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Séries feitas para o Instagram conquistam fãs na quarentena

Quadrinhos, humor, novela: autores usando a criatividade para falar do cotidiano com linguagem própria

Foto do author Danilo Casaletti
Por Danilo Casaletti
Atualização:

Qual sua série ou novela predileta? Antes da pandemia, essa reposta certamente conteria títulos exibidos em plataformas de streaming e canais de televisão. Mas, agora, as opções podem estar em cartaz nas redes sociais mais próximas, sobretudo no Instagram. São produções com a cara do isolamento – feitas remotamente e com ferramentas de edição simples. Porém, totalmente conectadas com o momento, abordando temas como solidão, crises no relacionamento, festas à distância, furadinha na quarentena, influenciadores sem noção e questões sociais.

O ator Pedro Monteiro e seus personagens da #mininovela, criados com filtros do Instagram Foto: Arquivo Pessoal

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Novela no feed

Entre as séries que estrearam nessa temporada está a #mininovela, uma comédia criada e protagonizada pelo ator carioca Pedroca Monteiro (@pedrocapedroca). Os capítulos – que já passam dos 20 e são postados diariamente ao meio-dia - são curtos. Podem ter 2 ou dez minutos, e cada cena dura o tempo de um vídeo no feed do Instagram, que tem duração máxima de 1 minuto.

A trama gira em torno de um casal que está separado e se comunica por meio de videochamadas. Ivanildo é bonachão, ex-marido de Letícia, com quem compartilha a guarda dos filhos gêmeos. A caracterização das personagens é feita por meio dos filtros da própria ferramenta, que distorcem as feições do rosto ou mudam o sexo das pessoas.

“A #mininovela começou como uma maneira de eu extravasar minhas emoções durante a quarentena. É um lugar lúdico, no qual posso me reinventar nesse caos todo, nesse medo que estamos vivendo. É o meu palco, já que eu não posso estar em um ou em algum estúdio de TV”, diz Monteiro, que, por conta da quarentena, teve que interromper a temporada da peça Simples Assim, em que atuava ao lado das atrizes Julia Lemmertz e Georgina Góes. O ator também estava envolvido nas novas temporadas do seriado Vai Que Cola, do Multishow, e do programa Fora de Hora, da TV Globo.

Como todo folhetim, a #mininovela também tem seus coadjuvantes – e eles foram surgindo de acordo com o decorrer dos capítulos. Mariangela, a mãe de Letícia, e Patrick do Heiki – a quem Ivanildo recorre pata tentar acalmar os nervos da ex-companheira – são alguns deles. Porém, como pode acontecer nas melhores tramas, há uma secundária que roubou a cena: Carol Priscila, uma novata cantora da MPB. A princípio ela tinha uma grande dificuldade em começar uma live, até porque ela sofria com a falta de seguidores. Porém, quando conseguiu soltar a voz, veio com a canção Solidão Galopante, que se tornou um hit na vida real.

A letra, de poucos versos, diz, em um dos trechos: "Solidão, como um cavalo galopante, como um cavalo de sete flechas. Solidão que vem, solidão galopante". Uma canção clichê que, segundo Monteiro, foi feita de improviso. “Não sei de onde saiu. Nasceu porque tinha que nascer”, conta. Seguidores passaram a mandar a música em versões diversas - funk, voz e violão, harpa - e até um videoclipe, feito pela dançarina Maria Eugenia Tita, que usou um cavalo real nas cenas. O próximo passo será o lançamento oficial de Solidão Galopante no Spotify. “É bonito ver que estou inspirando outras pessoas, outras artes”, diz o ator.

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Com tanta repercussão, Monteiro viu seu número de seguidores dobrarem – atualmente ele conta com quase 66 mil pessoas em seu perfil do Instagram. Entre os famosos que seguem e vibram a cada capítulo estão os atores Selton Mello, Marcelo Adnet, Lucio Mauro Filho, além dos cantores Fafá de Belém, Lulu Santos, Alice Caymmi e Teresa Cristina - que até fez uma participação especial na #mininovela cantando Solidão Galopante.

Apesar do sucesso da novelinha, ele não sabe ao certo até quando ela vai prosseguir, já que os capítulos são gravados no dia anterior da publicação e os diálogos feitos quase que na hora, apenas com um roteiro para dar um rumo para a história. “Penso, mais tarde, transformá-la talvez em uma peça”, conta o ator, que há 4 anos, já dava às caras na internet com a série Pedroca Desabafa, projeto que foi levado para a televisão dentro do programa Papo de Segunda, da GNT.

