Puro Kazantzakis

Primeira tradução do grego, Vida e Proezas de Aléxis Zorbás resume a filosofia do autor, baseada em Bergson e Nietzsche

PUBLICIDADE

Foto do author Antonio Gonçalves Filho
Por Antonio Gonçalves Filho
Atualização:

Com a recente morte do cineasta grego Michael Cacoyannis (1922- 2011), no dia 25 do mês passado, voltou-se a falar de seu maior sucesso, a transposição para o cinema, em 1964, do romance escrito pelo patrício Nikos Kazantzákis (1883-1957), Vida e Proezas de Aléxis Zorbás. Por coincidência, a primeira tradução direta do grego do livro, escrito em 1946, chega ao mercado lançada por uma pequena editora, Grua Livros, de catálogo ainda limitado mas precioso (é do mesmo selo o notável Sobressalto, de Kenneth Cook, igualmente transformado em filme, Outback/Pelos Caminhos do Inferno, dirigido pelo canadense Ted Koctcheff).Tanto como o filme de Cacoyannis, fiel ao livro, o romance de Kazantzákis é uma elegia ao poder vital que certas criaturas como Zorbás (Zorba, no cinema) têm de transformar a vida de indivíduos marcados pelo ceticismo e a desconfiança, caso do narrador do livro, que, ao destacar os três homens mais influentes em sua vida, cita Bergson, Nietzsche e Zorbás. O último é obra de ficção, mas os dois primeiros pensadores foram, de fato, fundamentais na construção do pensamento filosófico de Kazantzákis.Zorbás é uma força da natureza. O narrador, um intelectual que resolve explorar uma mina de linhito em Creta, é em tudo seu oposto. Zorbás é capaz de ir para a cama com uma velha atriz francesa por compaixão e irrita-se com a ambiguidade do patrão, perdido entre o ideal socialista e sua aventura capitalista na ilha. Também não entende a razão de o mesmo ler tantos livros se eles não o ensinam a enfrentar a tragédia humana. Para Zorbás, o homem é apenas um animal. Nada além. Para Kazantzákis, cujo movimento pendular é igual ao do narrador - entre o comunismo e o cristianismo -, o homem pode ser algo além. É desse confronto que nasce uma das mais belas histórias de amizade da literatura do século 20.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.