Ruffato estréia no romance com 24h paulistas

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Por Agencia Estado
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Depois daquele 16 de junho de 1904, a literatura nunca mais foi a mesma. James Joyce mostrou em Ulisses que um romance cabe em um único dia. Luiz Ruffato também resolveu espiar a vida - ou flashes dela - de vários habitantes de uma cidade em pouco mais de 24 horas. Na madrugada do dia 9 de maio de 2000, um grupo de trabalhadores se desloca a pé da periferia para a cidade, e o leitor inicia, conduzido pelas mãos hábeis do narrador, uma vertiginosa excursão por uma infinidade de dramas nas 160 páginas de Eles Eram Muitos Cavalos (Boitempo), cujo lançamento está marcado para o dia 25 de setembro no Bar Balcão, em São Paulo. É o terceiro livro de Ruffato, mineiro radicado em São Paulo, que estreou em 1998 com Histórias de Remorsos e Rancores e, no ano passado, ganhou menção honrosa no concurso Casa de las Américas com Os Sobreviventes. Mas é sua estréia no gênero romance - os dois anteriores são de contos -, se é que se pode qualificar a narrativa fragmentada e a mistura de estilos da obra de romance. Ruffato tomou como um desafio escrever sobre a cidade onde vive há mais de dez anos. Queria algo parecido a uma sinfonia, na qual se pudesse ouvir o som das muitas e diferentes vozes dos milhões de habitantes da maior aglomeração urbana do Brasil. Colocar todas elas em um livro implicou em fragmentá-lo e embalar seu conteúdo em formas diferentes. "Cada fragmento exigiu uma arquitetura narrativa diferente, desde a clássica até discursos aparentemente sem lógica". Reunir os flashes urbanos em um dia foi a saída encontrada pelo autor para dar coerência ao livro. "O tempo funciona como um fio condutor, já que não há um personagem que aparece ao longo da narrativa". Romanceiro - Quando Ruffato iniciou o esboço da obra, reuniu centenas de anotações, notícias de jornais e revistas, folhetos colhidos nas ruas e os levou para uma viagem de férias. Era uma pasta pesando quase três quilos de papel. Durante um mês elaborou uma primeira versão, enxugada quase pela metade. Pensou em chamá-la de "crônica da mui valerosa cidade de São Paulo de Piratininga", mas suprimiu a frase que dava a entender um relato jornalístico. O título que ficou foi tirado de um verso do poema Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meirelles, mas remete também ao romance de Horace McCoy, They Shoot Horses, Don´t They? (Eles matam cavalos, não matam?), que no Brasil ganhou outro título, Mas Não se Mata Cavalo? e depois ficou conhecido com o título do filme dele extraído, A Noite dos Desesperados. Em seus dois primeiros livros, os personagens criados por Ruffato vivem em Cataguazes. São representantes da pequena burguesia ou do proletariado que vivem à sombra da indústria têxtil da cidade da Zona da Mata mineira. Em Eles Eram Muitos Cavalos, alguns desses mesmos personagens chegaram a São Paulo, onde também procuram sobreviver, mas tendo que lidar com a dor do exílio voluntário. Mas Ruffato não se prende apenas aos pobres e miseráveis habitantes das ruas e periferias, lá estão também os casais de classe média preocupados com as contas do fim do mês e o traficante de armas a bordo de uma Mercedes. O que une todos eles, além de ocuparem a mesma cidade? "A violência e o medo", diz o autor. A epopéia de um dia na vida dos habitantes de São Paulo termina nas primeiras horas do dia 10 de maio. São pouco mais de 24 horas, mas é o bastante para mergulhar num inferno que parece não ter fim. Noite de autógrafos e lançamento de Eles Eram Muitos Cavalos, de Luiz Ruffato, amanhã às 19h, no Bar Balcão, rua Melo Alves, nº 150.

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