Isolamento no IGTV

Outro produto criado nessa quarentena é a série Quarentenados (@quarentenadostv), publicada no aplicativo de vídeo IGTV.  A produção, que estreou dia 21 de junho, tem previsão de duração de seis capítulos, publicados sempre aos domingos, às 18h.

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Produzida pela Young Republic Films e com direção de Daniel Tupinambá, ela conta a história de seis amigos que moram no mesmo prédio, mas decidem não se encontrar pessoalmente durante o período de isolamento social, a não ser por vídeo, em um ritual que vira diário. Uma das tramas que amarra a história é o planejamento de uma festa virtual para um dos amigos. No elenco, estão nomes como Fábio Rabin, Isabella Santoni, Gabi Lopes e Maicon Rodrigues.

Filmada na vertical, para se adaptar ao formato da ferramenta em que é reproduzida, a série é gravada na sequência pelo aplicativo zoom. Antes, todas as cenas são ensaiadas em um processo colaborativo entre os atores e diretores. “Como virou um hábito na quarentena, os personagens também se encontram por meio de videochamada. Por isso, a gente traz essa linguagem mais naturalista, do ao vivo”, explica Tupinambá. O diretor também pede que cada ator grave com uma segunda câmera, para, na edição, mostrar outros planos e a ambientação da cena. 

De acordo com a produção de Quarentenados, o primeiro episódio alcançou 1 milhão de visualizações em menos de 24 horas no ar. A série é publicada em sete IGTV’s diferentes – além do oficial, cada um dos atores também solta a série em suas contas pessoais. “É muito gratificante. Já recebi mensagens de pessoas que dizem estar deprimidas e que esperaram o domingo para assistir e ficar bem. É o poder do entretenimento como cura”, diz o diretor.

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A atriz Isabella Santoni, que vive a personagem Sofia na série, diz que, apesar de cada um gravar isoladamente, não se sente em um trabalho solitário. “Como é um processo em um grupo, a gente troca muito. É a parte mais legal”, conta ela, que afirma ter aprendido novas funções nessa nova maneira de atuar. “Tenho que preparar o cenário, me preocupar com a iluminação, ver o enquadramento, dar o 'rec' na câmera. A função da arte é gerar transformação. Iremos nos adaptar.”

O último capítulo da temporada será exibido no dia 26 de julho, mas os produtores já pensam na continuidade dela, talvez fora das redes. Eles trabalham em um projeto para transformá-la em sitcom para ser exibida na TV ou em plataforma de streaming.

Papo sério em quadrinhos

Não só de produções audiovisuais vive as séries mais procuradas nas redes sociais na quarentena. Um quadrinho com forte crítica social tem atraído o like de milhares de pessoas. Publicada no perfil do ilustrador e roteirista carioca Leandro Assis (@leandro_assis_ilustra), Confinada é uma parceria dele com a escritora e ativista Triscila Oliveira (@soulanja). A série conta a história da influeciadora digital Fran Clemente e os contrastes de seu isolamento, em um apartamento na zona sul do Rio de Janeiro, com a vida de suas empregadas domésticas na periferia. 

“A personagem é uma blogueira fitnnes padrão e eu sou a mulher preta periférica observando essa mulher privilegiada. Infelizmente, tem muita gente que se inspira nessas pessoas, mas, com a epidemia, outras tantas perceberam que, na verdade, esse tipo de influencer não agrega nada na vida delas”, diz Triscila. Ela foi convidada por Assis para dividir com ele a autoria de seus trabalhos depois que deixou um comentário em outra série em quadrinhos, Os Santos, colocada em pausa em função da pandemia.

Nela, Assis (e, posteriormente, também Triscila), contava a rotina de uma família de patrões e empregados. Confinada, então, deriva de Os Santos, mas aborda os conflitos sociais explicitados com a pandemia – enquanto a primeira trazia um conteúdo mais político. Para Triscila, o tom ácido da série é um “necessário tapa na cara para que as pessoas percebam que não existe uma única realidade”.

De acordo com Assis, a inspiração vem de personagens que estão nas redes sociais, não só do Brasil como em outros lugares do mundo. “É um apanhado delas”, resume ele, que há dois anos vive em Portugal. O ilustrador diz que Fran Clemente acabou por virar uma vilã de novela que o público adora odiar. “Já não sei se nos inspiramos nelas (as influencers) ou se elas que se inspiram em nós. Em uma das tiras, falamos de uma festa que a personagem deu furando o isolamento. Dias depois, teve uma influencer que fez a mesma coisa e acabou cancelada na internet”, diz Assis, referindo-se à comemoração que Gabriela Pugliesi promoveu em sua casa no mês abril.

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Por ora, Confinada segue até que o período (e histórias) do confinamento perdurarem. Mais para frente, Assis pretende transformar tanto ela quanto Os Santos em livros.

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