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Senise volta ao campo de batalha da pintura

Artista carioca, um dos expoentes da Geração 80, exibe nove grandes telas, resultado dos últimos dois anos de trabalho em seu ateliê no West Village, em NY

Por Agencia Estado
Atualização:

Vem à tona hoje, na forma de nove grandes telas, o resultado de dois anos de trabalho do artista plástico Daniel Senise em seu ateliê no West Village de Nova York. Estão de volta as mesmas questões que o perseguem há 20 anos, agora expostas sob nova roupagem. A exposição que começa hoje na Galeria Brito Cimino marca ainda o retorno a São Paulo do artista carioca, um dos expoentes da Geração 80, depois de dois anos sem se apresentar individualmente na cidade. Saem de cena objeto ou figura (humanas ou não), as marcas de pedaços de metal e pregos oxidados, as maçanetas e cabides acoplados à tela. Agora é a vez dos espaços interiores de diferentes museus espalhados pelo mundo. Usando fotografias extraídas de revistas de arte, trabalhadas em photoshop, Senise eliminou todos elementos internos desses ambientes (quadros, esculturas, objetos, visitantes). A partir dessas imagens, de salas "vazias", ele construiu quadros enormes (o maior tem 2,13 m de altura por 4,26 m de comprimento). A técnica é a mesma utilizada por Senise desde o fim dos anos 80: primeiro, usando cola, pigmento e água, ele faz impressões do chão de seu ateliê sobre uma tela, depois recorta seções do pano, que então monta sobre suporte de madeira. Não há sobreposição dos pedaços de tela, eles se justapõem quase imperceptivelmente. O resultado se assemelha a uma pintura, principalmente se observada de maior distância: há variação de cores, passagens de tons, luz, volume, linhas, espaços virtuais, ponto de fuga, perspectiva. "Sempre achei que os museus são lugares meio tumulares", diz o artista. "Assemelham-se a catacumbas e vistos dessa maneira essa característica fica mais evidenciada." Senise diz que tentou fugir de lugares óbvios como o Guggenheim de Nova York ou o Louvre de Paris, escolhendo espaços menos célebres, como o do Centro de Arte Contemporânea da Galícia, em Santiago de Compostela, o Dia Center of Arts, em Nova York, e o Haus Lange, na cidade alemã de Krefeld. Na verdade, o museu original não importa muito, já que esses lugares serviram apenas como referência. Sobre esses trabalhos, uma "nova tentativa", Senise diz usar outra estratégia "para falar de problemas que já enfrentou em outras exposições, como a relação presença-ausência". Segundo o artista, esse embate acontece entre o que foi criado para ser o centro da pintura - ou do real - e aquilo que é secundário. Essa questão já foi tratada por ele na célebre série Ela Que não Está que, partindo de um afresco de Giotto (Morte de São Francisco, 1325) tornava ativa uma região danificada da obra. Senise eliminou os anjos, santos, o leito de morte, enfim todos os objetos e figuras humanas do quadro, restando apenas uma forma antes indefinida e aleatória, mas agora elevada à condição de centro do quadro e do nosso olhar. As questões que Senise se coloca não são novas. Como continuar se superando na pintura, partindo sempre de um suporte bidimensional? Como eliminar o suporte, ou fazer dele parte da obra? Como levar adiante o projeto moderno, que presumia a idéia de evolução? As contradições - que atravessam essas perguntas de infinitas respostas - são, a começar pela mais evidente: a maioria dos trabalhos já feitos por Senise nem sequer é pintada, mas criada a partir de camadas de materiais como ferrugem, voile, resina, cola e poeira. Outra grande parte de sua obra não usa nenhuma tinta. Nesses mais recentes, não há pincelada. Mais: há em suas telas uma "eloqüente ausência" de gestos, exatamente o dado mais evidente que tem marcado os sucessivos "retornos da pintura" (ela cuja morte vem sendo sucessivamente decretada desde o surgimento da fotografia, em meados do século 19). Contudo, os trabalhos de Senise carregam enorme preocupação com as questões e dúvidas da pintura - que na verdade pode ser vista como o tema de sua obra, mesmo que quase nunca ele se valha de suas técnicas. Enfim, podemos ver sua produção recente como "construções sobre a pintura". "Acredito que existe a possibilidade de se criar no plano. A expressão bidimensional é legítima. E uma de minhas estratégias é trazer as dúvidas do modernismo para dentro da minha paisagem."

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