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Querida Clara, amado Robert

Sting e sua mulher Trudie Styler interpretam as cartas trocadas entre o casal Schumann

Por Allan Kozinn
Atualização:

No reino da música clássica, os chamados projetos "crossover" - aqueles em que vários estilos são combinados - em geral envolvem cantores de ópera ao lado de instrumentistas caros, que tocam jazz, pop ou música folk, mas não tão bem como os músicos especializados nesses estilos. Mas, desde o fim da década de 80, esse tipo de parceria seguiu em outras direções.Stewart Copeland e Roger Waters escreveram óperas; Paul McCartney compôs uma série de músicas para piano, coros e orquestra; Elvis Costello criou um balé; e Sting - que foi colega de Copeland na banda Police - realizou diversos projetos, entre eles o Songs from Labyrinth, CD de 2006 devotado às canções e peças para alaúde de John Dowland e interpretadas com a liberdade e a tonalidade vocal de um cantor pop.Você pode facilmente criticá-lo por isso, mas em entrevistas Sting deixou claro que está consciente das suas deficiências. E falou das canções de Dowland e de outras obras clássicas com tal paixão, mostrando que ele ama essas músicas e quer que as pessoas as ouçam.Isso também contribuiu, suponho, para a concepção de Twin Spirits, um híbrido de peça teatral e concerto, com duração de 100 minutos, que Sting e sua mulher, a atriz Trudie Styler, estrearam no dia 30 Allen Room. A peça, escrita e dirigida por John Caird e encenada pela primeira vez no Covent Garden em 2005, enfoca o romance entre Robert e Clara Schumann. Uma encenação de 2007, também no Covent Garden, foi lançada pela DVD Opus Arte.Sting não tentou cantar as "lieder" de Schumann nesta produção; a música vocal está por conta de um barítono e uma soprano. Em vez disso, o cantor faz o papel do compositor, lendo as cartas que ele escreveu para Clara Wieck, durante o longo período de noivado, e o diário conjunto que o casal começou quando se casou em 1840. Trudie Styler interpreta Clara e lê a correspondência dela.Não é exigida muita interpretação. Sting e a mulher permanecem sentados durante a maior parte da peça, mas imprimem na leitura dessas cartas uma grande dose de emoção; divertidas no caso das primeiras, mas também excêntricas e brincalhonas; e comoventes quando Clara fala sobre a loucura, a internação e a morte de Schumann.Um narrador, David Strathairn, faz uma cronologia e mostra o contexto em detalhes, sentado numa cadeira tipo trono, numa plataforma atrás de Sting, Trudie e os seis músicos que interpretam músicas de Robert e Clara Schumann, com toques de Chopin e Mozart, entre as seções de leitura das cartas.O roteiro de John Caird é eficiente e com ritmo rápido, embora, mais no final, quando a correspondência de Schumann diminui à medida que a doença toma conta dele, o texto se transfira para a narrativa e a parte musical fique mais longa.Teclado. O preâmbulo do Carnaval, apresentado como introdução ao diálogo, começa como uma peça de Schumann para teclado. Mas o pianista Jeremy Denk toca apenas alguns compassos antes de a peça se transformar num trio, com o violinista Joshua Bell e a celista Nina Kotova unindo-se a ele.Um outro movimento, a Marcha dos Companheiros de Davi contra os Filisteus, é mais dramático, com passagens que se alternam entre, de um lado, Jeremy Denk e Joshua Bell, e do outro Nina Kotova e mais uma pianista, Natasha Paremski. A ideia, claramente, é fazer um intercâmbio entre os pares masculino e feminino de músicos. Similarmente, o Traumerei (Sonho) da sua obra Kinderszenen (Cenas infantis) foi transformado de uma peça solo para piano num diálogo entre Joshua Bell e Natasha Paremski. Um arranjo inócuo, mas os dois pianistas harmonizam o som e o fraseado muito bem. Mas na Marcha a tensão da peça escrita para piano fica sacrificada na sua tradução. O barítono Nathan Gunn, apoiado por Jeremy Denk ao piano, canta maravilhosamente as três canções do Dichterliebe (Amor de Poeta), no final do espetáculo, e também faz uma bela leitura introspectiva do Stille Liebe de Zwolf Gedichte (Doze Poemas).A soprano Camille Zamora, acompanhada por Natasha Paremski, faz uma leitura dramática perfeita do Er ist gekommen in Sturm und Regen. Camille e Nathan Gunn interpretam elegantemente o "La ci darem la mano" do Don Giovanni de Mozart (incluída porque Robert Schumann deu a Clara uma cópia da partitura como presente).Um trecho das variações de Chopin de "La ci darem" foi incluído também, servindo como um outro diálogo pianístico entre Jeremy Denk e Natasha Paremski. Com Nina Kotova tocando a parte da orquestra reduzida a uma linha, Natasha Paremski interpreta maravilhosamente o "Romanze" do Concerto nº1 para Piano de Clara Schumann. E Jeremy Bell imprime sua característica sonoridade delicada no segundo dos Romances Opus 24 de Schumann. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO QUEM ÉSTINGCANTOR, MÚSICO E PRODUTORTambém ator, multi-instrumentista e ativista, Gordon Matthew Sumner, dono de 16 Grammys, nasceu em Wallsend, Inglaterra, em 2 de outubro de 1951. Antes da carreira-solo, fez sucesso como cantor, compositor e baixista da banda de The Police.

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