Resenha do livro 'Sunset Park', de Paul Auster

A ficção de Paul Auster é um animal estranho. Altamente legível e fluente, é sofisticada o bastante para ser confundida com alta literatura, e sua eficiente mímica textual sugere sucessão ao trabalho de Beckett e Nabokov sem jamais assumi-la, o que faz de Auster um autor que reconhece exatamente sua medida: um satirista de mistérios que não consegue compreender. Ela aponta para a danação da loucura, da doença, da violência e da alienação. Mas elude com tanta eficácia essas questões que jamais incomoda a sensibilidade do leitor.

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Por Vinicius Jatobá
Atualização:

 

Sunset Park é puro Paul Auster: Miles Heller chega à Nova York após abandonar uma vida promissora na Flórida. Em Brooklyn, próximo ao parque que dá nome ao romance, encontrará uma série de personagens que farão com que reconheça sentimentos profundos de nostalgia e de desilusão que o tornarão outra pessoa. Os EUA de Auster é a América de Obama: enfeitiçada por um discurso de mudança, mas paralisada por uma profunda crise econômica e moral. Os jovens vivem seus sonhos, escrevem sobre filmes e peças de teatro, tentam publicar seus livros, enquanto buscam um sentido para suas vidas que vá além de uma lógica econômica. Mas sem perspectivas, vivem de bicos, sublocando imóveis.

 

Parte do prazer de ler Auster é estar diante do fervor frio com que acredita no que escreve. Quando Miles está na cama com Pilar, uma ninfeta erudita e intensa, Auster descreve o sentimento amoroso entre eles com lugares-comuns tão violentos que ruborizariam qualquer outro escritor. Mas há algo de charmoso na maneira como Auster acredita que uma técnica sofisticada pode esconder um pensamento rasteiro, e essa convicção torna a leitura de Sunset Park imensamente satisfatória. Há um elemento de humorismo involuntário em como Auster usa técnicas complexas para narrar assuntos tão banais. Mas tudo soa tão natural, e despretensioso, que é impossível não relevar os inúmeros deslizes e ir até o final do livro.

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