-feira, por cerca de 30 espectadores em cada noite, acomodados no palco do Teatro Faap), é um trabalho experimental de extraordinária qualidade. Originalmente um monólogo de Peter Handke, a peça foi adaptado por Beth Lopes, diretora. Em cena, dois personagens sem nome, ele e ela, enfrentam-se em uma luta de conceitos e visões de mundo. O espetáculo de Beth Lopes propõe uma aventura. O público é conduzido até uma porta lateral do Teatro Faap e tem acesso ao palco por uma rampa de serviço. Ali dentro, a platéia é acomodada nos dois lados de uma longa mesa de metal, onde se concentra a ação. A trama de Silêncio dispensa história. Handke, dramaturgo alemão, autor de O Pupilo Quer Ser Tutor, coloca em cena uma figura que se afirma permanentemente. No início, enumera uma série de conquistas, de realizações: "Eu falei, eu me expressei". E, aos poucos, as afirmações positivas se tornam sombrias constatações de que o protagonista alimenta ódios, preconceitos, raivas. Em pouco mais de uma hora, tendo por única base a palavra, Handke leva o espectador a refazer todo o percurso da cultura ocidental, desde as descobertas e inventos até sua degradação. A montagem de Beth Lopes, ao transformar o monólogo em um texto para dois personagens, aprofundou e ampliou as possibilidades do conflito e desenhou uma montagem eletrizante. A visão filosófica do dramaturgo, sob a direção segura, inteligente de Lopes, ganhou uma dimensão inesperada. E tem em Yedda Chaves e Matteo Bonfitto (também tradutor da obra), dois intérpretes à altura dos desafios que a peça apresenta. Vivenciado pelos intérpretes, o choque de idéias exposto em Silêncio ganha inesperada intensidade. Exposição teórica de conceitos adquire, o texto adquire a urgência e a força das explosões humanas. Erotismo, violência, competitividade, tudo eclode no palco do Teatro Faap revestido de fúria, aspereza e muito humor. Silêncio é uma das melhores montagens de 2000, um trabalho que não pode deixar de ser visto.

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